novo remédio

Cientistas criam remédio contra IST resistente a antibióticos

Medicamento de dose única mostra ótimos resultados na tratamento de gonorreia que desenvolveu resistência aos remédios convencionais. Brasil registra 500 mil novos casos a cada ano

Especialistas acreditam que dose oral única irá aumentar adesão ao tratamento -  (crédito: Freepik)
Especialistas acreditam que dose oral única irá aumentar adesão ao tratamento - (crédito: Freepik)

Um novo medicamento oral de dose única, chamado zoliflodacina, tem gerado resultados promissores contra a gonorreia — uma infecção sexualmente transmissível (IST) — resistente a antibióticos. É o que apontam o ensaio clínico de fase 3 publicado ontem na revista The Lancet. O estudo constatou ainda que uma dose do remédio foi tão eficaz quanto o tratamento padrão atual, que combina dois antibióticos — uma injeção de ceftriaxona seguida da ingestão de azitromicina.

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A gonorreia é uma das infecções sexualmente transmissíveis mais comuns, afetando cerca de 82 milhões de pessoas em todo o mundo anualmente, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS). No entanto, o tratamento da condição tem sido cada vez mais difícil, pois as bactérias causadoras continuam desenvolvendo resistência aos antibióticos atuais. No Brasil, o Ministério da Saúde estima que sejam registrados aproximadamente 500 mil novos casos por ano, sobretudo de adolescentes e adultos entre 15 e 24 anos.

Para os cientistas, o novo medicamento tem o potencial de ajudar a retardar a disseminação de bactérias resistentes a antibióticos, além de tornar o tratamento da gonorreia mais acessível em todo o planeta. O ensaio clínico internacional envolveu mais de 900 pessoas em Estados Unidos, África do Sul, Tailândia, Bélgica e Holanda. 

Durante o ensaio, os participantes receberam o novo comprimido ou o tratamento padrão. Os resultados evidenciaram que a zoliflodacina curou mais de 90% das infecções na região genital. O medicamento foi bem tolerado, com efeitos colaterais semelhantes aos observados na abordagem atual, e nenhum problema grave de segurança foi relatado.

Peça importante

Para a infectologista Luiza Matos e o coloproctologista Danilo Munhóz, se a zoliflodacina for incorporada aos protocolos nacionais, ela tende a ser uma peça importante no arsenal contra a gonorreia, sobretudo em três situações. Primeiro, em casos em que o paciente tem alergia a antibióticos da família da ceftriaxona ou medo de injeção. Segundo, em regiões ou serviços que não têm estrutura para aplicação intramuscular e conservação de medicamentos injetáveis. Terceiro, como opção estratégica em cenários de falha terapêutica ou de resistência aos esquemas atuais.

O infectologista do Hospital Brasília, da Rede Américas, Henrique Valle Lacerda frisa que, do ponto de vista operacional e epidemiológico, um comprimido de dose única reduz barreiras logísticas e tende a aumentar a adesão ao tratamento. "Estatisticamente, a diferença entre eficácia — o que a droga faz em estudo — e efetividade — o que ela faz na prática — muitas vezes se explica pela adesão. Uma abordagem inalcançável ou que exige retorno para injeção terá maior perda de efetividade. A dose única oral minimiza perdas por não comparecimento ou administração incorreta, o que se traduz em maior probabilidade de cura na população real."

Atualmente, a zoliflodacina aguarda aprovação da agência regulatória dos Estados Unidos, a Food and Drug Administration (FDA). Os autores afirmam que, se aprovada, ela poderá melhorar significativamente os esforços globais para controlar infecções por gonorreia resistentes a medicamentos, apoiar o cuidado liderado pela comunidade e proteger a saúde reprodutiva de milhões de pessoas, já que a condição pode causar infertilidade tanto em homens quanto em mulheres. 

 

Alta prevalência

As infecções sexualmente transmissíveis ainda são muito prevalentes no Brasil. Temos estratégias de prevenção para o HIV cada vez mais efetivas, porém as outras condições ainda demonstram taxas muito significativas e muito preocupantes — como a sífilis, a clamídia, o HPV e a gonorreia, que têm a mesma forma de transmissão. Por isso, todas as estratégias que facilitem o rápido diagnóstico, o rápido tratamento, são altamente desejáveis. O diagnóstico da gonorreia é feito muito pelo quadro clínico do paciente. Então, ainda temos essa dificuldade de ter uma avaliação mais precisa. Não conseguimos ainda fazer esse teste de sensibilidade da bactéria aos antibióticos, essa é uma questão que também precisa ser resolvida para o futuro, mas ter uma nova opção de tratamento oral de dose única vai ajudar bastante.

Valéria Paes, médica infectologista do Sírio-Libanês, em Brasília

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postado em 12/12/2025 05:10
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