CONJUNTURA

BC volta discutir taxa mínima de juros; mercado aposta em 13,75%

Consenso de analistas do mercado é que Banco Central manterá taxa Selic pela 6ª reunião consecutiva, pois incertezas ainda predominam. Expectativa ficará em torno do comunicado da autoridade monetária

Rosana Hessel
postado em 01/05/2023 03:55
 (crédito: Maurenilson Freire)
(crédito: Maurenilson Freire)

A terceira reunião do ano do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central, que começa amanhã e termina na quarta-feira (3), acontece em meio às contínuas pressões do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e de vários ministros e políticos, que questionam o atual patamar da taxa básica da economia (Selic), de 13,75% ao ano. Contudo, o consenso entre analistas do mercado financeiro ouvidos pelo Correio é de que o BC manterá inalterada a Selic pela 6ª vez consecutiva.

Para o início do ciclo de queda dos juros básicos, as opiniões divergem, pois as apostas variam entre o próximo Copom, de 20 a 21 de junho, e o penúltimo do ano, de 31 de outubro a 1º de novembro. A expectativa para a reunião desta semana gira em torno do texto do comunicado do colegiado que será divulgado, na noite de quarta, após a decisão. Apesar dessa estabilidade da Selic, o custo do crédito no mercado dispara e está cada vez mais caro, em grande parte devido ao apetite para o lucro dos bancos.

A meta de inflação deste ano, determinada pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), é de 3,25%, com teto de 4,75% ao ano. E, para o ano que vem e o próximo, a meta passa para 3%, com limite superior de 4,5% anuais. Enquanto isso, as projeções de inflação deste ano e do próximo não param de piorar, apesar da desaceleração na prévia do Índice de Preços ao Consumidor (IPCA), o IPCA 15, que registrou alta de 4,16 no acumulado em 12 meses até abril, a menor taxa para o período desde outubro de 2020. A mediana das estimativas do mercado coletadas no boletim Focus, do Banco Central, estava em 6,04% na semana passada, quarta alta consecutiva.

De acordo com os especialistas, o fato de o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, ter, finalmente, enviado ao Congresso o projeto de lei do novo arcabouço fiscal não é suficiente para que o Banco Central dê um cavalo de pau no discurso de alerta sobre os riscos de desancoragem das expectativas para a inflação de 2024 — que está no radar do Copom. Será difícil para um órgão independente reduzir os juros agora, quando que vários bancos centrais de países desenvolvidos e emergentes seguem aumentado as taxas, porque os indicadores de atividade recentes ficaram acima das expectativas. Outro consenso, por exemplo, é que o Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estados Unidos) pare o ciclo de alta dos juros norte-americanos na quarta-feira.

Para Caio Megale, economista-chefe da XP Investimentos, o Copom deverá manter a mesma redação anterior, mas antecipou para agosto o início do ciclo de queda na Selic. "Estamos com uma projeção de Selic parada em 13,75%, nesta semana, e não acho que haverá mudança na comunicação oficial pós-decisão. O BC deverá vir com o mesmo tom da ata anterior com a principal mensagem que é paciência. Acreditamos que o Copom iniciará um ciclo de flexibilização gradual no segundo semestre. Projetamos um corte de 0,25 ponto percentual na reunião do Copom de agosto, seguidos de cortes sequenciais de 0,50 ponto percentual até atingir 11% no primeiro semestre de 2024", destaca.

Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados, também não vê mudanças no cenário macroeconômico desde a última reunião do Copom, em março. "Acho que o BC tem mais motivos ainda de preocupação, especialmente por conta do arcabouço fiscal apresentado e que vai ser, provavelmente, alterado no Congresso. Precisamos saber o que é que vai ser essa alteração, se para melhor ou se para pior. Espero que seja para melhor", afirma. Ele manteve a previsão para o início da queda da Selic em setembro. Ele aponta ainda muitas incertezas no radar, principalmente, a discussão de mudança na meta de inflação que não está totalmente descartada ainda. "Tem a discussão da meta de inflação que vai aparecer pela frente e espero que também seja pela manutenção em 3%", ressalta.

copom
copom (foto: editoria de arte)

Nova meta

Em junho, o CMN deverá se reunir para definir a meta de inflação de 2026 e confirmar ou mudar as atuais de 2024 e de 2025. Na avaliação de Marco Caruso, economista-chefe do Banco Original, a mudança da meta só vai piorar as expectativas de inflação, o que vai fazer com que a queda da Selic demore ainda mais. "A mudança da meta de inflação de 2024 na direção para as projeções do Focus, de 4% a 4,5%, poderá ser um gatilho para as expectativas, porque o aumento da meta só se justificaria se houvesse um choque inflacionário exógeno. Mas não estamos nessa situação de choque externo no momento", diz ele, acrescentando que os preços das commodities, por exemplo, estão caindo em meio à desaceleração da economia global.

