Comércio exterior

Setores já sentem efeitos de taxação prometida por Donald Trump

Na aquicultura, pelo menos 58 contêineres de pescado que seriam vendidos nos EUA tiveram que voltar para o Brasil

Apipesca pede ao governo brasileiro para que, pelo menos, consiga estender o prazo da implementação das tarifas para até 90 dias -  (crédito: Acervo Abipesca)
Apipesca pede ao governo brasileiro para que, pelo menos, consiga estender o prazo da implementação das tarifas para até 90 dias - (crédito: Acervo Abipesca)

O setor produtivo corre contra o tempo antes de 1º de agosto, quando o governo dos Estados Unidos prometeu iniciar a taxação de 50% sobre todos os produtos brasileiros importados pelo país. Nesse contexto, alguns setores serão mais afetados e já começam a sentir os efeitos do anúncio feito nesta semana por Donald Trump, em carta enviada ao presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva.

Um dos setores mais afetados é o da aquicultura e da pesca. Cerca de 70% das exportações brasileiras deste segmento são direcionadas aos Estados Unidos todos os anos, o que revela o tamanho da dependência ao mercado norte-americano. Até ontem, pelo menos 58 contêineres de pescados que seriam vendidos nos EUA tiveram que voltar para o Brasil, visto que empresas norte-americanas cancelaram contratos com indústrias brasileiras, devido ao aumento tarifário.

O levantamento foi realizado pela Associação Brasileira das Indústrias de Pescado (Abipesca). A diretora de Processamento e Comercialização da entidade, Aniella Banat, explica que, em média, um navio com esse tipo de produto leva 25 dias para sair do Brasil e chegar aos EUA. Com a proximidade da incidência das alíquotas, ela conta que o setor busca entender qual seria a data de cobrança da nova tarifa — se no próprio dia 1º, ou se seria no momento da chegada — além da preocupação com a competitividade do produto no mercado externo.

"Nem mesmo os importadores americanos têm uma informação completa sobre quando seria o começo dessa tarifa. Então vários pedidos foram cancelados. Até agora, foram 58 contêineres que retornaram diante desse cancelamento e tudo isso está em um ambiente de incerteza. A gente não tem uma rota de escoamento", disse a diretora.

Com mercado fechado para a União Europeia desde 2018, a entidade avalia que há poucos caminhos para contornar a crise em um primeiro momento. Mas pede ao governo brasileiro para que, pelo menos, consiga estender o prazo da implementação das tarifas para até 90 dias, com o objetivo de estabelecer novas negociações, tanto com os EUA como com outros países.

"Esses produtos ficarão nos estoques de armazenagem das empresas até que se busque um mercado alternativo. A construção de uma nova demanda não acontece da noite para o dia. A nossa preocupação está em como nós vamos direcionar a essas exportações que iriam para os EUA", acrescenta Banat.

Além do pescado, o café também deve ser muito prejudicado com o aumento tarifário. Os EUA são os maiores consumidores do café brasileiro, além de ser o país que mais consome o produto no mundo. Diante dessa situação, o setor manifesta preocupação com o aumento da concorrência de outros países, como Vietnã e Nicarágua, que antes tinham tarifas maiores que a do Brasil e passam a ter alíquotas mais baixas.

O diretor-geral do Conselho dos Exportadores de Café do Brasil (Cecafé), Marcos Matos, avalia que o país precisa tratar o assunto de forma mais pragmática e que gere benefícios no fluxo do comércio, comparando com casos recentes, como o acordo que está sendo feito com México e Canadá, além da negociação com o Vietnã, que resultou em uma tarifa menor para o país asiático.

"E o trabalho que a National Coffee Association (entidade americana) nos bastidores, com o governo de Washington, demonstrando os efeitos positivos, buscando esse entendimento, está sendo liderado pelo Cecafé no Brasil, com empresas norte-americanas, com associações, e nós vamos também ajudar o governo brasileiro a criar negociações e uma agenda positiva para evitar esses impactos", destaca.

Se for confirmada, a tarifa de 50% também deve afetar significativamente a indústria da mineração nacional. Em 2024, os EUA responderam por 4% das compras de minérios do Brasil e são, atualmente, o 12º maior importador de minérios do país em toneladas, com destaque para ouro; rochas ornamentais; ferro (0,7%); caulim (18,3%); e nióbio (7,1%).

O Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram), que representa o setor no país, informou que tem mantido consulta junto às mineradoras associadas para avaliar os possíveis impactos. "A conclusão é que essa imposição unilateral, sem embasamento técnico ou econômico convincente, fere o ambiente de negociação que tem se perpetuado no comércio internacional de minérios, razão pela qual este Ibram apresenta publicamente seu repúdio à atitude do governo norte-americano, e espera que tal anúncio não se concretize", frisou.

Para o presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Ricardo Alban, a serenidade deve prevalecer neste momento. Ele reforça o discurso do governo federal de que não haveria fato econômico que justificasse a tarifa aplicada e relembrou que a balança comercial com os Estados Unidos tem sido deficitária ao longo dos últimos anos, inclusive no primeiro semestre de 2025, quando o deficit alcançou US$ 1.7 bilhão de dólares.

"Para o setor produtivo brasileiro, o mais importante nesse momento é intensificar as negociações e o diálogo para reverter essa decisão o mais rápido possível, que o equilíbrio, o diálogo técnico prevaleçam com a parcimônia e a determinação.

 

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postado em 12/07/2025 03:53 / atualizado em 12/07/2025 07:35
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