TRIBUTÁRIO

Reforma do Imposto de Renda escancara desigualdade social

Estudo da Oxfam mostra que homens e pessoas brancas concentram o impacto do novo imposto mínimo, enquanto 141 mil brasileiros devem financiar o alívio fiscal de 12 milhões

A reforma do Imposto deRenda (IR) deve provocar mudanças importantes na distribuição de renda no país, mas também revela como as desigualdades de gênero e de raça seguem estruturando o sistema tributário brasileiro. Essa é a constatação do estudo Araiz da desigualdade está no topo — os impactos distributivos declasse, raça e gênero na nova Reforma Tributária da renda, lançado pela Oxfam Brasil, ontem, Dia da Consciência Negra.

O levantamento analisa os efeitos do PL 1.087/2025, que amplia a faixa de isenção do Imposto de Renda para trabalhadores que recebem até dois salários mínimos ou até R$ 5 mil mensais, enquanto aumenta a tributação aplicada às rendas mais altas.

Os dados mostram que o grupo que passará a ser alcançado pelo novo imposto mínimo sobre altas rendas permanece majoritariamente formado por homens (82,3%) e pessoas brancas (80%). Para a Oxfam, isso reforça um padrão histórico, em que aqueles que concentram a renda no topo da pirâmide são também os que, proporcionalmente, pagam menos impostos.

“Esses números mostram claramente quem se beneficia do atual sistema tributário regressivo. A taxação dos super-ricos não é apenas uma questão econômica,mas de justiça social e racial”, afirma a diretora-executiva da Oxfam Brasil, Viviana Santiago.

A pesquisa aponta também que a reforma pode aliviar o bolso decerca de 12 milhões de brasileiros, que devem ser beneficiados com isenção ou redução do IR. Esse grupo, no entanto, não é homogêneo, 59% dos beneficiados são homens e 41%, mulheres. 

No recorte racial, 58,7% são pessoas brancas e 41,3%, negras. Embora a desoneração seja relevante, a Oxfam considera que o ponto central da proposta seja o aumento da progressividade.

“Esses resultados mostram que os efeitos distributivos são tão ou mais significativos do que a desoneração. Por isso, a tributação dos super-ricos é a medida principal, é o ponto-chave na promoção de justiça tributária e redução de desigualdades, principalmente para as mulheres e para as populações negras”, ressalta a coordenadora de Justiça Social e Econômica da Oxfam Brasil, Carolina Gonçalves.

Alívio tributário

Segundo os cálculos apresentados, as mulheres devem registrar um ganho anual de R$ 890 milhões com a mudança, enquanto a população negra seria beneficiada em R$ 2,9 bilhões por ano. Esses valores representam o alívio tributário acumulado para esses grupos a partir das novas faixas de isenção.

Para viabilizar essas alterações,o governo propõe uma alíquota mínima de até 10% sobre cerca de 141 mil brasileiros, o equivalente a apenas 0,13% da população, que recebe mais de R$ 50 mil por mês ou R$ 600 mil por ano. Para a Oxfam, esse desenho evidencia o grau de concentração de renda no país, um grupo extremamente restrito possui renda suficiente para financiar o alívio tributário destinado a milhões.

O estudo também destaca uma distorção histórica da tabela do Imposto de Renda. Desde sua criação, em 1996, a tabela deixou de ser reajustada em 12 dos 26 anos em que está em vigor, o que gerou uma defasagem média de 154,67%, segundo cálculos do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese). Na prática, quem ganha menos acaba sendo empurrado para faixas de cobrança cada vez maiores, mesmo sem aumentoreal de renda. 

Para Carolina Gonçalves, os números reunidos mostram o tamanho do desafio. “Os impactos numéricos estimados pela implementação da medida dão pistas do tamanho da desigualdade no Brasil, já que 141 mil pessoas podem aliviar o bolso de outras 12 milhões”, enfatiza.

“Diante disso, para garantir o impacto redistributivopositivo e a redução das desigualdades de raça e de gênero, é precisotributar os mais ricos. Para que haja justiça tributária, é necessário oenfrentamento da concentração deriqueza no país”, acrescenta.

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