Injúria racial

Preso ao negar abordagem de PM negro, corretor se defende das acusações

Em entrevista exclusiva ao Correio, Patrick Sóstenes de Souza se defendeu das acusações. O jovem foi preso pela PMDF acusado de furtar celulares e importunar mulheres em um bar da Orla do Lago Paranoá

Darcianne Diogo
postado em 17/07/2022 08:19
Patrick negou ter assediado mulheres, furtado celulares e ter cometido injúria racial -  (crédito: Darcianne Diogo/CB/D.A Press)
Patrick negou ter assediado mulheres, furtado celulares e ter cometido injúria racial - (crédito: Darcianne Diogo/CB/D.A Press)

O jovem acusado de cometer injúria racial ao recusar a abordagem de um policial militar negro durante uma festa na Orla do Lago Paranoá quebrou o silêncio e contou a própria versão acerca dos fatos. Em entrevista exclusiva concedida ao Correio Braziliense uma semana depois de ser preso, Patrick Sóstenes de Souza Ferreira, 26 anos, admitiu ter ingerido bebida alcoólica e ecstasy, mas se defendeu das imputações e narrou uma outra história. Na segunda-feira (11/7), a Justiça concedeu liberdade sem fiança ao corretor de imóveis durante audiência de custódia.

Morador de Arniqueiras, Patrick foi preso pela Polícia Militar do Distrito Federal (PMDF) na tarde de sábado (9/7) após ser acusado de importunar mulheres, furtar celulares e agredir militares em um evento restrito que ocorria no Marina Nauss. Quando policiais chegaram ao local para atender a ocorrência, encontraram o jovem deitado em um gramado na área externa do estabelecimento, desacordado e com ferimentos no rosto, na cabeça e na costela. Ao Correio, o comandante da equipe, o sargento Shemeorerk Apoliano, disse, em entrevista no domingo (10/7), que o rapaz se revoltou durante a abordagem e afrontou a guarnição. “Ele disse que não era bandido para ser abordado por um PM negro, referindo-se a um dos integrantes da equipe”, disse.

Patrick contesta a versão do policial. O corretor confessou que, no sábado, antes de ir ao Marina Nauss, estava em uma outra festa, onde misturou bebida alcoólica com ecstasy, contudo relata se lembrar do que teria dito aos PMs. “Quando me acordaram com spray de pimenta no rosto, eu estava voltando ao meu normal aos poucos e disse a eles que eu não era bandido para ser abordado por homens de preto. Eu estava me referindo à farda do Gtop (Grupo Tático Operacional). Jamais falaria um termo racista. Ser chamado disso me dói absurdamente, pois minha irmã, avó e boa parte da minha família é negra. Eu me considero negro. De fato, eu sei que estava alterado, posso ter sido inconveniente no local, mas a acusação de racista não tem cabimento”, se defende.

Segundo funcionários do estabelecimento, Patrick importunou mulheres, furtou celulares e mostrou os órgãos genitais. No entanto, nenhuma vítima de furto ou assédio compareceu à delegacia para prestar queixa. As câmeras do circuito interno de segurança do bar mostraram o jovem dançando sem camisa. As filmagens revelam o corretor olhando para uma mulher, mas não captam o rapaz tocando ou conversando com as frequentadoras.

Em uma outra imagem, Patrick aparece urinando em um canto do lago. “Sou frequentador assíduo daquele local. Ali, era um evento restrito e só entra quem é conhecido. Eu não era um estranho. Todos me conheciam. Não atravessei o lago nadando e invadi o local, mas entrei pela porta da frente. Não é da minha índole cometer assédio e nem pegar nada de ninguém. Isso não é da minha personalidade. Graças a Deus, eu trabalho, compro minhas coisas com o meu dinheiro e sustento minha filha de 2 anos. Tudo é conquistado pelo meu suor. Não sou ladrão”, afirmou.

Agressão

O Correio obteve acesso ao laudo médico do Instituto de Medicina Legal (IML), que descreve os ferimentos de Patrick. O jovem foi encontrado com a cabeça e a boca sangrando e ferimentos nos dois braços e no cotovelo. Ao ser preso, ele foi conduzido à 5ª Delegacia de Polícia (Área Central), onde de lá o delegado recomendou que o rapaz fosse levado primeiro ao hospital antes do registro de ocorrência.

Segundo o corretor, no momento em que ele urinou no lago pela primeira vez, os funcionários o chamaram a atenção. O jovem, no entanto, voltou ao local e urinou pela segunda vez, momento em que, de acordo com ele, foi puxado para dentro do estabelecimento e agredido com barra de ferro. “Quando fui acordado pelos policiais, senti minha cabeça sangrando e latejando. Estava todo ralado. O que não entendi e que não entra na minha cabeça é o porquê não chamaram os bombeiros, já que eu estava naquele estado. Há muitas coisas que não foram esclarecidas e essa é uma delas.”

O advogado de Patrick, Suenilson de Sá, afirmou que provará a inocência do rapaz quanto às acusações, principalmente no que tange à injúria racial. “Vamos buscar a responsabilização daqueles que causaram as fortes lesões que ele sofreu e queríamos que a PMDF respondesse o porquê ele não foi socorrido primeiro, ao invés de ser levado à delegacia. Porque quem determinou que ele fosse levado ao hospital foi a Polícia Civil”, pontuou.

Patrick conta que está fazendo tratamento psicológico e, no momento, está sem ir ao serviço. Funcionário de uma corretora de imóveis, o jovem relata medo em voltar ao trabalho, mas diz que tem ganhado apoio de amigos, conhecidos e familiares. “Via minha filha todos os dias. Mas agora, desde que tudo aconteceu, estou com medo de sair com ela para um parque que seja. Tenho medo de ser agredido e colocar minha filha em perigo. Minha vida está um caos. Antes, meu celular não parava com tanta mensagem de clientes vindos de indicação. Agora, parou. Só quero minha vida de volta”, finalizou.

Ao Correio, os pais de Patrick também negaram as acusações contra o filho. “Nós somos ativistas. Minha esposa é indígena e nosso filho cresceu ao nosso lado. Todos nós lutamos contra o racismo. Por qual motivo ele iria cometer uma atrocidade dessa?”, questionou o pai.

 

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