CPI dos Atos Antidemocráticos

CPI dos Atos Antidemocráticos ouve militares e espera Anderson Torres

O ex-secretário de Segurança Pública será ouvido dia 23, na Câmara Legislativa. Nesta quinta-feira (16/3), será a vez dos coronéis Jorge Eduardo Naime, preso desde 7 de fevereiro, suspeito de participação no ato golpista, e Marcelo Casimiro Vasconcelos Rodrigues

Pablo Giovanni
postado em 15/03/2023 06:00
 (crédito: Minervino Junior/CB/D.A Press)
(crédito: Minervino Junior/CB/D.A Press)

O depoimento mais aguardado da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) dos Atos Antidemocráticos — o do ex-secretário da Segurança Pública do Distrito Federal Anderson Torres — será em 23 de março. Para a sessão desta quinta-feira (16/3), no entanto, também há uma grande expectativa na Câmara Legislativa. A CPI vai ouvir os coronéis Jorge Eduardo Naime e Marcelo Casimiro Vasconcelos Rodrigues, que chefiavam o Departamento de Operações (DOP) e o 1° Comando de Policiamento Regional (1º CPR) da PMDF, respectivamente.

Em 8 de março, a Procuradoria-Geral da República (PGR) se manifestou pela manutenção da prisão de Naime, detido desde 7 de fevereiro, na quinta fase da Operação Lesa Pátria, da Polícia Federal. Apesar de comandar o DOP em 8 de janeiro, ele havia pedido folga de cinco dias antes dos ataques e estava de licença, em um hotel fazenda. Os investigadores acreditam que o distanciamento teria sido proposital, para não ser incriminado. O coronel foi chamado de volta a Brasília e retornou às pressas para conter os vândalos. Ele foi exonerado pelo ex-interventor federal Ricardo Cappelli, em 10 de janeiro.

Quanto ao ex-ministro da Justiça do governo Bolsonaro, que está preso desde 14 de janeiro, Anderson Torres pediu para ser ouvido em uma sala reservada, sem acesso do público e da imprensa, e sinalizou aos integrantes da CPI que quer falar, mesmo resguardado por uma decisão do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), que permite a ele ficar calado.

Embora Anderson Torres tenha prestado um depoimento de mais de dez horas à Polícia Federal (PF), o entendimento entre os membros da comissão é de que ainda existem esclarecimentos a ser feitos pelo ex-secretário, em especial sobre a inexistência de comando da SSP-DF em 8 de janeiro, na Praça dos Três Poderes.

À PF, em 2 de fevereiro, Torres afirmou que comunicou ao então secretário-executivo da SSP-DF Fernando de Sousa Oliveira sobre suas férias nos Estados Unidos. Anderson Torres disse que também encaminhou o Protocolo de Ações Integradas (PAI) ao seu substituto — assinado na sexta-feira, 6 de janeiro — mas, até o momento da viagem, na noite do mesmo dia, não passou recomendações ao interino e que “quaisquer problemas mais graves deveriam ser comunicados ao governador Ibaneis Rocha”. Torres também colocou a responsabilidade pela baderna na conta da Polícia Militar, alegando que que não recebeu nenhum planejamento operacional específico da corporação.

Falha grave

O ex-secretário disse que, a partir dos acontecimentos de 12 de dezembro, passou a considerar de risco o acampamento bolsonarista em frente ao Quartel-General do Exército, no Setor Militar Urbano. Segundo ele, a reunião sobre o PAI foi convocada pela subsecretária de Operações Integradas, coronel Cintia. Nela, estariam representantes da PMDF, Polícia Civil (PCDF), Corpo de Bombeiros (CBMDF), Detran, DF Legal, Senado  Federal, Câmara dos Deputados, STF, Ministério das Relações Exteriores (MRE), Polícia Rodoviária Federal (PRF) e Departamento de Estradas de Rodagem (DER).

Indagado sobre a declaração do governador afastado Ibaneis Rocha de que houve sabotagem, Torres garantiu que não recebeu qualquer elemento de informação nesse sentido, “mas, certamente pode concluir que houve uma falha grave na execução operacional do plano, o que não é de alçada do secretário de Segurança Pública”. Segundo ele, se o Protocolo de Ações Integradas tivesse sido cumprido, os atos criminosos de 8 de janeiro jamais teriam ocorrido.

Torres argumentou que, na manhã de 6 de janeiro, recebeu informes de que os atos marcados para o domingo seguinte “não indicavam ações radicais”. Declarou, ainda, que, antes da reunião para firmar o PAI, encontrou-se, também em 6 de janeiro, com a secretária de Desenvolvimento Social, Ana Paula Marra, e com o então comandante militar do Planalto, general Gustavo Henrique Dutra de Menezes. Com ele, teria ido a subsecretária de Operações Integradas da SSP, coronel Cintia, para debater sobre a retirada total do acampamento no QG do Exército. Torres disse que, nesse encontro, ficou combinado que a remoção ocorreria em duas etapas, sendo a primeira etapa por meio da Sedes, retirando moradores de rua, e, logo após, dos bolsonaristas. Essa operação conjunta estava marcada para ocorrer na terça-feira, 10 de janeiro.

