SAÚDE CEREBRAL

Seis sintomas predizem demência 20 anos antes

Depressão na meia-idade é identificada como fator de risco para declínio cognitivo na velhice. Perceber padrões pode abrir caminho para prevenção precoce

Ideia é identificar risco o quanto antes, para possibilitar envelhecimento com mais saúde -  (crédito: Reprodução/Freepik)
Ideia é identificar risco o quanto antes, para possibilitar envelhecimento com mais saúde - (crédito: Reprodução/Freepik)

Meia dúzia de sintomas durante a vida adulta identificam o risco de demência com mais de duas décadas de antecedência. É o que revela um novo estudo liderado por pesquisadores da University College London (UCL). A depressão na meia-idade tem sido considerada um fator de risco para declínio cognitivo na velhice. Agora, as descobertas publicadas na revista The Lancet Psychiatry sugerem que essa relação é alimentada por um pequeno conjunto de ocorrências específicas, e não pela condição em geral.

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Conforme os pesquisadores, os sintomas são: perder a confiança em si; ser incapaz de encarar os problemas; não sentir carinho e afeto pelos outros; ficar nervoso e tenso o tempo todo; estar insatisfeito com como as tarefas são executadas; ter dificuldades de concentração. Os cientistas afirmam que focar nessas seis questões ao tratar pacientes com depressão na meia-idade pode reduzir o risco de desenvolverem demência mais tarde na vida, mas que são necessárias mais pesquisas sobre essa relação.

Autor principal e professor da UCL, Philipp Frank afirma que esses são sintomas comuns que muitas pessoas experimentam na meia-idade. "Eles parecem conter informações importantes sobre a saúde cerebral a longo prazo. Prestar atenção a esses padrões pode abrir novas oportunidades para a prevenção precoce."

Buscando respostas

Conforme o neurologista do Hospital Brasília, da Rede Américas, Carlos Uribe, a relação entre depressão e demência é complexa. "Pode ser que, na verdade, a depressão seja a primeira manifestação de um quadro demencial. São relações bem complicadas, que, com esse tipo de estudo, estão tentando se desvendar. É provável que eles planejem fazer alguma nova coorte [grupo de pessoas para um estudo] ou, inclusive, algum tipo de estudo experimental mesmo, quase experimental, onde conseguem controlar algumas variáveis e saber melhor se essa associação se mantém ou não."

Para o trabalho, os pesquisadores analisaram dados de 5.811 adultos de meia-idade que participaram do estudo Whitehall II. Os sintomas depressivos foram avaliados entre 1997 e 1999, utilizando um questionário que abrangia 30 sintomas comuns. O estado de saúde dos voluntários foi então acompanhado por 25 anos. Durante esse período, 10,1% desenvolveram demência.

As análises evidenciaram que os participantes classificados como deprimidos — aqueles que relataram cinco ou mais sintomas — na meia-idade apresentaram um risco 27% maior de desenvolver demência posteriormente. No entanto, esse aumento foi impulsionado inteiramente pelos seis sintomas específicos. Em particular, a perda de autoconfiança e a dificuldade em lidar com problemas foram associadas a uma elevação de aproximadamente 50% nas chances de declínio cognitivo.

Os pesquisadores observaram que sintomas como perda de autoconfiança, dificuldade em lidar com problemas e falta de concentração podem levar à redução do envolvimento social e a menos experiências cognitivamente estimulantes. Essas duas características são importantes para manter a reserva cognitiva — ou seja, a capacidade do cérebro de lidar com danos ou doenças, permitindo que você mantenha o pensamento e o funcionamento normais mesmo quando o cérebro é afetado fisicamente.

Mais estudos

Muitos trabalhos mostram que é mais produtivo focar em sintomas específicos da síndrome depressiva, em vez de tratar a depressão como um bloco único. Isso porque essa é uma condição extremamente heterogênea. O estudo em questão tem o mérito de analisar isso. No entanto, trata-se de um trabalho populacional, não clínico. Ou seja, utiliza instrumentos gerais de avaliação de sintomas depressivos aplicados a uma população muito ampla. Com isso, perde em detalhamento clínico, mas ganha em robustez estatística, tanto pela quantidade de pessoas analisadas quanto pelo longo período de acompanhamento para observar o desfecho de demência. Na prática clínica, bons estudos revelam que os sintomas mais fortemente associados ao desenvolvimento de demência são justamente aqueles ligados à apatia e à lentificação cognitiva, como dificuldades executivas, problemas de concentração e de realização de tarefas.

Lucas Mella, psiquiatra, especialista em psicogeriatria e diretor científico da Associação Brasileira de Alzheimer SP

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postado em 16/12/2025 05:04
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