MEMÓRIA

Morte de Chico Science, precursor do manguebeat, completa 25 anos

O cantor morreu em um acidente de carro em 2 de fevereiro de 1997

Aline Brito
postado em 02/02/2022 22:43
 (crédito: Reprodução/Instagram)
(crédito: Reprodução/Instagram)

Há exatos 25 anos, em 2 de fevereiro de 1997, a música brasileira perdia uma figura que revolucionou a cena cultural. Chico Science perdeu a vida em um acidente de carro, cerca de um mês antes de completar 31 anos, mas vive na memória dos brasileiros e, principalmente, dos pernambucanos que tiveram o privilégio de ver e viver a inovação que ele causou na música popular brasileira.

O artista, que é fruto da miscigenação de índios, caboclos e negros, era performático e levava ao palco a essência pernambucana e brasileira. Passos de frevo, capoeira, dança dos caboclos de lança do maracatu rural, tudo regado a uma ginga do funk, com a força do rock, a alegria do samba coco e muita batucada. O artista, junto à banda Nação Zumbi, conectou “as boas vibrações do mangue” à tecnologia e uma visão pop.

“Há 25 anos o Chico partia. Assim como jamais esquecerei nossas aventuras, também não esqueço quando entrei no IML pra levar as roupas para vesti-lo, lá estava a camiseta no chão, toda rasgada, ensopada de sangue, Chico deitado nu naquela cama de alumínio, nunca me senti tão pequeno e impotente. 1/4 de século de saudade, saudade da amizade”, escreveu o produtor cultural Paulo André Pires, que produziu a banda Nação Zumbi na década de 90 e conviveu com Chico.

A morte ocorreu no momento em que a banda estava no auge. “Foi uma morte brutal. Chico começava a decolar, estava com mil projetos, teve um reconhecimento internacional muito rápido, numa época em que a música brasileira que se conhecia lá fora era a bossa nova”, relembrou o escritor José Teles, autor do livro Do Frevo ao Maguebeat.

Trajetória

“O Chico era um cara bem focado no trabalho, sabia bem o que queria”, contou Paulo André. Fruto desse foco, a carreira não demorou em deslanchar. Ao lado da Nação Zumbi, Chico lançou os álbuns “Da Lama ao Caos”, em 1994, e “Afrociberdelia”, em 1996. “A gente teve oportunidade de ir para o exterior, ainda no primeiro disco, fazer uma turnê internacional. Passamos pelos Estados Unidos e Europa. O disco foi lançado no Japão, Europa, Estados Unidos”, disse o produtor.

Na época desse primeiro lançamento, o disco ficava entre os três mais populares do Brasil, perdendo somente para Gabriel, O Pensador e Skank. As músicas de Chico Science e banda foram trilha de novela e, se Chico não tivesse partido precocemente, teria recebido disco de ouro por 100 mil cópias vendidas. “Em dezembro de 1996, uns dois a três meses antes da morte de Chico, estava em 82 mil cópias. Claro que se o Chico estivesse vivo, o disco tinha pouco mais de seis meses de lançado, ele tinha batido 100 mil cópias, disco de ouro também. Mas Chico não viveu para ver isso”, afirmou Paulo. Mesmo assim, cerca de três meses depois do falecimento do cantor, o disco de ouro foi entregue pela gravadora à equipe e integrantes da banda pelas 100 mil cópias.

O produtor avalia que “sucesso” não é a palavra que descreve fielmente o que a banda viveu no Brasil. “O que teve foi uma repercussão muito grande com essa ida para o exterior, a gente dividiu palco com grandes nomes da música pop. A gente também tocava em festivais de verão da Alemanha e da Bélgica. Isso para mim é sucesso. O Chico se tornou um nome mundial da música”, relembrou o produtor.

Science e Nação Zumbi influenciaram não só a música, mas as artes visuais, a moda, o cinema e deixaram um legado para a música brasileira que jamais será esquecido. Além disso, também lançou luz à cultura pernambucana. “Foi uma história tão incrível, que chegou tão longe. Quem morava no Recife, sabe o que era o Recife até o início dos anos 90 e a guinada, o salto que ela dá de comportamento, de autoestima, de produção cultural, quando veio o mangue. É uma energia positiva que toma conta de todo mundo”, enfatizou Paulo.

“Chico foi um cara que saiu do subúrbio de Olinda (PE) e ganhou o mundo. Chico Vive ainda. Quem vier em Recife, principalmente pela região central, mas também no subúrbio, vai ver a cada três ou quatro quarteirões pelo centro, um grafite do Chico. Chico permanece vivo nos muros da cidade, nas artes”, garantiu Paulo.

“Sua passagem tão breve foi de uma influência absurda, mexeu com a nova música brasileira, deu um impulso na cultura pernambucana que continua até hoje. A música do Chico Science & Nação Zumbi raramente toca no rádio. Mas se vendem camisetas nos camelôs, aquele chapeuzinho redondo de palha, camisetas com o rosto dele ou frases de música. Ele é o nosso Bob Marley”, opinou José.

Toda essa história e legado já virou filme e livro e vai ganhar mais um registro: Paulo André vai lançar um livro com memórias das histórias que viveu na companhia de Chico e as aventuras da Nação Zumbi. “Memórias de um Motorista de Turnês”, surgiu a partir do resgate de revistas e pôsteres da época em que eles faziam turnês internacionais. “Vou contar um pouco dessas histórias. Em 2020 foram os 25 anos da turnê ‘Da Lama ao Caos’ e em 2021 completou 25 anos da turnê ‘Afrociberdelia’. No primeiro ano da pandemia eu revivi meu acervo dessa época, escrevi bastante e vi que já tinha texto suficiente para um livro”, afirmou.

O que é manguebeat

O mangue beat foi um movimento de contracultura que surgiu em Pernambuco, no começo da década de 1990. Idealizado por Chico Science, esse movimento buscava denunciar as desigualdades e a pobreza de Pernambuco e, ao mesmo tempo, promover uma renovação cultural e artística em todo o estado. Teve no caranguejo e na parabólica na lama os seus dois grandes símbolos.

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