
Por Orlando Pontes—Num fim de semana de julho, passando de carro pelo Pistão Norte de Taguatinga, Oleca fez uma viagem à infância. Ao ver garotos soltando pipas no Taguaparque, retornou à década de 1970, quando morava na QND 12, uma quadra próxima à rodovia que hoje tem três pistas de rolamento em cada sentido.
O Pistão Norte foi criado por volta de 1971. Até então, todo o (pequeno) fluxo de carros e ônibus de Taguatinga era pelas avenidas Comercial e Samdu. Atrás das quadras hoje lindeiras ao Pistão só existia mato. E era ali que Oleca jogava futebol em campinhos de terra batida, brincava de bolinha de gude, pião, enfinca e soltava pipa, especialmente durante as férias escolares.
Jogar bola foi uma paixão, desde criança, do moleque magrelo e branquelo. Mas, as pipas sempre o atraíram de uma forma especial. E não para apenas ficar horas "de cara pro sol", como dizia Dona Xepa, sua mãe.
O processo começava com a busca das varetas para confecção das pipas. De bicicleta, ele entrava pelas veredas do Cerrado em busca de pés bambu ou de buriti. A maior fartura dessas plantas ficava a quilômetros de casa, às margens do Córrego Vicente Pires ou nos pântanos de Águas Claras, que naquele tempo não era cidade, mas apenas uma referência à residência oficial do governador do Distrito Federal.
Oleca adorava fazer suas próprias pipas. Da armação ao recorte do papel de seda em cores vivas — ele adorava a combinação azul-escuro com amarelo-ouro - emendado com grude de tapioca ou cola Tenaz. As maiores eram os piões; as menores, ratinhas; as normais, pipas, simplesmente.
Nos piões, usava um detalhe no bico e caprichava nas rabiolas, que não podiam ter menos de 10 metros de comprimento. Preferia as fitas de papel de seda, que produzem um chiado na hora do debico - manobra com a linha que faz a pipa bailar no céu. Mas, para economizar a matéria-prima das pipas, roubava sacos de lixo da despensa de Dona Xepa e fazia rabiolas de plástico. Essas têm uma vantagem: no cruza, não são cortadas facilmente pelo cerol da linha do adversário.
O cerol, aliás, hoje em dia é proibido, corretamente, devido ao risco de acidentes, em especial com motociclistas. Mas, nos tempos de infância de Oleca, era quase obrigatório. Colocar uma pipa no ar sem a mistura de vidro moído com cola de madeira ou grude era tornar-se alvo fácil dos outros meninos.
Bom mesmo era tosar as outras pipas e reinar sozinho no céu de Taguatinga antes de enrolar a linha na lata de óleo, retornar para casa com a cara queimada pelo Sol e saborear os quitutes preparados por Dona Xepa.
P.S.: O "papagaios" do título desta croniqueta é uma referência a como as pipas são chamadas em algumas regiões do país. Eles voam sem rabiola, mas raramente eram vistos no céu de Taguatinga nos tempos do menino Oleca. Assim como as arraias, que têm rabiola de tufos de algodão.
Diversão e Arte
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