
A três dias de uma cúpula entre os presidentes Donald Trump (Estados Unidos) e Vladimir Putin (Rússia), no Alasca, Volodymyr Zelensky negou, nesta terça-feira (12/8), qualquer possibilidade de retirar seus soldados do Donbass, no leste da Ucrânia, para pôr fim à guerra. "Para os russos, Donbass é o trampolim para uma futura nova ofensiva", advertiu o líder ucraniano, ao classificar o encontro de sexta-feira como uma "vitória pessoal para Putin". "Primeiro, ele se reunirá em território americano, o que considero sua vitória pessoal", disse à imprensa, ao acrescentar que o russo sairá de seu "isolamento" e que a manobra provavelmente levará ao atraso de novas sanções. Zelensky confirmou à imprensa que "grupos" de militares russos tiveram êxito em avançar cerca de 10km em alguns setores do front — o que despertou suspeitas e temores de uma vantagem de Moscou no campo de batalha.
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Apesar de ter declarado que espera um diálogo construtivo com o chefe do Kremlin, uma menção feita pelo titular da Casa Branca preocupou a União Europeia (UE). "Me incomodou um pouco Zelensky dizer: 'Bem, tenho que obter a aprovação constitucional'. Ou seja, ele conseguiu a aprovação para entrar em guerra e matar todo mundo, mas precisa de uma autorização para trocar território", declarou o republicano. "Porque haverá troca de território", assegurou Trump.
As condições impostas por Putin para encerrar o conflito, iniciado em 24 de fevereiro de 2022, são consideradas inaceitáveis por Zelensky: a cessão de quatro oblasts (regiões administrativos) parcialmente ocupados (Donetsk, Lugansk, Zaporizhzhia e Kherson), e da Crimeia, anexada em 2014; além da renúncia ao recebimento de armas vindas do Ocidente e à adesão à Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan). Nesta terça-feira, os chefes da diplomacia de Washington, Marco Rubio, e de Moscou, Serguei Lavrov, conversaram por telefone para acertar detalhes da reunião entre os dois presidentes.
Especialista em política comparada da Universidade de Kiev-Mohyla, Olexiy Haran admitiu ao Correio que a Ucrânia não está em uma posição de liberar os territórios ocupados pela Rússia. "Nós estamos visando um cessar-fogo. De fato, esses territórios permanecerão sob controle russo. Se o Ocidente nos fornecer os armamentos necessários e impuser sanções contundentes e reais contra Putin, então, teremos condições de liberar essas terras", avaliou. "Todos dias, os russos destroem qualquer coisa que veem pela frente nesses territórios conquistados. No entanto, Putin ficaria feliz se a Ucrânia reconhecesse a ocupação de parte de seu território como algo legítimo. Trump tem defendido concessões de ambos lados. Isso significa que a Rússia se retiraria de parte da Ucrânia, mas continuaria a controlar outras regiões. Por sua vez, Kiev teria de reconhecer essa ocupação na esfera jurídica, o que enviaria um péssimo sinal para o restante do mundo."
De acordo com o cientista político Taras Zahorodny, sócio-gerente do Grupo Nacional Anticrise (em Kiev), Putin exige a retirada das tropas de Zelensky de quatro regiões da Ucrânia e a renúncia do país à Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) como condições para um cessar-fogo. "Ele não recuará desta demanda. A ideia de 'por que você não se retira de Donbass?' é uma continuação dessa política. Tump, por sua vez, não tem influência sobre a Ucrânia para obrigá-la a retirar suas tropas de qualquer território. Zelensky também nunca dará tal ordem. Além disso, há um claro apoio da União Europeia para que um cessar-fogo ocorra ao longo da linha de separação", explicou ao Correio. "Por isso, não está claro o motivo pelo qual Trump deseja uma cessão territorial da Ucrânia. Isso coloca o americano em uma posição vulnerável, porque a Ucrânia jamais fará isso."
Zahorodny lembrou que Zelensky articulou claramente sua posição de que ninguém pretende deixar o Donbass. "Isso significaria, essencialmente, desistir de territórios que os russos não poderiam conquistar pela força. Também enfraqueceria a defesa da Ucrânia", disse o cientista político. Ele afirmou que, caso a Ucrânia nada receba em troca, em termos de concessão, Kiev entenderá que a única maneira de vencer a guerra será por meio de ataques e da transferência de combates para a Rússia. "Qual a lógica de Trump para começar a conversar com Putin? Não descarto que Trump queira ouvir diretamente de Putin se ele está disposto a fazer alguma concessão sem intermediários."
EU ACHO...
"Eu nada espero dessas negociações. Acredito que negociações sem a participação da Ucrânia não fazem sentido, porque nem Trump nem Putin têm influência sobre a Ucrânia. Essa conversa de sexta-feira provavelmente terminará em nada. Talvez, apenas talvez, Putin pressione por uma trégua aérea. Ou seja, ele está sofrendo muito porque seu país tem sofrido ataques crescentes à sua indústria petrolífera, química e ferroviária, vindos da Ucrânia."
Taras Zahorodny, sócio-gerente do Grupo Nacional Anticrise (em Kiev)
"O resultado da cúpula de sexta-feira poderá ser negativo para os EUA, impossibilitados de conter a agressão russa a um país independente e parceiro estratégico de Washington. Os russos querem que os ucranianos se retirem de territórios ucranianos que ainda não foram ocupados. Isso é algo maluco. A posição de Zelensky é compreensível. Para mim, a postura dos EUA mostra fraqueza de Trump, ao seguir a propaganda do Kremlin e as demandas da Rússia."
Olexiy Haran, especialista em política comparada da Universidade de Kiev-Mohyla
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