Ao adquirir produtos eletrônicos, eletrodomésticos ou equipamentos tecnológicos, muitos consumidores são abordados pela oferta da garantia estendida, um serviço que promete prolongar a proteção do item além do período previsto pela lei ou pelo fabricante. Mesmo diante das diversas opções no mercado e das condições muitas vezes complexas desses contratos, surge a dúvida: será que vale a pena investir na garantia estendida ou ela representa apenas um custo adicional sem benefício real?
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Para responder a essa pergunta, é fundamental compreender as diferenças entre os tipos de garantias existentes e o que cada uma oferece ao consumidor. A garantia legal, prevista no Código de Defesa do Consumidor (CDC), é um direito básico e intransferível. Ela protege o comprador contra defeitos e vícios que comprometam a qualidade, o funcionamento ou a segurança do produto, sejam eles visíveis, sejam ocultos. No caso dos bens duráveis, como eletrodomésticos, a lei estabelece o prazo mínimo de 90 dias, durante os quais o consumidor pode exigir a reparação do produto, a troca, o abatimento do preço ou a devolução do valor pago, dependendo do caso.
Além dessa, existe a garantia contratual, que é uma extensão oferecida pelo fabricante ou pela loja. Ela tem prazo e condições definidos em contrato e não pode anular ou reduzir os direitos legais do consumidor. Por exemplo, é comum que fabricantes ofereçam um ano de garantia contratual, o que somado aos 90 dias da garantia legal, pode significar até 15 meses de proteção para o consumidor.
A estendida se apresenta como um seguro opcional vendido separadamente. A cobertura só começa a valer após o término da garantia contratual (ou da legal, caso não haja contratual). Regulamentada pela Superintendência de Seguros Privados (Susep), a modalidade é comercializada por seguradoras ou pelas próprias lojas, e pode variar muito em termos de cobertura, exclusões, prazos e custos.
Embora a garantia estendida pareça oferecer uma tranquilidade adicional, nem sempre ela é vantajosa para o consumidor médio. É o que explica Marina Rocha, advogada especializada em direito do consumidor. "O que a garantia estendida oferece é uma proteção para eventos que normalmente não estão cobertos pela garantia legal ou contratual. Mas o custo desse serviço pode ser alto e, muitas vezes, não compensa. Além disso, a cobertura pode ser limitada e conter diversas cláusulas que excluem tipos comuns de dano, como quedas acidentais ou mau uso, que são as situações em que os consumidores mais querem proteção", alerta a especialista.
Segundo Marina, muitos consumidores não sabem que já contam com mecanismos eficientes para resolver problemas com produtos defeituosos. "No Distrito Federal, órgãos de defesa do consumidor, como o Procon-DF, oferecem canais de atendimento que ajudam a mediar conflitos entre clientes e fornecedores, garantindo que os direitos previstos no CDC sejam respeitados, inclusive com possibilidade de reparos, trocas e até ressarcimento em casos de vícios ocultos", complementa.
Vida útil
João Carneiro, servidor público de Brasília, tem uma história que ilustra essa realidade. Ele adquiriu um notebook no valor de R$ 4 mil e foi convencido a pagar R$ 500 pela garantia estendida, que prometia dois anos extras de proteção. Após a primeira necessidade de conserto, ele percebeu que o custo do seguro foi maior que o próprio reparo. "Depois disso, quando outro problema apareceu, acionei o Procon-DF e o fabricante para resolver, usando a garantia legal. Felizmente, o processo foi rápido e o conserto gratuito. Percebi que, muitas vezes, a garantia estendida pode não valer a pena se você conhece seus direitos", comenta.
Segundo o Procon- DF, a decisão de contratar ou não a garantia estendida deve considerar alguns aspectos essenciais. Primeiramente, o perfil do produto e seu custo de manutenção. Produtos que exigem componentes caros para reparo, como televisores de última geração, eletrodomésticos inteligentes, sistemas de som ou smartphones topo de linha, podem ser bons candidatos para a garantia estendida, principalmente se o consumidor pretende usar o item por muitos anos.
Por outro lado, para produtos mais simples, que normalmente têm vida útil mais curta, o investimento na garantia estendida pode não se justificar. Além disso, é imprescindível que o consumidor leia atentamente o contrato da garantia estendida, verificando itens como quais tipos de danos são cobertos, se há exclusões (como danos causados por quedas, contato com líquidos, mau uso ou desgaste natural), a existência de franquia (valor que o consumidor deve pagar em cada atendimento), o prazo de atendimento e a rede de assistência técnica credenciada.
Outro ponto importante que existe no CDC é a forma como a garantia estendida é oferecida. A legislação brasileira proíbe a venda casada, ou seja, a obrigatoriedade de contratar a garantia estendida para adquirir o produto. Essa garantia deve ser sempre opcional e informada de forma clara, com o consumidor tendo plena consciência do custo e das condições antes de fechar o negócio.
No Distrito Federal, o Procon tem reforçado campanhas de orientação para que os consumidores avaliem suas reais necessidades antes de contratar esse serviço. Segundo a diretora do órgão, a conscientização é fundamental para evitar compras impulsivas e desinformadas que podem gerar frustrações e prejuízos financeiros.
Além disso, o Código de Defesa do Consumidor garante ainda o direito de arrependimento, que permite ao cliente desistir da compra, incluindo a garantia estendida, em até sete dias corridos após a contratação, desde que o produto ainda não tenha sido utilizado, devolvendo-o em condições originais e sem custos adicionais.
Em suma, a garantia estendida pode ser uma ferramenta válida para quem deseja ampliar a proteção contra possíveis problemas com seus bens, mas não é uma obrigação nem uma necessidade para todos. O melhor caminho é estar informado, conhecer seus direitos e pesar os prós e contras para cada caso, evitando gastos desnecessários e garantindo que seu investimento traga benefícios reais.
Prazos
Qual garantia cobre seu produto?
Legal — Automática e obrigatória. Conforme o CDC, o prazo é de 30 dias para produtos não duráveis, como alimentos, bebidas, medicamentos e produtos de higiene pessoal, e de 90 dias para duráveis, entre eles eletrodomésticos, eletroeletrônicos, móveis e automóveis
Contratual — Oferecida pelo fabricante ou fornecedor, com prazo e condições definidos no termo de garantia. É complementar à legal.
Estendida — Opcional e paga à parte, estende o tempo de cobertura e começa a valer após o fim da garantia contratual ou legal, conforme o contrato.
Onde reclamar
Órgãos públicos
• Procon: o atendimento é feito por meio donúmero 151, de segunda a sexta-feira, das 8hàs 17h. O consumidor também pode entrar emcontato pelo e-mail: 151@procon.df.gov.br. Os endereços dos postos podem ser consultados pelo site do Procon-DF.
• Plataforma consumidor.gov.br: é possível comunicação direta com as empresas que participam da plataforma, que se comprometem a receber, analisar e responder reclamações em até 10 dias.
Empresa privada
• Reclameaqui.com.br: plataforma de solução de conflitos entre consumidores e empresas. Nela, também é possível verificar a reputação da empresa, as reclamações registradas e o atendimento às demandas.
*Estagiária sob a supervisão de Malcia Afonso
