
Causa de divisão entre ministros do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a exploração de petróleo na Margem Equatorial pode ter início já no ano que vem. Ontem, no início da tarde, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) emitiu uma licença à Petrobras que permite que a empresa comece a perfuração marítima do poço Morpho, localizado no bloco FZA-M-59, na Bacia da Foz do Amazonas. A região é considerada estratégica para a companhia, por ser uma das fronteiras mais promissoras para a extração do "ouro negro" no mundo.
A autorização foi concedida mais de dois anos após o indeferimento do mesmo pedido de exploração na área localizada a 500 km da Foz do Rio Amazonas e a 175 km da costa brasileira, no estado do Amapá. Na época, o órgão afirmou que havia problemas em relação à vulnerabilidade socioambiental na região e que o projeto apresentava "inconsistências preocupantes" para que a atividade fosse conduzida de maneira segura ao meio ambiente.
Desta vez, o Ibama explicou que, desde o indeferimento do requerimento feito em maio de 2023, a autarquia iniciou, junto com a Petrobras, uma "intensa discussão", que permitiu um aperfeiçoamento em relação ao projeto anterior, principalmente na estrutura de resposta à emergência. "As exigências adicionais para a estrutura de resposta foram fundamentais para a viabilização ambiental do empreendimento, considerando as características ambientais excepcionais da região da bacia da Foz do Amazonas", esclareceu, em nota, o Ibama.
O instituto destacou que houve um "rigoroso processo de licenciamento ambiental" deste então. Entre as medidas que integraram essas etapas, houve a elaboração de um estudo a respeito do impacto ambiental, além da realização de três audiências públicas, 65 reuniões técnicas nos estados do Pará e do Amapá e vistorias. Por fim, em agosto de 2025, houve uma Avaliação Pré-Operacional (APO) in loco, que envolveu mais de 400 pessoas, entre funcionários e colaboradores da petrolífera e a equipe técnica do órgão.
Perfuração
Em nota, a Petrobras informou que a sonda já se encontra no local designado para a perfuração e o processo deve começar imediatamente. Até o fim dessa etapa, não haverá produção de petróleo no local e a pesquisa deve tentar obter mais informações para confirmar se há petróleo e gás na área em escala econômica. A expectativa da companhia é encerrar a perfuração em até cinco meses.
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A presidente da Petrobras, Magda Chambriard, disse que a licença expedida pelo Ibama é uma "conquista da sociedade brasileira" e revela que há um compromisso das instituições nacionais em dialogar e viabilizar empreendimentos que estimulem o desenvolvimento do país. Ela destacou que o processo levou quase cinco anos até ser encerrado nesta segunda-feira e que a empresa buscou conversar com governos e órgãos ambientais municipais, estaduais e federais.
"Nesse processo, a companhia pôde comprovar a robustez de toda a estrutura de proteção ao meio ambiente que estará disponível durante a perfuração em águas profundas do Amapá. Vamos operar na Margem Equatorial com segurança, responsabilidade e qualidade técnica. Esperamos obter excelentes resultados nessa pesquisa e comprovar a existência de petróleo na porção brasileira dessa nova fronteira energética mundial", disse a executiva.
Já o ministro de Minas e Energia (MME), Alexandre Silveira, comemorou a licença para a exploração e afirmou que a região representa o "futuro da nossa soberania energética" e que o país não pode abrir mão de seu potencial. "O nosso petróleo é um dos mais sustentáveis do mundo, com uma das menores pegadas de carbono por barril produzido, assim como a nossa matriz energética altamente renovável, que é exemplo para o mundo", comemorou o ministro.
O ministro é um dos maiores defensores da exploração de petróleo na região entre os membros do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O assunto causou divisão no Planalto desde o início do mandato e uma saia justa do chefe do Executivo com a ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, que abriu divergências em relação ao assunto.
O presidente do Congresso Nacional, Davi Alcolumbre (União-AP), também recebeu com "entusiasmo" a abertura para a exploração de petróleo no seu estado de origem. Em nota, o parlamentar afirmou que a decisão marca um "passo histórico para o desenvolvimento do Brasil, em especial para o meu estado, o Amapá, e para toda a região Norte".
Impactos
De acordo com o MME, a exploração da Bacia da Foz do Amazonas deve gerar impactos relevantes para a economia na região. A estimativa total de investimentos com o empreendimento é de R$ 300 bilhões, com a perspectiva de arrecadação estatal de mais de R$ 1 trilhão nas próximas décadas. Além disso, a produção pode gerar mais de 300 mil empregos diretos e indiretos no país.
Para o presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Ricardo Alban, a decisão do Ibama é um indicativo de que é possível compatibilizar desenvolvimento econômico e preservação ambiental. "A concessão da licença reforça a importância de políticas que conciliem crescimento econômico, geração de empregos e responsabilidade ambiental. A produção de petróleo na Margem Equatorial é estratégica para a segurança energética do país e para o financiamento da transição para fontes mais limpas de energia", avalia.
Apesar disso, organizações da sociedade civil anunciaram que recorrerão à Justiça para contestar o licenciamento. Às vésperas do início da Conferência do Clima (COP30), que será realizada em Belém (PA), ambientalistas reagiram mal à decisão do Ibama e acreditam que o projeto contraria a ciência e o objetivo do evento realizado na região amazônica, de promover investimento em fontes de energia sustentável e reduzir as emissões de carbono.
Na avaliação da coordenadora de Políticas Públicas do Observatório do Clima e ex-presidente do Ibama, Suely Araújo, a licença é uma "dupla sabotagem" e afirmou que Lula acaba de "enterrar" suas pretensões de ser protagonista na pauta climática. "Por um lado, o governo brasileiro atua contra a humanidade, ao estimular mais expansão fóssil contrariando à ciência e apostando em mais aquecimento global. Por outro, atrapalha a própria COP30, cuja entrega mais importante precisa ser a implementação da determinação de eliminar gradualmente os combustíveis fósseis", considera.
Já o pesquisador e integrante do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), Paulo Artaxo, acredita que o Brasil tem a oportunidade de explorar seu enorme potencial de geração energética solar e eólica e se tornar uma potência mundial em energias sustentáveis. "Não devemos desperdiçar esta oportunidade. Abrir novas áreas de produção de petróleo vai auxiliar a agravar ainda mais as mudanças climáticas e certamente isso vai contra o interesse do povo brasileiro", defende.

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