Ao fim do depoimento, o ex-secretário foi questionado se recebeu algum tipo de pedido por parte de Ibaneis para sabotar a Secretaria de Segurança. Torres respondeu que Ibaneis sempre foi “muito preocupado com a manutenção da ordem e a segurança pública do Distrito Federal”. Anderson Torres contou que o governador afastado Ibaneis Rocha (MDB) entrou em contato com ele para viabilizar o retorno à SSP-DF no início de dezembro. À época, Torres era ministro da Justiça e Segurança Pública do governo de Jair Bolsonaro (PL). Questionado se sua nomeação seria um acordo político, o ex-secretário respondeu que a escolha pelo nome dele foi técnica, “que acredita que os números positivos alcançados durante sua gestão como secretário nos anos de 2019/2021 o credenciaram”.

Pontos obscuros

Ao Correio, o presidente da CPI, Chico Vigilante (PT), avaliou que existem diversos pontos a serem respondidos por Anderson Torres. “A gente tem que verificar que os atos começaram dia 12 (de dezembro), e todos sabiam o que iria acontecer. O Anderson tinha um acordo prévio com o governador Ibaneis sobre o retorno dele ao cargo. Mesmo com tudo isso, viajou para os Estados Unidos. Apesar do depoimento (à Polícia Federal), existem coisas que precisamos saber, como, por exemplo, se ele tinha notícia de uma guerra interna na Polícia Militar”, concluiu.

A CPI estava prevista para ouvir o ex-secretário nesta quinta-feira (16/3). No entanto, uma decisão do ministro Alexandre de Moraes frustrou os planos. Para a mesma data e horário, Moraes determinou a oitiva do ex-ministro no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Esse depoimento é referente à participação de Torres em uma transmissão ao vivo com o ex-presidente Jair Bolsonaro, que questionava o sistema eleitoral. Ele também será indagado sobre a minuta golpista encontrada na casa dele, no Jardim Botânico.

A determinação atende a um pedido do corregedor-geral do TSE, Benedito Gonçalves. De acordo com Moraes, Torres será ouvido na condição de testemunha, por videoconferência, e, caso queira, poderá ficar em silêncio e terá garantido o direito de não se autoincriminar.

Trechos do depoimento de Anderson Torres à Polícia Federal

O que caberia a PMDF em 8 de janeiro

"(...) Planejar e executar ações de policiamento ostensivo, (...) ficar em condições de empregar tropa especializada em controle de distúrbio. (...) não permitir acesso de pessoas e veículos à Praça dos Três Poderes (...), manter reforço de efetivo nas adjacências e perímetro interno dos prédios públicos de toda extensão da Esplanada dos Ministérios, Congresso Nacional e Praça dos Três Poderes, bem como na estação rodoviária de Brasília."

Possíveis conversas com Jair Bolsonaro sobre fraude no sistema eleitoral

“Respondeu que, durante o mandato, ele (Bolsonaro) questionava o método de apuração e que deveria ser mais transparente; que, após a eleição, não foi questionado com o declarante o resultado da eleição e percebeu que o presidente passou por um processo de aceitação de sua derrota.”

Live na qual o ex-presidente atacou sistema eleitoral

Disse que "essa live durou duas horas e apenas participou cinco minutos do final para apresentar um documento público que tratava sobre medidas que garantiriam maior transparência ao sistema eleitoral; que esse documento foi produzido em razão de um chamamento público do TSE para que organizações da sociedade civil e instituições pudessem opinar a respeito da higidez e segurança e melhorias do sistema eleitoral".

Atos golpistas de 12 de dezembro, quando era ministro da Justiça

Afirmou que "a inteligência o municiava de informações mais estratégicas; que, em relação a esses movimentos, não recebeu informações; que essa atribuição de investigar eventuais movimentos ‘golpistas’ são da atribuição investigativa da Polícia Federal, por serem crimes; que a PF e outras instituições eram municiadas dessas informações; que tomou conhecimento pela imprensa que, em duas ou três ocasiões, policiais federais foram identificados nos acampamentos fazendo levantamentos e colhendo informações de inteligência, e dali foram retirados pelo Exército".

Minuta golpista

“Respondeu que acredita que recebeu esse documento no seu gabinete no Ministério da Justiça (...) que considera a minuta do decreto totalmente descartável; que se tratava de um documento sem viabilidade jurídica; que não foi o declarante (Torres) que colocou a pasta com o decreto na estante, e que acredita que possa ter sido sua funcionária ao arrumar a casa.”

Ibaneis Rocha sabia das férias?

"Afirmou que sim, em duas ocasiões; uma quando do convite, no início de dezembro, para assumir a secretaria, (...) que na semana da viagem fez nova comunicação ao governador relembrando de sua viagem no dia 6, às 23h50."

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