ALIMENTAÇÃO

Alimentos da Nestlé para bebês em países pobres têm açúcar elevado, diz ONG

No Brasil, três quartos dos cereais infantis da marca Cerelac (conhecidos como Mucilon) têm adição de açúcar, sendo três gramas por porção em média. A Nestlé afirmou que na última década diminuiu em 11% a quantidade total de açúcares adicionados no portfólio de cereais infantis em todo o mundo

De acordo com a Nestlé, durante a última década, a empresa em 11% a quantidade total de açúcares adicionados no portfólio de cereais infantis em todo o mundo -  (crédito: Reprodução/Freepik)
De acordo com a Nestlé, durante a última década, a empresa em 11% a quantidade total de açúcares adicionados no portfólio de cereais infantis em todo o mundo - (crédito: Reprodução/Freepik)

As duas principais marcas de alimentos para bebês e crianças que a Nestlé promove como saudáveis e essenciais para o desenvolvimento das crianças em países de baixo e médio rendimento, incluindo o Brasil, contêm elevados níveis de açúcar adicionado. A afirmação consta no relatório das ONGs internacionais Public Eye e Ibfan, publicado na última quarta-feira (17/4).

O levantamento é referente aos produtos Nido (ou Ninho) e Cerelac (ou Mucilon). Em alguns mercados da Europa, inclusive na Suíça, onde fica a sede da empresa, os alimentos são comercializados sem adição de açúcar.

"Na Suíça, a Nestlé promove os seus cereais 'sabor biscoito' para bebês de seis meses com as palavras 'sem adição de açúcar'; enquanto no Senegal ou na África do Sul, cereais Cerelac do mesmo sabor contêm 6 gramas de açúcar adicionado por porção", diz o relatório.

As ONGs também apontam que no Brasil, que é o segundo maior mercado do mundo, com vendas de cerca de US$ 150 milhões em 2022, três quartos dos cereais infantis da marca Cerelac (conhecidos como Mucilon) têm adição de açúcar, sendo três gramas por porção em média.

"Na Índia, onde as vendas ultrapassaram 250 milhões de dólares em 2022, todos os cereais infantis Cerelac contêm açúcar adicionado – quase três gramas por porção, em média. Com quatro ou mais gramas de açúcar adicionado por porção, a situação na África do Sul, o principal mercado de produtos Cerelac no continente africano, é ainda mais preocupante", cita o levantamento.

Já no caso do Ninho, no Brasil o produto não tem adição de açúcar. No entanto em outros países, como Nigéria, Senegal, Bangladesh e África do Sul – onde o Nido é uma das marcas mais populares – todos os produtos para crianças de um a três anos contêm açúcar adicionado.

O que diz a Nestlé?

Ao Correio, a Nestlé afirmou que a empresa acredita na qualidade nutricional dos produtos para a primeira infância e que prioriza a utilização de ingredientes de alta qualidade e adaptados ao crescimento e desenvolvimento das crianças.

"Aplicamos os mesmos princípios de nutrição, saúde e bem-estar em todos os lugares onde operamos. As categorias de alimentos infantis são altamente regulamentadas. Nosso portfólio segue tais regulamentações locais (Anvisa) e/ou padrões internacionais (OMS), incluindo requisitos de rotulagem e limites de carboidratos - que incluem açúcares. Além disso, declaramos os açúcares totais e adicionados dos nossos produtos", disse.

De acordo com a Nestlé, durante a última década, a empresa diminuiu em 11% a quantidade total de açúcares adicionados no portfólio de cereais infantis em todo o mundo. "Também continuaremos inovando e reformulando nossos produtos para reduzir ainda mais o nível de açúcares adicionados sem comprometer a qualidade, a segurança e o sabor", garante.

"No Brasil, Mucilon possui em seu portfólio itens sem e com açúcares adicionados, de acordo com os limites estabelecidos como seguros pela Anvisa. Já Ninho não contém açúcares adicionados como sacarose e xarope de glicose. Variações nas receitas entre países dependem de vários fatores, incluindo regulamentos e disponibilidade de ingredientes, por exemplo, e não comprometem a qualidade e a segurança dos nossos produtos. Apoiamos a recomendação da Organização Mundial de Saúde (OMS) de amamentação exclusiva durante os primeiros seis meses de vida, seguida pela introdução de alimentos complementares adequados, juntamente com a amamentação sustentada até aos dois anos de idade ou mais", emenda a Nestlé.

O que diz a Anvisa?

Segundo a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), em relação às fórmulas infantis, o uso de açúcares é permitido em circunstâncias específicas, especialmente quando a fórmula é produzida com proteínas hidrolisadas. No entanto, a sacarose, glicose e xarope de glicose não são amplamente permitidos como fonte de carboidratos para fórmulas em geral.

Já para os alimentos de transição e à base de cereais para lactentes e crianças de primeira infância, que geralmente são introduzidos após os 6 meses, a agência reguladora citou que as Portarias nº 34 e 36/1998 permitem a adição de açúcares como ingredientes opcionais.

Veja a nota da Anvisa na íntegra:

Os padrões sanitários para alimentos destinados à faixa etária de zero a 2 anos, que englobam lactentes e crianças de primeira infância, são regulamentados por normativas específicas, a saber:

  • RDC nº 43, 44 e 45/2011, que estabelecem diretrizes para fórmulas infantis;
  • Portaria nº 34/1998, que regula os alimentos de transição para lactentes e crianças de primeira infância;
  • Portaria nº 36/1998, que normatiza os alimentos à base de cereais para lactentes e crianças de primeira infância.

Conforme essas regulamentações, lactentes são definidos como crianças de zero a doze meses de idade incompletos, enquanto crianças de primeira infância são aquelas entre doze meses e três anos de idade.

No que diz respeito às fórmulas infantis, o uso de açúcares é permitido em circunstâncias específicas, especialmente quando a fórmula é produzida com proteínas hidrolisadas. No entanto, a sacarose, glicose e xarope de glicose não são amplamente permitidos como
fonte de carboidratos para fórmulas em geral, conforme estipulado no artigo 19 das RDCs nº 43 e 44/2011.

Quanto aos alimentos de transição e à base de cereais para lactentes e crianças de primeira infância, que geralmente são introduzidos após os 6 meses para promover a adaptação progressiva a alimentos sólidos, as Portarias nº 34 e 36/1998 permitem a adição de
açúcares como ingredientes opcionais.

É fundamental destacar que as novas regulamentações para rotulagem nutricional, estabelecidas pela RDC nº 429 e IN nº 75/2020, exigem a declaração dos açúcares adicionados na tabela de informação nutricional, inclusive para esses alimentos. Além disso, esses produtos estão sujeitos à rotulagem nutricional frontal, caso os teores de açúcares, gorduras saturadas ou sódio atinjam os limites estabelecidos na legislação.

É importante ressaltar que as regulamentações mencionadas estão em processo de revisão e consolidação, conforme previsto no Decreto 10.139/2019, com atualizações pontuais para garantir a segurança e convergência internacional. Alterações nos requisitos de composição não foram feitas, com exceção da inclusão de ingredientes aprovados. A proposta completa está disponível para consulta pública nos termos das Consultas Públicas nº 1242 e 1243/2024 no portal da Anvisa.

O relatório intitulado Como a Nestlé está viciando crianças em açúcar em países de baixo rendimento pode ser acessado na íntegra neste link.

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postado em 19/04/2024 14:52 / atualizado em 20/04/2024 14:08
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