HISTÓRIA DE VIDA

Desafios e conquistas: após 30 anos, palestrante reconta história de vida ao Correio

Wilton Cardoso da Costa teve uma infância difícil. Adolescente, foi personagem de uma reportagem do Correio sobre ingresso no mercado de trabalho. Hoje, três décadas depois, ele volta a conversar com o jornal, conta sua trajetória e fala da importância de ter tido uma chance

Hoje, Wilton dá treinamentos e palestras para garçons
     -  (crédito: Minervino Júnior/CB/D.A Press)
Hoje, Wilton dá treinamentos e palestras para garçons - (crédito: Minervino Júnior/CB/D.A Press)

Em 1994, o setor de serviços concentrava 90% da força de trabalho no Distrito Federal. Uma chance de trabalho na área podia significar o início de uma trajetória profissional de sucesso. Foi o caso de Wilton Cardoso da Costa, hoje com 44 anos. Há 30 anos, ele foi personagem de uma reportagem do Correio sobre ingresso no mercado de trabalho do DF. A oportunidade de emprego em um café transformou a vida dele e o tirou das ruas. O Centro de Documentação (Cedoc) do Correio localizou Wilton, que foi entrevistado novamente e falou sobre sua trajetória. Hoje, ele é casado, pai de seis filhos, tem casa e carro próprios, uma profissão. E sente gratidão por ter tido uma boa oportunidade antes de se envolver com qualquer perigo que as ruas poderiam trazer.

"Foi lá que aprendi a ser homem", diz Wilton sobre o primeiro lugar onde trabalhou. À época da reportagem, ele havia sido recém-contratado pelo Café Martinica que, então, ficava na 303 Norte. Antes disso, vigiava carros em frente ao estabelecimento e dormia entre as lajes da superquadra. Joel Baesse, proprietário do Martinica, ofereceu um emprego ao jovem, que se mostrava bastante comunicativo e proativo. Foi a chance que Wilton precisava para sair das ruas.

Apesar de todas as dificuldades, Wilton nunca deixou de estudar e concluiu o ensino médio com louvor. "Meus pais moravam em Samambaia, mas eu dormia na rua porque ficava vigiando carros até o fim do movimento no café, que acontecia de madrugada. Naquela época, não havia ônibus nesse horário. Então, dormia na laje com outros meninos de rua, acordava às 6h, pegava o ônibus e ia para a escola, onde as aulas começavam às 7h", relembra.

O início no café aconteceu com a anuência do Juizado de Menores, atual Vara da Infância e da Juventude, e dos pais de Wilton. "Foi realizada uma audiência com a presença dos meus pais e do meu patrão. O combinado era que eu não parasse de estudar, e assim foi feito", relata. "Sou muito grato a Joel, Jurema e Adeilton, os sócios do café na época, e aos responsáveis por essa oportunidade que tive", acrescenta.

Wilton começou no café realizando funções internas como ajudante de cozinha. Dois anos depois da contratação, foi promovido a garçom, ofício que desempenhou até o início de 2024. "Ao todo, passei 16 anos no Martinica. Lá, aprendi a ser garçom e descobri minha paixão por essa profissão", destaca. "De lá, trabalhei no Balaio Café, onde acabei me tornando gerente", completa.

Por demonstrar talento em servir o público e ter sempre na ponta da língua o cardápio e as regras das casas onde trabalhava, Wilton buscou estudar e se especializar na área, com muita disciplina. "Gosto de expandir meus conhecimentos, aprender todas as funções inerentes ao trabalho que estou desenvolvendo. Fiz vários cursos de sommelier e atendimento ao público. Cheguei a ganhar vários prêmios por bater meta em diversos lugares onde trabalhei", recorda. "Teve uma época em que eu saía 3h do trabalho e ia direto para o Senac, onde fazia um curso que começava às 7h", detalha. 

Conquistas

A trajetória de Wilton até aqui teve percalços. Na fase adulta, ficou desempregado e trabalhou em um lixão separando recicláveis. O futebol, uma das paixões dele, também o ajudou a encontrar novos rumos. "Cheguei a jogar profissionalmente no Gama, no Brasiliense e no Botafogo de Sobradinho. Tenho carteira de jogador profissional, mas a vida me levou para outro caminho e acabei voltando a trabalhar de garçom", explica.

Wilton comemora ter encaminhado todos os filhos. "Meus gêmeos de 19 anos, João Pedro e João Victor, estão empregados e também trabalham com atendimento ao público. Minha filha Ana Luíza, de 17, também. Tenho dois filhos de 14 anos, Artur e Gabriel, um joga na base do Fluminense e o outro no Ceilândia. Minha filha mais nova, Sofia, ainda tem 8 anos e é a paixão da minha vida", conta.

Wilton esteve perto de vícios muitas vezes, mas nunca se rendeu. "Há 20 anos não coloco uma gota de álcool na boca. Teve uma época em que tomava cerveja, mas logo parei", salienta.

Atualmente, Wilton é convidado para palestrar e dar treinamentos a equipes de garçons em vários estabelecimentos da cidade. Aos meninos que, assim como ele, querem melhorar de vida, ele aconselha foco e disciplina. "Estude, pesquise, se interesse pelas coisas. Busque cursos, sejam superiores ou profissionalizantes. Não existe profissão inferior. Aproveite a chance que a vida lhe der e será recompensado", aconselha.

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Reportagem do Correio publicada em 3/9/1994 (foto: editoria de arte)

 

FRASE

Estude, pesquise, se interesse pelas coisas. Busque cursos, sejam superiores ou profissionalizantes. Não existe profissão inferior. Aproveite a chance que a vida lhe der e será recompensado"

 

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postado em 13/04/2024 06:00
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