Controle da inflação

Banco Central eleva a Selic a 15% e setores produtivos reagem

Brasil segue em segundo lugar entre os maiores juros do mundo. A decisão, para federações empresariais, impede o crescimento

No comunicado da quarta reunião do ano do Copom, o BC sinalizou que pode interromper o ciclo de aperto monetário -
No comunicado da quarta reunião do ano do Copom, o BC sinalizou que pode interromper o ciclo de aperto monetário -

O Banco Central voltou a elevar os juros nesta quarta-feira (18), e reforçou a preocupação com o aumento das incertezas nos mercados externo e interno. O Comitê de Política Monetária (Copom) da instituição decidiu subir a taxa básica da economia (Selic) pela 7ª vez consecutiva, para 15% ao ano, renovando o maior patamar em quase 20 anos. A decisão foi unânime e veio em linha com a curva de juros futuros do mercado, que apontava, ontem, a Selic em 15% ao ano.

No comunicado da quarta reunião do ano do Copom, o BC sinalizou que pode interromper o ciclo de aperto monetário, iniciado em setembro de 2024, daqui a 45 dias, na reunião do Comitê de julho. A nova taxa mantém o Brasil na vice-liderança do ranking de juros reais (descontada a inflação) elaborado pela MoneYou e a Led Intelligence, atrás apenas da Turquia.

O colegiado alertou, na nota, que será necessário que os juros continuem em um patamar elevado por um período "bastante prolongado", pois a projeção para a inflação oficial situa-se acima da meta, de 3%, "no atual horizonte relevante da política monetária".  "Em se confirmando o cenário esperado, o Comitê antecipa uma interrupção no ciclo de alta de juros para examinar os impactos acumulados do ajuste já realizado, ainda por serem observados, e então avaliar se o nível corrente da taxa de juros, considerando a sua manutenção por período bastante prolongado, é suficiente para assegurar a convergência da inflação à meta", destacou.

O Copom reforçou a preocupação com a piora das contas públicas e avisou que "segue acompanhando com atenção como os desenvolvimentos da política fiscal impactam a política monetária e os ativos financeiros" e ressaltou que "o cenário segue sendo marcado por expectativas desancoradas e inflação elevada".

Pelas novas projeções do Banco Central, a inflação oficial medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) deve encerrar 2025 em 4,9%, abaixo da mediana das previsões do mercado, de 5,32%, mas acima da estimativa da reunião do Copom de maio, de 4,8%, ambas acima do teto da meta, que é 4,5%. Confirmada qualquer dessas estimativas, o BC vai descumprir a meta pela 9ª vez consecutiva desde o início do regime de metas.  E, para 2026, o atual horizonte relevante da política monetária, a perspectiva do BC para o IPCA foi mantida em 3,6% – abaixo da mediana das estimativas do mercado, de 4,50%, no limite superior da meta.

Divisão

O mercado estava dividido sobre a decisão do Copom, com metade apostando na manutenção e, a outra, em mais um aumento na taxa Selic, mas havia um consenso de que os juros devem seguir elevados por um período mais prolongado, como sinalizou a nota do BC.

Na avaliação de Roberto Padovani, economista-chefe do Banco BV, a decisão do Copom mostrou "um BC mais comprometido com a convergência da inflação". Ele destacou que o comunicado mostrou que o BC considerou na decisão uma maior preocupação com a convergência da inflação para o centro da meta, porque o balanço de riscos segue desfavorável.

"Existe muita preocupação com o nível do câmbio, com a inflação corrente, principalmente, a parte de serviços e com as expectativas de inflação.  Isso justifica uma postura cautelosa na condução da política monetária", afirmou Padovani. Ele apostava na manutenção da taxa Selic e já elevou para 15% anuais a previsão para os juros básicos no fim deste ano.

Apesar de ter acertado o resultado da reunião do Copom, Sergio Vale, economista–chefe da MB Associados, não comemorou mas elogiou a decisão do Banco Central. "Esse é o tipo de coisa que a gente queria errar, porque piorar juros, piorar a inflação, é tudo o que a gente não quer para o país. O BC foi no caminho correto. Tinha que aumentar os juros", afirmou.

Contudo, Vale reconheceu que ainda vai ser difícil para a autoridade monetária conseguir fazer a inflação convergir para o centro da meta, de 3%, e, por conta disso, elevou para 15% a previsão para a Selic no fim deste ano e espera os juros básicos entre 13,5% e 14% ao ano, no fim de 2026.