Caruso também não vê impacto positivo do novo arcabouço fiscal para acalmar as incertezas em torno da questão fiscal, que acabam deixando o Banco Central sem muito instrumento para conseguir colocar a inflação dentro da meta. "O arcabouço está sob júdice, porque tem uma dependência muito grande de arrecadação e não é estruturante. Ele pode ajudar as contas públicas nos próximos dois a quatro anos, mas não ganha a batalha (para o equilíbrio das contas públicas)", resumiu Caruso, que passou a prever corte da Selic apenas na penúltima reunião do Copom. Antes, a aposta para a redução nos juros básicos era a partir do primeiro trimestre de 2024.

José Francisco de Lima Gonçalves, economista-chefe do Banco Fator, é mais otimista e espera uma sinalização do BC de que vai haver queda nos juros a partir de junho diante da desaceleração da inflação e da tramitação do novo arcabouço no Congresso. "No cenário em que o arcabouço avança, mesmo sem certeza sobre a arrecadação, cai a incerteza e dá para o BC reduzir a Selic em junho."

O novo arcabouço fiscal ainda precisa ter impacto nas expectativas para influenciar a política monetária, de acordo com Roberto Padovani, do Banco BV. "O simples anúncio do arcabouço é positivo, mas o mercado ainda não alterou as expectativas em relação ao resultado primário do governo. A minha impressão é que os economistas vão esperar a tramitação e avaliar com o tempo se esse arcabouço vai funcionar ou não. Portanto, o mercado financeiro tende a não dar muita bola. E isso faz com que o Banco Central não altere a sua estratégia simplesmente pelo anúncio na nova regra fiscal", frisa. Padovani manteve para agosto a previsão do início do ciclo de corte da Selic na próxima decisão do Copom. "Não haverá surpresa na decisão da taxa, nem na comunicação" adiciona.

Debate

Na semana passada, o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, foi duas vezes ao Senado para dar explicações sobre os juros. Na terça-feira, participou de audiência da Comissão de Assuntos Econômicos (CAE), e, na quinta-feira, confrontou o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e a ministra do Planejamento, Simone Tebet, e os dois outros integrantes do CMN. Nos dois debates, Campos Neto reforçou os aspectos técnicos para que a Selic continue no patamar atual e não deu pistas de quando os juros começarão a cair. No entender de Julio Hegedus, economista-chefe da Mirae Asset, pelas declarações dadas ao Senado, Campos Neto reforçou sua posição e, provavelmente, a Selic só deverá cair "na transição entre o terceiro e o quarto trimestre". "Vamos ficar observando os dados, a inflação, e o trâmite do arcabouço no Congresso. Eu estava, antes do dado do IPCA 15, sinalizando queda no último trimestre, mas devo revisar se o IPCA cheio reforçar esta desaceleração. Sigo, no entanto, na expectativa do arcabouço", afirmou ele, demonstrando desconfiança em relação às expectativas do governo de aumentar a arrecadação para cumprir a nova regra fiscal.

Caio Megale, da XP, também demonstra preocupação em relação ao sucesso da nova regra fiscal proposta pela equipe de Haddad. "O fato de agora ter o arcabouço ajuda, porque é possível fazer contas sobre a expansão do gasto e o tamanho da dívida. Mas os parâmetros sugerem crescimento dos gastos. Não é um arcabouço que contrai o fiscal para abrir espaço para a queda de juros", frisa. Megale acredita que os juros, quando começarem a cair, será de forma gradual, tanto que, pelas previsões da XP, a Selic encerrará 2024 com dois dígitos, o que pode impedir expansão acima de 1,5% na economia nesses dois anos. "Este ano é o ano do freio de arrumação para colocar as coisas no lugar. Por isso, é importante que o governo evite uma derrapada, tanto no fiscal quanto no parafiscal, para dar algum estímulo para a política monetária", acrescenta.

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