
A nova alíquota de 50% sobre a importação de produtos brasileiros é a maior em vigor na onda do tarifaço do presidente Donald Trump, que, desde o início do segundo mandato, promoveu uma série de reviravoltas no "morde e assopra" das negociações em torno de tarifas de importação. Diante desta taxa substancial, determinados setores da economia brasileira devem ser mais seriamente afetados, levando em consideração que os EUA são atualmente o segundo maior parceiro do Brasil.
Com motivos políticos e econômicos, o republicano destacou, na carta enviada anteontem ao presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, que a alíquota de 50% é "muito inferior" ao que seria necessário para nivelar o comércio entre os dois países. Trump escreveu que há uma relação "injusta e muito desleal" para os Estados Unidos e que o relacionamento bilateral tem sido longe de ser recíproco.
Na verdade, os números desmentem o norte-americano. Desde 2009, o Brasil registra deficits comerciais consecutivos com os EUA, de acordo com dados da série histórica do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (Mdic). Isso significa que o comércio brasileiro importa mais produtos de lá do que o inverso, o que fez com que a maior economia do mundo tivesse um saldo positivo de US$ 90,28 bilhões nos últimos 16 anos.
Balança
Os EUA são o segundo maior parceiro comercial do Brasil, tanto em exportações, com 12% do total, quanto em importações, com 15%. Em 2024, o fluxo de comércio totalizou US$ 40,3 — o equivalente a 1,9% do PIB. Em um horizonte mais curto, nos primeiros seis meses deste ano, o Brasil registrou deficit de US$ 1,67 bilhão nas relações comerciais com os EUA. Nesse período, as exportações acumularam US$ 20,02 bilhões, enquanto que as importações somaram US$ 21,69 bilhões. Nesse contexto, a participação das exportações brasileiras para o país norte americano apresentou um leve aumento na comparação com os 12 meses do ano passado, de 12% para 12,1%.
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"O impacto macro não é tão significativo, mas vemos um efeito micro e político relevante", avalia o estrategista-chefe e Head do Research da XP, Fernando Ferreira. Análise divulgada pela corretora destaca que "apesar da relevância, a maior parte das exportações brasileiras são commodities, que podem acabar sendo redirecionadas para outros mercados, reduzindo o impacto potencial. Em relação às importações, equipamentos de geração de energia lideram a lista, e a composição é menos concentrada do que a pauta exportadora". Em termos de ações, segundo a XP, a Embraer apresenta a maior exposição potencial, seguida por Suzano e Tupy. "Há diversos efeitos indiretos que merecem acompanhamento, como a resposta do Brasil ao anúncio, a possibilidade de escalada para uma crise geopolítica maior ou de um acordo/negociação comercial com os EUA, e os impactos sobre o câmbio, fluxos financeiros, investimento direto estrangeiro (IDE) e sobre as eleições brasileiras de 2026", comenta Ferreira.
Na conta por setores, o que mais pesa nessa balança são os produtos correspondentes à indústria de transformação, que representam quase 80% de todas as exportações para os Estados Unidos. Na liderança deste segmento, está o chamado aço bruto ou semiacabado, que responde por 9,7% do valor total obtido com as exportações. Em março deste ano, o setor já foi penalizado com uma tarifa de 25%, que subiu para 50% no mês passado.
Apesar de considerar que as alíquotas não devem ser cumulativas, o setor se preocupa com o andamento das negociações que, na visão do presidente do Instituto Aço Brasil, Marco Polo Lopes, caminhavam bem e devem ser prejudicadas. "A nossa crença é que, neste momento, a gente precisa de serenidade, de baixar a bola, a temperatura, e voltar dentro do que seja possível, ao campo negocial", disse o executivo, em entrevista ao canal CNN Brasil.
Na sequência ao aço, as aeronaves e seus equipamentos representaram 5,2% de todas as exportações no primeiro semestre. Neste segmento, a Embraer domina o mercado, com a fabricação de aviões que, inclusive, possuem peças fabricadas nos Estados Unidos, e são exportadas para o país norte-americano já montadas. A nova tarifa deve impactar significativamente as operações da empresa, que informou estar avaliando os possíveis prejuízos nessa situação. "Tais impactos serão abordados em nossa primeira conferência de resultados do segundo trimestre, no dia 5 de agosto", considerou a Embraer, em nota.
Além disso, outros produtos devem ser impactados dentro do setor da indústria de transformação, como variações de ferro, que respondeu por 4,3% das exportações desde janeiro, bem como óleos combustíveis de petróleo ou de minerais betuminosos (4,1%), carne bovina fresca, refrigerada ou congelada (4%), sucos de frutas ou de vegetais (3,7%) e celulose (3,6%).
No entanto, o maior produto brasileiro importado pelos EUA são os óleos brutos de petróleo ou de minerais betuminosos crus, que correspondem a 12% do total dessa estatística. Ainda no campo da indústria extrativa, o minério de ferro e seus concentrados responderam por 1,1%.
Posicionamento
Ontem, entidades que representam a indústria publicaram notas que pregam cautela e diálogo para o governo brasileiro nas negociações para reverter a nova tarifa. A Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) considera que, além da nova medida, outras ações já implementadas pelo governo norte-americano podem impactar negativamente o setor produtivo e a geração de emprego no Brasil.
Além disso, empresas e os consumidores dos EUA também devem sofrer com mudanças no fornecimento e aumento de preços internos, na visão da entidade. "Neste momento de crescente incerteza, a Fiesp apoia a opção adotada pelo governo brasileiro de priorizar o diálogo, com vistas à construção de alternativas negociadas para essa situação que prejudica ambos os países", manifestou, em nota.
Na avaliação da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg), que representa a unidade da federação com a maior produção de aço no país, com grande parte das exportações destinadas aos Estados Unidos, eventuais medidas de retaliação devem ser avaliadas com cautela, considerando possíveis prejuízos significativos à sociedade brasileira e ao setor produtivo em sua totalidade.
"Este é o momento de reavaliar posicionamentos, reconsiderar decisões e buscar soluções por meio do diálogo com esse parceiro estratégico", destacou a Fiemg, que ressaltou, ainda, que os EUA são o principal parceiro da indústria de transformação do estado.
No caso da agropecuária, o café brasileiro é, de longe, o principal alimento exportado aos Estados Unidos, e responde por mais de 5% de todas as vendas ao país. O diretor-geral do Conselho dos Exportadores de Café do Brasil (Cecafé), Marcos Matos, disse que o consumidor de café dos EUA é quem sairá mais prejudicado com a nova tarifa. O representante ainda destacou que acredita que o "bom senso prevaleça". Tudo que gera impactos ao consumo é ruim para o fluxo de comércio, ruim para a indústria e desenvolvimento dos países", afirmou.
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