PESQUISA CIENTÍFICA

Desmatamento intensifica seca e calor na Amazônia, revela estudo da USP

Pesquisa inédita feita pela Universidade de São Paulo (USP) mostra que perda da floresta responde por 74% da redução das chuvas e 16% do aumento da temperatura na estação seca

O desmatamento da Amazônia brasileira tem impactos muito mais profundos no clima do que se imaginava. Um estudo liderado por cientistas da Universidade de São Paulo (USP), publicado nesta semana na revista Nature Communications, revela que a perda da floresta é responsável por cerca de 74,5% da redução das chuvas e por 16,5% do aumento da temperatura máxima durante a estação seca na região.

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A pesquisa é considerada inédita por quantificar de forma separada os efeitos do desmatamento e das mudanças climáticas globais no bioma amazônico, algo que até então não havia sido mensurado com essa precisão.

O trabalho analisou dados ambientais, mudanças atmosféricas e cobertura da terra em uma área de aproximadamente 2,6 milhões de quilômetros quadrados da Amazônia Legal, no período de 1985 a 2020. Ao separar os impactos locais (desmatamento) dos globais (mudanças climáticas causadas pela poluição em escala planetária), os pesquisadores conseguiram identificar o peso de cada fator sobre o regime climático amazônico.

Redução das chuvas

Durante a estação seca, de junho a novembro, as chuvas diminuíram cerca de 21 milímetros por ano ao longo das últimas décadas. Desse total, 15,8 mm são atribuídos diretamente à perda florestal. Esse impacto representa quase três quartos (74,5%) da redução registrada no período. Segundo os cientistas, o desmatamento intensifica a sazonalidade da Amazônia, prolongando a seca e criando condições mais propícias para queimadas e incêndios florestais.

O estudo também aponta que a temperatura máxima na estação seca subiu em média 2 °C no período analisado. Desse aumento, 16,5% têm origem no desmatamento, enquanto o restante se deve às mudanças climáticas globais.

Os pesquisadores destacam que os efeitos da perda de floresta são mais intensos nos estágios iniciais: entre 10% e 40% de cobertura florestal perdida já são suficientes para provocar mudanças significativas no clima local.

A Amazônia, maior floresta tropical do planeta e uma das regiões mais biodiversas do mundo, desempenha papel central na regulação do clima. O bioma é responsável pelos chamados “rios voadores”, correntes de umidade que abastecem outras áreas do Brasil e da América do Sul.

Com a continuidade do desmatamento, alertam os cientistas, a tendência é de queda ainda maior nas chuvas e elevação das temperaturas durante a seca, colocando em risco a resiliência da floresta. Já há indícios de alteração nos padrões da monção sul-americana, levando a condições mais secas e agravando episódios extremos como as secas severas de 2023 e 2024.

O levantamento também analisou as concentrações de dióxido de carbono (CO?) e metano (CH?). Os resultados mostram que mais de 99% do aumento nas taxas desses gases ao longo dos últimos 35 anos está ligado a emissões globais. Ainda assim, no nível local, o desmatamento compromete a capacidade da floresta de capturar CO?, agravando os efeitos do aquecimento.

O estudo tem como primeiro autor o pesquisador Marco Aurélio Franco e como coautor o meteorologista Luiz Augusto Toledo Machado, ambos da USP. A pesquisa contou com apoio da FAPESP e parceria com a Academia Chinesa de Ciências.

Principais descobertas:

  • Redução das chuvas: o desmatamento é responsável por 74,5% da diminuição das chuvas durante a estação seca (de junho a novembro). Dos 21 mm de redução anual, 15,8 mm são diretamente causados pela perda de floresta.

  • Aumento da temperatura: a perda de floresta contribui para 16,5% do aumento da temperatura máxima na estação seca, enquanto o restante é atribuído a fatores climáticos globais. A temperatura máxima subiu 2 °C em média no período analisado (1985-2020).

  • Efeitos intensos: as mudanças climáticas locais causadas pelo desmatamento são mais intensas em seus estágios iniciais. Uma perda de apenas 10% a 40% da cobertura florestal já provoca impactos significativos.

  • Risco para a floresta: o desmatamento prolonga a seca e aumenta a frequência de queimadas, comprometendo a resiliência da floresta e sua capacidade de autorregulação. O estudo também aponta uma alteração nos padrões das monções, agravando eventos climáticos extremos como as secas de 2023 e 2024.

  • Gases de efeito estufa: embora o aumento global de CO? e metano seja a principal causa da crise climática, o desmatamento na Amazônia agrava o problema ao reduzir a capacidade da floresta de absorver esses gases.

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