
Por Alexandre Agra Belmonte* —A intensa procura da Justiça do Trabalho tem sido motivo de alarde e preocupação para quem veja na gratuidade a grande vilã e nos juízes que as concedem, os responsáveis.
A judicialização trabalhista preocupa, mas o alto índice de gratuidades decorre do fato da Justiça do Trabalho contar com clientela formada de desempregados (ninguém reclama no curso do contrato com receio da despedida) e de trabalhadores juridicamente pobres. Segundo o Censo 2022 do IBGE, 90% dos brasileiros ganham menos de R$ 3,5 mil e deles, 70% recebem até dois salários-mínimos.
É alto o número de causas trabalhistas ajuizadas ao longo do tempo e em tramitação. Mas o Brasil é o país com a maior rotatividade da mão de obra do mundo. Ao menos 30% das lides versam sobre rescisões impagas. São trabalhadores cuja única alternativa na busca do recebimento de seus direitos procuram a Justiça do Trabalho e, porque desempregados, requerem gratuidade.
Além disso, o país é um dos campeões mundiais de acidentes do trabalho por doenças e lesões físicas e mentais. As inabilitações culposas geram imensa quantidade de reclamações indenizatórias.
Apreciados apenas esses dois aspectos, já temos um retrato de que parte significativa das lides trabalhistas são uma consequência do sistema. Não é possível culpar a própria vítima que judicializa para buscar verbas alimentares.
A Constituição de 1988 garante o acesso fundamental ao Poder Judiciário. A gratuidade de justiça visa a abrir as portas do Judiciário a pessoas e entidades que se tivessem que pagar para estar em juízo não conseguiriam, sendo a assistência judiciária o procedimento a ser observado na concessão do benefício.
Mais de 75% da clientela da Justiça do Trabalho é de trabalhadores despedidos, e empregado sem emprego não tem salário. Mesmo os que tinham um salário razoável quando empregados, passam a receber, até encontrarem outro emprego, o valor máximo de seguro desemprego, hoje de R$ 2.424,11 mensais por até cinco meses. Isso se não estiverem em juízo na busca da satisfação das parcelas rescisórias impagas.
Contrariamente à facilitação, dificultar o acesso à Justiça do Trabalho como regra geral atinge em cheio o trabalhador juridicamente pobre e não resolve as causas que levam aos conflitos e à judicialização. O correto é derrubar barreiras para acesso aos direitos e à justiça social, e não o contrário.
A judicialização trabalhista é devida a uma série de fatores, entre eles o descumprimento estrutural da legislação; a ineficiência da fiscalização; a inexistência de meios administrativos de prevenção e conciliação de conflitos; o desemprego rotativo; a quantidade de lides trabalhistas versando sobre rescisões impagas; o altíssimo número de acidentes do trabalho; e a busca consequente por indenizações.
Com base nos dados acima apresentados, penso ser possível estabelecer critérios objetivos e fincados na realidade da vida para a concessão do benefício da justiça gratuita trabalhista:
- Ainda que empregado, quem ganha menos do que 5 mil reais mensais e está, inclusive, isento de pagar Imposto de Renda, é porque não tem como arcar com custas, despesas processuais e honorários de advogado;
- Quem está desempregado, enquanto se encontrar nessa situação;
- Quem está recebendo seguro desemprego, porque presume-se, está desempregado e sem receber numerário suficiente para arcar com custas, despesas processuais e honorários;
- Quem não recebeu a rescisão contratual, incluindo aquele que está pleiteando a reversão da justa causa indevidamente aplicada.
Em casos como esses, basta a declaração de hipossuficiência pela presunção evidente da necessidade da assistência judiciária. Mas, em caso de impugnação, o magistrado pode exigir a realização de provas para a concessão ou revisão da gratuidade.
Ministro do TST, pós-doutor em direito pela Universidade de Coimbra e presidente da Academia Brasileira de Direito do Trabalho*
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