gravidez

Uso de opioide para controle da dor nos partos é seguro para os bebês

A droga para o controle da dor chega aos recém-nascidos pela amamentação. Quando usada em doses recomendadas, porém, não aumenta o risco de complicações médicas, concluem cientistas do Canadá

Isabella Almeida
postado em 16/03/2023 06:00
 (crédito: ADEK BERRY)
(crédito: ADEK BERRY)

Incentivada ao longo da gravidez, a amamentação pode ser dificultada pelo uso de opioides durante ou após o parto. Há dúvidas se a droga para o controle da dor pode fazer mal aos recém-nascidos. Um estudo canandense publicado, ontem, no The British Medical Journal (BMJ) mostra que não. Segundo a pesquisa, o medicamento é, de fato, transferido ao bebê pelo leite materno, mas em quantidades que não devem gerar danos.

"Nossas descobertas dão aos profissionais de saúde e às pacientes certa tranquilidade de que o uso de opioides após o parto apresenta poucos riscos aos recém-nascidos", enfatiza Jonathan Samuel Zipursky, pesquisador do Departamento de Medicina do Centro de Ciências da Saúde de Sunnybrook, em Toronto. Ao avaliar dados de mais de 624 mil mães e bebês acompanhados ao longo de 30 dias, Zipursky e colegas concluíram que não há diferença nas intercorrências ocorrendo ou não o contato precoce com o medicamento.

Segundo a ginecologista e obstetra Júlia Alencar Pacheco, os opioides são usados para aliviar a dor de maior intensidade, sendo que a escolha da medicação depende de necessidades individuais da parturiente, bem como da avaliação do médico."A morfina é um opioide forte e pode ser administrada por via intravenosa, oral ou epidural. É frequentemente usada para o alívio da dor intensa durante e após o parto e utilizada em ambiente hospitalar. Já o tramadol e a codeína são mais fracos e podem ser administrados por via oral, fora do ambiente hospitalar, para o alívio da dor moderada a intensa", detalha.

A obstetra conta que grandes associações médicas, como o Colégio Americano de Obstetras e Ginecologistas (ACOG) e a Academia Americana de Pediatria (AAP), recomendam que as mulheres que receberam opioides durante o parto ou no pós-parto sejam encorajadas a amamentar. "O remédio passa para o leite materno, o que pode afetar o recém-nascido. No entanto, a maioria é segura para uso em lactentes quando administrada em doses apropriadas" afirma.

A equipe de cientistas do Canadá atestou o fato. Eles analisaram dados de 624.667 mães e filhos liberados uma semana após o parto no Hospital de Ontário, entre 1º de setembro de 2012 e 31 de março de 2020. Das mulheres, 85.852 (14%) receberam opioides e 538.815 (86%), não. Cada adulta medicada com a droga foi colocada em dupla com uma participante em condição oposta, mas que tivesse outras características semelhantes, como idade e condições de saúde.

Segundo Zipursky, a maior dificuldade da pesquisa foi montar esses pares. "Mulheres com opioides prescritos no pós-parto podem ser diferentes daquelas que não tiveram a prescrição. Nós queríamos ter certeza de que os pares de mães-filhos com prescrição seriam parecidos com os pares sem os opioides. Utilizamos algumas técnicas avançadas de estatísticas chamadas correspondência de pontuação de propensão, para que os grupos fossem o mais similares possíveis em características básicas", conta.

UTI neonatal

De todas as participantes do estudo, 81% fizeram o parto cirúrgico, a cesariana. Os opioides usados — por, em média, três dias — foram oxicodona (42%), codeína (20%), morfina (19%) e hidromorfona (12%). Os bebês foram observados por 30 dias, a fim de notar se apresentariam algum problema sério de saúde, como necessidade de readmissão no hospital, procura por atendimento de emergência, encaminhamento para a unidade de terapia intensiva (UTI) neonatal ou morte causada por qualquer fator.

Após considerar fatores como a idade e o histórico médico das mulheres, os pesquisadores descobriram que, dos bebês admitidos no hospital nos 30 dias após a alta, 2.962 (3,5%) haviam nascido de mulheres que tiveram opioides prescritos e 3.038 (3,5%), de mães que não receberam o remédio para amenizar a dor. A conclusão da equipe é de que não há um aumento de tendência de atendimento médico devido ao contato precoce com a medicação. Houve uma pequena diferença nos casos de necessidade de admissão na emergência. Bebês que tiveram contato com opioides por meio da amamentação apresentaram 0,41% a mais de risco.

Sonolência

A ginecologista e obstetra Domingues Thimoti ressalta que os nenéns cuja mãe é submetida ao tratamento com opioides podem apresentar alguns sintomas. "A exposição pelo leite materno causa uma variedade de efeitos, dependendo da quantidade de medicamento ingerido e da duração da exposição. Entre eles, estão a sedação, deixando os bebês mais sonolentos. Em doses elevadas, pode causar depressão respiratória, problemas gastrointestinais e atraso no desenvolvimento motor", diz. "É importante lembrar que esse tipo de exposição geralmente é muito menor do que a que ocorreria se o medicamento fosse administrado diretamente ao bebê."

Chamou a atenção dos cientistas do Canadá a baixa taxa de admissão em hospital em decorrência de icterícia em bebês de mulheres que usaram opioides após o parto. A hipótese do grupo é de que isso decorreu do aumento do uso de fórmula para alimentar os recém-nascidos.

Apesar de os resultados finais entrarem em concordância com a hipótese inicial do grupo, Jonathan aponta para a falta de dados sobre a amamentação dos recém-nascidos monitorados. "Uma das limitações do nosso trabalho foi não saber sobre o andamento da amamentação no grupo de pacientes estudados. De qualquer forma, em Ontário, no Canadá, a taxa de amamentação imediata no pós-parto é cerca de 90%", contextualiza.

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Avaliação criteriosa

“O uso de medicamentos por mulheres na fase de amamentação deve ser guiado, sobretudo, pela avaliação criteriosa de riscos e benefícios, atentando-se sobretudo ao ajuste da dose e ao tempo de duração do tratamento. A informação importante que podemos carregar a respeito desse artigo é que há segurança no uso de opioides por puérperas desde que haja indicação, que as doses sejam adequadas e monitoradas. Esse artigo resguarda também que não se justifica contraindicar o uso de determinadas medicações, principalmente aquelas indicadas para alívio da dor, baseada apenas no fato de que a mulher está lactante.” - Marcelle Domingues Thimoti, ginecologista e obstetra

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