Em famílias com crianças, a discussão sobre dieta sem glúten deixou de ser um tema restrito a consultórios médicos e passou a fazer parte do dia a dia. O assunto ganhou espaço nas redes sociais, em escolas e até em conversas de rotina entre pais, muitas vezes sem que haja um diagnóstico formal, o que pode levar tanto a benefícios quando bem indicado quanto a riscos nutricionais importantes quando aplicado sem orientação adequada, como explicou a pesquisa publicada na Frontiers in Nutrition.
Quando a dieta sem glúten em crianças é realmente necessária
A expressão dieta sem glúten costuma ser associada a três condições principais na infância: doença celíaca, alergia ao trigo e sensibilidade ao glúten não celíaca. Em todas elas, a exclusão do glúten ou do trigo é parte central do tratamento, mas os mecanismos envolvidos e a gravidade clínica são distintos.
Enquanto na doença celíaca há uma reação autoimune ao glúten em indivíduos geneticamente predispostos, na alergia ao trigo ocorre um processo alérgico frequentemente mediado por anticorpos IgE. Já na sensibilidade ao glúten não celíaca, os sintomas surgem sem resposta autoimune típica ou alergia clássica, exigindo avaliação cuidadosa para afastar outras causas gastrointestinais e funcionais.
Esse tema foi amplamente debatido por profissionais, como no vídeo do podcast @pediatracast:
@pediatracast Fazer uma alteração tão drástica na alimentação pode trazer consequências que a gente nem imagina, principalmente quando feita sem supervisão médica. 🥺 🎧 Ouça agora o episódio nas plataformas Spotify e Apple Podcasts#maternidade #pediatra #podcastbrasil #podcastpediatria #gluten #saude #filhos #desenvolvimentoinfantil #pediatracast #dietasemgluten #alimentacao #gestacao #gravidez #maternidadereal ♬ som original – Pediatracast
A dieta sem glúten na infância é sempre mais saudável
A percepção de que retirar o glúten seria automaticamente benéfico para qualquer criança é frequente, mas não é sustentada pelos dados da revisão. Em crianças com diagnóstico confirmado de doença celíaca ou alergia ao trigo, a exclusão do glúten ou do trigo é fundamental para evitar inflamação crônica, déficit de crescimento e complicações de longo prazo.
Quando a dieta é iniciada sem indicação médica, podem surgir carências nutricionais relevantes e até ganho de peso. Muitos produtos “gluten free” industrializados são ricos em amido refinado, açúcares e gorduras saturadas, com menor teor de fibras e proteínas, favorecendo uma alimentação energética demais e pobre em micronutrientes essenciais para o crescimento.
Quais são os principais desafios nutricionais da dieta sem glúten
Um dos pontos centrais da revisão é que a dieta sem glúten na infância exige planejamento detalhado para não comprometer crescimento, composição corporal e desenvolvimento cognitivo. O padrão alimentar baseado em pães, bolos e biscoitos sem glúten industrializados tende a reduzir fibras e aumentar carboidratos simples e gorduras, inclusive com impacto no risco cardiometabólico.
Entre os desafios mais citados estão fatores que podem afetar tanto crianças com diagnóstico estabelecido quanto aquelas que seguem a restrição por opção familiar, sem supervisão nutricional contínua:
- Menor aporte de fibras: com a retirada de trigo, centeio e cevada, diminui a ingestão de grãos integrais, o que impacta o trânsito intestinal e a saúde da microbiota.
- Redução de proteínas de boa qualidade: alguns produtos sem glúten utilizam farinhas de baixo teor proteico, prejudicando o aporte total diário.
- Deficiências de micronutrientes: especialmente ferro, folato, vitamina B12, vitamina D, cálcio, magnésio e zinco, fundamentais para ossos, sangue e sistema nervoso.
- Risco cardiometabólico: itens prontos para consumo podem conter gorduras saturadas e açúcares em excesso, favorecendo ganho de peso e alterações metabólicas.

Como montar uma dieta infantil sem glúten mais equilibrada
A revisão destaca que é possível reduzir muitos desses riscos ao estruturar a alimentação em torno de alimentos naturalmente sem glúten, priorizando variedade e qualidade. Em vez de depender apenas de produtos industrializados específicos, a dieta pode ser construída com base em cereais integrais alternativos, leguminosas, frutas e hortaliças, além de fontes adequadas de proteína de alto valor biológico.
Estratégias práticas sugeridas por especialistas incluem valorizar pseudocereais, leguminosas e alimentos fortificados, além de planejar lanches com menor teor de açúcar e gordura. O acompanhamento por pediatra e nutricionista permite monitorar peso, estatura, exames laboratoriais e sinais de deficiência, além de ajustar a rotina escolar e social, reduzindo o impacto emocional de uma dieta restritiva.
Quais impactos vão além do prato no crescimento e na rotina social
Para além dos nutrientes, a alimentação sem glúten pode influenciar o crescimento, o comportamento e o bem-estar emocional da criança. Em indivíduos com doença celíaca não diagnosticada ou tratados de forma inadequada, há relatos de baixa estatura, atraso puberal, fadiga frequente e dificuldades escolares, possivelmente relacionados a carências nutricionais e inflamação intestinal contínua.
Em crianças sem indicação clínica clara, o excesso de restrições alimentares pode favorecer comportamentos alimentares rígidos e até quadros compatíveis com transtornos alimentares, especialmente na adolescência. Por isso, especialistas recomendam que a retirada do glúten em crianças seja sempre precedida por avaliação médica completa, fazendo da dieta sem glúten uma ferramenta terapêutica alinhada ao diagnóstico e ao crescimento saudável.