O economista da MB destacou que, para a inflação convergir para o centro da meta, seria preciso uma taxa de juros acima de 15%. "Obviamente, isso não vai acontecer e vamos ver o IPCA, durante o período eleitoral de 2026, ficando em 4,5%. O Banco Central vai ter que trabalhar, de fato, com um período longo de taxa elevada para conseguir trazer essa inflação para baixo. Mas trazer essa inflação para baixo, cada vez, mais me parece essa inflação de 4,5%", afirmou.

Piora fiscal

Economistas fizeram alerta sobre a piora do quadro fiscal devido à recente crise entre Legislativo e Executivo por conta da confusão do aumento do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF). O estrategista da RB Investimentos, Gustavo Cruz, destacou que o desempenho da curva de juros futuros será o termômetro da reação do mercado daqui para frente e ele não demonstrou confiança de que ela poderá cair mesmo com o BC aumentando os juros.

"Agora, a gente não vê uma queda relevante nos juros no futuro. Ou seja, existe uma desconfiança tão grande em relação à parte fiscal, que mesmo com o choque extremo de juros no curto prazo, não se lê um efeito tão grande assim na inflação para os próximos anos, Existe uma leitura de conveniência com o fiscal desarrumado que necessitaria de juros altos, mesmo no longo prazo", explicou.

Eduardo Velho, economista-chefe da Equador Investimentos, também reconheceu que a alta dos juros era inevitável, especialmente devido à piora do quadro fiscal. "Os impulsos fiscais têm ganho, recentemente preponderância, nas decisões do governo, que tenta compensar com aumento da arrecadação, mas que tem sido frustrada ou mesmo adiada pelo Congresso", afirmou.

Velho destacou que o grau de persistência inflacionária mantém o IPCA rodando na casa de 4,6%, acima do teto da meta para 2026, e, na avaliação dele, o dólar não deve se manter nessa dinâmica mais favorável para a inflação. "Avaliamos que, no mínimo, a taxa Selic permanecerá em 15% ao ano, pelo menos, até o fim deste ano, mas devemos ressaltar que o Banco Central ressaltou que não hesitaria em continuar o ajuste restritivo. Por isso, a curva curta dos juros do DI deve seguir em alta na sexta-feira", afirmou. 

Setor produtivo

Enquanto o presidente Luiz Inácio Lula da Silva evitou fazer críticas ao BC pelo novo aumento da taxa Selic, entidades do setor produtivo fizeram um alerta sobre o impacto negativo dos juros básicos de 15% ao ano sobre a produção industrial.

A Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan) considerou "inadmissível" a decisão do Copom e afirmou que cada aumento dos juros "é um golpe adicional na capacidade de produção e de o país crescer de forma sustentável".  Segundo a entidade, a falta de confiança do setor "é alarmante", pois o Índice de Confiança do Empresário Industrial fechou o primeiro semestre de 2025 no campo pessimista," sinalizando um risco claro para os investimentos no Brasil". A Firjan também reconheceu que o governo precisará resolver os problemas fiscais, para conter o retorno do aumento do risco-país. "Sem flexibilidade fiscal, o Estado continuará limitado a administrar emergências e impossibilitado de projetar soluções estruturantes para o futuro. Persistir nessa trajetória significa comprometer a estabilidade do Brasil, manter o risco-país elevado e dificultar a redução sólida da taxa de juros. É fundamental que o país adote medidas que priorizem o crescimento sustentável e a confiança no futuro", completou.

A Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg) também criticou a decisão do Copom e a condução da política monetária, apesar dos sinais recentes de desaceleração da atividade econômica e do IPCA. Embora reconheça a importância do controle da inflação para a estabilidade econômica, a entidade fez um alerta de que "essa medida pode restringir ainda mais os investimentos produtivos, além de ampliar os custos de produção, reduzir a competitividade da indústria brasileira, e levar a impactos negativos sobre a geração de empregos e a renda das famílias".

A Confederação Nacional das Indústrias (CNI) também não poupou críticas à decisão do Copom e classificou de "injustificada" e ainda fez um alerta de que a medida "vai agravar as condições de competitividade do setor produtivo".  "Não lidávamos com um patamar tão alto desde 2006. A irracionalidade dos juros e da carga tributária já está sufocando a capacidade dos setores produtivos, que já lidam com um cenário conturbado e possibilidade de aumento de juros e custo de captação de crédito. É um contrassenso o Banco Central se manifestar contra o aumento do IOF enquanto decide aumentar a taxa de juros. Aonde se quer chegar?", questionou Ricardo Alban, presidente da CNI, em nota da entidade.

copom economia
copom economia (foto: editoria de arte)

postado em 19/06/2025 04:27 / atualizado em 19/06/2025 08:23
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