O consumo rotineiro de alimentos ricos em polifenóis — compostos naturais presentes em alimentos como café, chá, frutas e azeite — está associado à redução do risco de doenças cardiovasculares, segundo um estudo com 3,1 mil adultos, publicado na revista BMJ Medicine. As propriedades anti-inflamatórias e antioxidantes dessas substâncias já são conhecidas, mas, agora, pesquisadores do King's College London também usaram análises laboratoriais para confirmar, biologicamente, os efeitos protetores para o coração.
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Os dados avaliados são do TwinsUk, um estudo longitudinal que, por 11 anos, registrou diversos aspectos de estilo de vida e saúde de moradores do Reino Unido na faixa dos 16 aos 98 anos. No recorte atual, o interesse dos pesquisadores foi a ingestão de alimentos ricos em polifenóis. Os cientistas desenvolveram um índice específico para captar, detalhadamente, os padrões de consumo dessas substâncias. Então, compararam os escores com marcadores de pressão arterial, perfil lipídico e ocorrência de eventos cardiovasculares.
A análise demonstrou que o consumo frequente de alimentos com esses compostos está associado a um retardamento do risco cardiovascular esperado com o envelhecimento. Além da relação observacional — que não estabelece causa e efeito —, os cientistas avaliaram substâncias químicas na urina dos participantes geradas pelo metabolismo dos polifenóis. A investigação reforçou que aqueles com maior exposição ao grupo molecular estudado tinham menos biomarcadores associados a doenças do coração.
Grupos
Segundo o estudo, dois grupos de polifenóis se destacaram: flavonoides (presentes em frutas, cacau, chá) e ácidos fenólicos (encontrados em café, grãos integrais, nozes, azeite). Participantes com maiores níveis urinários desses metabólitos tinham menor risco cardiovascular estimado e taxas mais elevadas de HDL — o "colesterol bom". A autora sênior do estudo, Ana Rodriguez-Mateos, disse, em nota, que mesmo pequenas mudanças sustentadas na rotina, como incluir mais frutas vermelhas, grãos integrais e vegetais, podem significar muito para a saúde do coração ao longo do tempo.
A nutricionista Rayanne Marques, de Brasília, explica que os polifenóis não são considerados nutrientes essenciais, como vitaminas e minerais, mas exercem funções importantes no organismo, principalmente pelas propriedades antioxidantes e anti-inflamatórias. "Não existe uma recomendação diária oficial para o consumo de polifenóis, mas uma alimentação variada, colorida e baseada em alimentos in natura costuma garantir níveis adequados", diz. "Uma forma prática de assegurar uma boa ingestão diária é incluir pelo menos três porções de frutas, especialmente frutas vermelhas e uvas arroxeadas, além de vegetais bem coloridos, chás e azeite. Quanto mais diversidade de cores no prato, maior a chance de atingir bons níveis naturalmente", ensina.
Embora o vinho tinto também seja rico em um tipo de polifenol, o resveratrol, nem os autores do estudo nem especialistas recomendam bebidas alcoólicas como fonte da substância, também abundante em uvas. "Pesquisas recentes mostram que qualquer quantidade de álcool traz algum risco à saúde, especialmente hipertensão, arritmia cardíaca e certos tipos de câncer, além de afetar a qualidade do sono e a saúde mental", reforça a nutricionista clínica e funcional Carla Bispo. "As formas mais seguras e eficazes de obter os polifenóis do vinho são uvas escuras, mirtilo e amora, cacau, chocolate amargo, azeite de oliva, nozes, e chás verde e preto."
Revisões
O estudo da King's College London reforça uma série de revisões e metanálises científicas recentes sobre a associação entre polifenóis e proteção ao sistema cardiovascular. Isso não acontece apenas pela atividade antioxidante dessas substâncias, como se pensava há algumas décadas, mas por outros mecanismos, como a modulação de vias de sinalização, inflamação, metabolismo de lipídios e funcionamento endotelial.
"Nossa pesquisa fornece fortes evidências de que incluir regularmente alimentos ricos em polifenóis na dieta é uma maneira simples e eficaz de promover a saúde do coração", comenta Yong Li, primeiro autor do artigo publicado na BMJ Medicine. "Esses compostos vegetais estão amplamente disponíveis em alimentos do dia a dia, tornando essa uma estratégia prática para a maioria das pessoas." Ele observa, porém, que mais estudos futuros são necessários para aprofundar as associações encontradas.
Li e Rodriguez-Mateos lembram que, embora promissores, os dados precisam ser interpretados com cautela, pois a forma como o corpo absorve e transforma os compostos depende de fatores individuais, da matriz alimentar e da maneira de preparo dos alimentos. Além disso, a nutricionista Rayanne Marques esclarece que as pesquisas se concentram em intervenções alimentares, e não no uso de suplementos. "Eles podem ser úteis em situações específicas, mas não oferecem a mesma complexidade presente em um alimento inteiro", diz. "Para a maioria das pessoas, é mais vantajoso priorizar a ingestão por meio dos alimentos. A suplementação deve ser avaliada individualmente, de acordo com necessidades específicas e sempre com acompanhamento profissional."
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