Visão do Direito

Como o PL da Dosimetria pode alterar penas e regimes de condenados por crimes golpistas

"Ao flexibilizar penas e regimes para crimes contra o Estado Democrático de Direito, o PL da Dosimetria escancara um risco de casuísmo legislativo incompatível com o princípio da impessoalidade"

 Eixo Capital. Fernando Rogério Peluso, sócio do escritório Peluso, Guaritá, Borges e Rezende Advogados -  (crédito:  Divulgação)
Eixo Capital. Fernando Rogério Peluso, sócio do escritório Peluso, Guaritá, Borges e Rezende Advogados - (crédito: Divulgação)

Por Max Telesca* — O que muda se o PL da Dosimetria, como foi aprovado na Câmara, virar lei?

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Pela aplicação da redação do chamado PL da Dosimetria, ou seja, se ele vier a tornar-se uma lei, ocorrerão vários fenômenos jurídicos penais e de execução penal, mas dois deles se destacam: a redução da pena, em virtude da aplicação do concurso formal entre os crimes de Abolição Violenta do Estado de Direito e golpe de Estado e a progressão de regime mais benéfico para Jair Bolsonaro e os demais réus em muito menos tempo do que a atual legislação, além de prever remissão para pena cumprida em prisão domiciliar, em franco casuísmo, pois retira das regras mais rígidas de progressão os crimes previstos no Título XII do Código Penal.

Na aplicação do concurso formal, o ex-presidente continuaria condenado aos dois crimes, de Abolição Violenta do Estado de Direito e golpe de Estado, mas a ele somente seria aplicada a pena cheia do segundo, 8 anos e 2 meses, mais uma fração daquela relativa ao primeiro, um sexto até metade.

No cálculo mais benéfico, 1/6 de seis anos e seis meses, seria um ano e um mês, somando-se, portanto, para os dois crimes principais, nove anos e três meses. O PL não alude aos demais crimes pelos quais o ex-Presidente foi condenado, isto é, mais 12 anos e sete meses. O somatório final ficaria em 20 anos e nove meses, mas esse cômputo ainda passaria pelo Poder Judiciário, pois o cálculo da banda de pena do concurso formal varia até metade, ou seja, não existe nada fixo nesse ponto, dependendo, ainda do crivo judicial para fixação da dosimetria final.

A outra grande característica casuística e impessoal do projeto é que a progressão de regime, hoje, somente poderá ser feita com o cumprimento de um quarto da pena. Pelo texto do relator, como dito, Paulinho da Força, com 1/6 de cumprimento de pena, os condenados pelos crimes contra o Estado Democrático de Direito já teriam direito à progressão do regime fechado para o semiaberto mesmo com o crime tendo sido cometido com violência e grave ameaça, o que é, flagrantemente, um contrasenso, ou seja, uma lei feita sob encomenda, casuística, que fere de morte o princípio da impessoalidade que deve nortear o processo legislativo. De acordo, ainda, com o relator, segundo suas próprias manifestações, ele estaria fazendo uma conta, também, com diminuição em função de remissões, o que demonstra uma deliberada intenção legislativa em função de uma determinada pessoa.

Não se pode, sob pena de flagrante inconstitucionalidade, legislar para indivíduos específicos, condenados recentemente. Ainda há que se destacar a redução de um terço a dois terços nas penas dos crimes cometidos em contexto de multidão, beneficiando os participantes dos atos golpistas do 8 de Janeiro.

Especialista em tribunais superiores, direito civil e processo penal*

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postado em 18/12/2025 04:30
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