Foi preciso a Casa Branca cortar em US$ 1,75 trilhão (cerca de R$ 9,8 trilhões) o plano de gastos sociais e ambientais do governo Joe Biden para tentar contornar um racha no Partido Democrata e apostar na aprovação do Congresso. A reação inicial dos legisladores indica o risco de fracasso do pacote considerado histórico pelo chefe de Estado. A ala progressista do partido governista na Câmara dos Representantes avisou que não se curvaria à pressão popular para rapidamente apoiar um projeto de infraestrutura bipartidário ao qual o Senado deu sinal verde. No início da noite, os deputados avisaram que o voto sobre a infraestrutura ocorrerá antes de 3 de dezembro. Mais um sinal do mal-estar entre os democratas.
Biden se viu forçado a retirar do texto várias propostas importantes do plano de gastos, incluindo a licença familiar remunerada e a redução do preço de medicamentos, anunciou o jornal The New York Times. O presidente insiste que o novo plano é essencial para reerguer a economia norte-americana, depois do impacto da pandemia da covid-19. Ele chegou a adiar o embarque para a Europa, onde participará da cúpula do G20 e da COP26, a conferência da ONU sobre o clima, e visitou o Capitólio na expectativa de convencer os colegas do partido a se unirem em torno do pacote.
A proposta de Biden inclui um aporte de US$ 555 bilhões (ou R$ 3,1 trilhões) para o combate às mudanças climáticas, incluindo incentivos fiscais para fontes energéticas de baixa emissão de poluentes. A expectativa é reduzir as emissões de gases do efeito estufa durante uma década. No setor social, estão previstos investimentos de US$ 400 bilhões para fornecer educação pré-escolar universal para crianças de 3 e 4 anos; além da ampliação da cobertura de atendimento médico com apoio do governo por pelo menos quatro anos.
“Temos um marco econômico histórico. Ele criará milhões de empregos, fará a economia crescer, investirá na nossa nação e no nosso povo, transformará a crise climática em oportunidade e nos colocará no caminho não apenas para competir, mas para ganhar a competição econômica do século 21 contra a China e todos os demais países importantes do mundo”, anunciou Biden, em discurso à nação.
Presidente da Câmara, a democrata Nancy Pelosi elogiou a legislação apresentada por Biden, ao qualificá-la como “transformadora e motivo de comemoração”. “É notável porque é uma grande visão, uma visão maior da que temos tido em muito tempo, talvez remonte ao presidente Franklin Roosevelt (1933-1945) no New Deal, e em alguns aspectos a Lyndon Johnson (1963-1969), que também tinha uma grande agenda”, disse a deputada.
O ex-presidente Barack Obama disse que o plano de Biden é uma oportunidade para os EUA darem “um gigantesco salto”. “Sob esse pacote, famílias terão condições de custear creches, e milhões de crianças terão um começo mais forte, por meio da educação pré-escolar universal. Investimentos históricos em energia limpa criarão centenas de milhares de empregos e nos ajudarão a liderar novamente a luta contra as mudanças climáticas”, escreveu.
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Especialista do Corporação Nacional para Pesquisa Atmosférica (em Boulder, Colorado) e professor honorário da Universidade de Auckland, na Nova Zelândia, Kevin Trenberth explicou ao Correio que as mudanças climáticas estão relacionadas às atividades humanas, e isso é ponto tácito na ciência. “Fazer qualquer coisa sobre isso envolve política. Muitas pessoas e empresas têm interesses particulares em poluir a atmosfera. Querem usá-la como um depósito de lixo gratuito, e isso não é certo”, disse. “No entanto, eles têm grandes fundos, e o sistema norte-americano está repleto de corrupção e de suborno. Biden se esforça e tenta se chocar contra o sistema. Espero que ele tenha sucesso.”
Os principais pontos do pacote
Escola e creche
O acesso gratuito a uma estrutura escolar antes da entrada no ensino básico seria garantido para crianças com entre três e quatro anos, o que estende o acesso gratuito a mais de seis milhões de crianças. O programa é financiado por seis anos. O crédito fiscal atual para famílias com crianças será estendido em um ano e contemplará 35 milhões de famílias.
Energia verde
O plano inclui investimentos para enfrentar eventos climáticos extremos, como incêndios florestais, secas e furacões. Os créditos fiscais por uso de energia verde chegarão a US$ 320 bilhões para promover a produção, o transporte e o armazenamento de energia renovável, bem como veículos "limpos" para uso privado e profissional.
Cobertura de saúde
O plano propõe estender até 2025 os créditos fiscais para quem adotar qualquer uma das opções de cobertura de saúde incluídas no Obamacare, que desde 2010 atende milhões de americanos que não possuíam plano de saúde. Seu alcance será de cerca de três milhões de pessoas.
Moradia
Está previsto um investimento de US$ 150 bilhões para acesso à habitação, incluindo em zonas rurais, com a construção de mais de um milhão de casas, auxílio para o pagamento de aluguel e facilidades para a obtenção de um empréstimo hipotecário.
Financiamento
Está prevista uma alíquota mínima de 15% para grandes empresas, além de uma sobretaxa para bilionários e milionários, em um plano que prevê investimentos para o combate à sonegação fiscal, estimada em cerca de 160 bilhões de dólares anuais em perdas de receita para os cofres públicos.
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