
Para quem espera por uma transfusão em um leito de hospital, cada bolsa de sangue representa uma chance concreta de continuar vivendo. Nesse período próximo às festas de final de ano e férias, quando os estoques costumam ficar mais baixos, cresce a necessidade da conscientização para doar. Só neste ano, até o último dia 10, mais de 52,9 mil bolsas de sangue foram coletadas e 2,8 mil pessoas foram cadastradas no banco de doador de medula óssea pelo Hemocentro de Brasília. Mais que números, os dados se transformam em histórias de sobrevivência, gratidão e recomeço.
"Queremos estimular novos doadores, reforçar a importância da doação regular e também reconhecer aqueles que já doam e multiplicam essa causa", explica Kelly Barbi, gerente de Captação de Doadores do Hemocentro de Brasília, sobre a mobilização feita durante a Semana Nacional do Doador, no fim de novembro.
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Apesar das campanhas, manter os estoques em nível estável ainda é um grande desafio. "Nós precisamos, em média, de 180 bolsas por dia para atender 100% da demanda pública do Distrito Federal. As plaquetas, por exemplo, duram apenas cinco dias, o que exige um fluxo constante de doadores", alerta.
Kelly reforça que doar é um processo seguro e sem riscos à saúde: "A doação não engrossa nem afina o sangue, não faz engordar ou emagrecer. É um procedimento seguro, regulamentado pelo Ministério da Saúde, e não existe, hoje, nenhum substituto para o sangue. Ele é um insumo essencialmente humano. Por isso, precisamos de cidadãos conscientes, praticando esse gesto de responsabilidade social em prol do próximo", ressalta.
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Gratidão
Dos dois lados da moeda, a estudante de direito Kelly Maciel, 26 anos, conheceu a doação de sangue pela dor e, mais tarde, pela própria necessidade. A primeira vez que foi ao Hemocentro, em 2021, era para ajudar o pai, internado para uma cirurgia em decorrência da doença de Chagas. "Ele teve complicações, perdeu muito sangue e aí veio a necessidade da doação. Infelizmente, ele acabou falecendo por causa de uma infecção hospitalar, já estava muito debilitado", lembra.
A experiência, marcada pela perda, despertou nela a consciência sobre a importância do gesto solidário. "Na época, a gente pensou: meu pai está recebendo sangue porque alguém doou, então, a gente também precisa ajudar outras pessoas", relembra. O que Kelly não imaginava é que, anos depois, seria ela quem dependeria de transfusões para viver.
Em 2023, ao tentar doar novamente por causa da internação da mãe, Kelly descobriu que estava com anemia grave, causada por múltiplos miomas — uma condição genética que provoca tumores benignos no útero e causa sangramentos intensos. No tratamento mais recente, uma cirurgia em fevereiro de 2025, precisou de 10 bolsas de sangue, antes, durante e depois do procedimento. "Quando recebi sangue pela primeira vez, fiquei com medo. Pensava: 'O sangue de outra pessoa vai entrar em mim'. Mas, ao mesmo tempo, foi um alívio enorme. A melhora é quase imediata, até a cor do rosto muda", conta.
Com o acúmulo de transfusões, desenvolveu uma aloimunização — quando o corpo passa a rejeitar o sangue doado, dificultando a compatibilidade para novas transfusões. "Quando me disseram que meu sangue agora era mais específico e que não sabiam se iam achar, eu fiquei desesperada. Quando falaram que tinham encontrado, fiquei muito agradecida", conta.
Hoje, apesar do medo de precisar novamente de uma transfusão, a jovem faz questão de deixar uma mensagem a quem doa. "É um gesto simples, que não custa nada, mas salva vidas. Eu só estou aqui porque alguém, em algum lugar, decidiu doar", disse.
Esperança
A ligação de João Alves, 63 anos, com a doação de sangue se tornou profunda quando a neta, Luísa Peterle, hoje com 9, enfrentou crises recorrentes de doença falciforme. A condição, que afeta os glóbulos vermelhos e provoca anemia e dores intensas, exigia transfusões frequentes e internações constantes. "Sempre que eu via minha neta recebendo uma bolsa de sangue, o que predominava era a gratidão. Era isso que eu sentia todas as vezes", relembra. A família convivia com episódios de sequestro esplênico — quando o baço retém parte do sangue do corpo — e precisou organizar campanhas para garantir o tratamento. "Ainda que as pessoas tenham boa vontade, muitas não têm consciência da urgência que é uma doação de sangue", afirma.
O período mais crítico durou até Luísa completar 3 anos, quando ela passou por um transplante de medula e se livrou da doença. A experiência transformou a forma como toda a família enxerga a doação. "Ficou um sentimento permanente de gratidão a todas as pessoas que nos socorreram", lembra. Desde então, João e seus familiares passaram a incentivar outras pessoas a doar. "É um ato que salva vidas, mas muitos só entendem isso quando passam pela necessidade. Minha mensagem é de eterna gratidão a quem doou para minha neta — e, para quem nunca doou, deixo um convite: experimente fazer isso", afirma.
A mesma esperança se fez presente na UTI neonatal onde Mateus Nunes dos Santos lutava pela vida. Filho da professora Geovana Costa Nunes, 40, ele nasceu prematuro extremo e permaneceu internado por dois meses em 2016. "Quando cheguei na UTI e vi meu filho tomando sangue pela primeira vez, senti uma emoção muito forte. Eu estava rezando para que ele não precisasse, mas precisou, e foi muito assustador", conta. O impacto daquele momento mudou a rotina da família: o marido de Geovana, Nicodemos Almeida, se tornou doador regular, e ela também planeja seguir o mesmo caminho. "Quero me organizar no ano que vem para colocar meu nome e ajudar outras pessoas", promete.
Requisitos para doar
» Ter entre 16 e 69 anos (menos de 18 anos precisa de autorização, e primeira doação só pode ocorrer até os 60)
» Pesar, no mínimo, 51kg
» Estar bem de saúde, sem febre, infecções ou sintomas gripais
» Não estar em jejum
» Evitar ingestão de álcool por 12 horas antes da doação
Nível dos estoques
O = Adequado
O- = Regular
B = regular
B- = Baixo
AB = Regular
AB- = Baixo
A = Regular
A- = Baixo
Fonte: Hemocentro Brasília, atualizado em 17/12/2025
Saiba Mais
Para doar
» Ter entre 16 e 69 anos (menos de 18 anos precisa de autorização, e primeira doação só pode ocorrer até os 60)
» Pesar, no mínimo, 51kg
» Estar bem de saúde, sem febre, infecções ou sintomas gripais
» Não estar em jejum
» Evitar ingestão de álcool por 12 horas antes da doação
Nível dos estoques
O = Adequado
O- = Regular
B = regular
B- = Baixo
AB = Regular
AB- = Baixo
A = Regular
A- = Baixo
Fonte: Hemocentro Brasília, atualizado em 17/12/2025

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