
O anúncio foi feito pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, em sua plataforma Truth Social, às 18h51 desta quarta-feira (8/10) pelo horário de Washington (1h51 desta quinta-feira, em Sharm El Skheikh, no Egito), um dia depois do segundo aniversário do massacre de 7 de outubro de 2023 e do início da guerra na Faixa de Gaza. "Estou muito orgulhoso em anunciar que Israel e Hamas assinaram a primeira fase de nosso plano de paz. Isso significa que todos os reféns serão libertados muito em breve, e Israel retirará suas tropas para uma linha pré-acordada, como os primeiros passos rumo a uma paz duradoura, eterna e forte", escreveu.
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"Todas as partes serão tratadas com justiça! Este é um grande dia para o mundo árabe e muçulmano, para Israel, para todas as nações vizinhas, e para os Estados Unidos. Agradecemos aos mediadores do Catar, do Egito e da Turquia, que trabalharam para fazer com que esse evento histórico e sem precedentes ocorresse. Abençoados sejam os pacificadores!", acrescentou. À noite, Trump disse esperar que todos os reféns estejam entregues até segunda-feira.
A agência France-Presse (AFP) divulgou que às 6h desta quinta-feira (pelo horário de Brasília) haverá uma assinatura formal da primeira etapa do plano. Jornalistas viram o momento em que Marco Rubio, secretário de Estado americano, entregou a Trump um bilhete no qual anunciava o acordo e cochichou no ouvido do republicano.
O primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, publicou na rede X: "Com a ajuda de Deus, traremos todos de volta". O premiê reunirá o gabinete hoje para autorizar o acordo. "Um grande dia para Israel. Amanhã (hoje), convocarei o governo para aprovar o acordo e trazer todos os queridos reféns para casa", disse, em nota. O líder israelense agradeceu aos "bravos soldados das IDF (Forças de Defesa de Israel) e a todas as forças de segurança. "É graças à coragem e ao sacrifício deles que chegamos a este dia", destacou.
Uma fonte do movimento islâmico palestino Hamas citada pela AFP disse que, na primeira etapa do acordo, 20 reféns serão libertados de uma só vez, em troca de 2 mil presos palestinos. A troca deve ocorrer nas 72 horas seguintes ao início da implementação do acordo. Dos 250 israelenses sequestrados no sul de Israel pelo Hamas, 48 ainda estão em Gaza. A guerra na Faixa de Gaza deixou pelo menos 67 mil mortos, segundo o Ministério da Saúde controlado pelo Hamas.
Em comunicado à imprensa, o Hamas informou que, "após negociações sérias e responsáveis (...) em Sharm El Sheikh, com o objetivo de alcançar o fim da guerra de extermínio contra o nosso povo palestino e a retirada da ocupação da Faixa de Gaza; o Movimento de Resistência Islâmica (Hamas) anuncia ter chegado a um acordo que prevê o fim da guerra em Gaza, a retirada das forças de ocupação, a entrada de ajuda humanitária e a troca de prisioneiros".
"Amém!"
Sobrevivente do massacre de 7 de outubro no kibbutz de Nir Oz, Dorin Rai levantou-se rapidamente na madrugada de hoje e olhou o celular. "Descobri que eles tinham firmado o acordo. Estou realmente, realmente feliz! Espero que isso seja real e que veremos todos os sequestrados aqui, conosco, em breve. Amém!", disse ao Correio a mulher que se escondeu no quarto seguro de sua casa com o marido, Bijay, e os três filhos, enquanto os combatentes do Hamas reviraravam sua casa e tentavam acesso ao aposento, naquela manhã de sábado. Hoje, ela e a família vivem em Kiryat Gat com toda a comunidade restante de Nir Oz — 57 moradores foram mortos e 76, sequestrados. "Quatro de nossos amigos ainda estão em Gaza, vivos, e cinco, mortos. Estou ansiosa em vê-los todos de volta, o mais rápido possível."
Dorin relatou que, no grupo de WhatsApp do kibbutz de Nir Oz, os moradores externaram a emoção com o anúncio de Trump. "A mãe de um dos reféns escreveu que estava muito feliz", disse. Morador de Tel Aviv, o estudante de psicologia Gil Dickman, 33, teve a tia Kinneret assassinada em 7 de outubro; Yarden, enteada dela, foi solta depois de 54 dias no cativeiro; Carmel Gat, filha de Kinneret, acabou executada em Gaza, 328 dias depois do massacre. Os três familiares foram levados do kibbutz de Be'eri. "Estamos super animados. Finalmente, está acontecendo! Trump merece 48 Prêmios Nobel", desabafou à reportagem, pelo WhatsApp, em alusão ao número de reféns.
No norte da Cidade de Gaza, o repórter fotográfico Ahmed Hassan Youssef Al-Saifi, 24, disse ao Correio que os moradores vivem um misto de felicidade e de alívio, além de tensão, ansiedade e medo. "Tivemos experiências com a ocupação israelense e suas violações de acordos. Nossa alegria é incompleta", desabafou o palestino.
Otimismo e cautela
Professora de relações internacionais da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), Cristina Soreanu Pecequilo admitiu ao Correio que, por um lado, é preciso ver essa primeira etapa do acordo com otimismo. "Depois de meses de negociações indiretas, de novo conseguiu-se chegar a um certo tipo de acordo que, pelo menos, resolverá alguns dos problemas de Netanyahu, que são as pressões internas para que os reféns fossem libertados", disse. "Fica em aberto a questão de qual é o compromisso de Israel em levar adiante as provisões do acordo. Nisso, está a devolução de prisioneiros palestinos, mas, principalmente, o fim dos bombardeios. Não está claro como será o recuo das tropas de Israel. O arranjo político posterior ainda é muito incerto."
Pecequilo avalia que, apesar de bom sob o ponto de vista humanitário (em relação à libertação dos reféns e presos), o plano é insuficiente no sentido de sinalizar o futuro da Autoridade Palestina. "Parece claro que Trump será o chefe do governo de transição. O acerto parece positivo a curto prazo, mas há a sombra de Israel não cumprir com o acordo."
EU ACHO...
"Ainda tenho medo, mas acredito na paz. Não estou certa como ela será, mas que venha com algum tipo de acordo. Estou na expectativa do retorno de todos os sequestrados e que o maior número possível de vidas seja salvo. Nesses dois anos, tenho trabalhado para reabilitar minha família, especialmente meu marido, que sofre de transtorno de estresse pós-traumático grave desde aquele dia terrível".
Dorin Ray, 44 anos, terapeuta de animais, sobrevivente do massacre de 7 de outubro de 2023 no kibbutz de Nir Oz
“Qualquer passo que possa aliviar o sofrimento de meu povo é positivo. Temos enfrentado dificuldades insuportáveis, vivemos uma verdadeira tragédia. Perdemos tudo: nossas casas, nosso senso de segurança e até mesmo nos perdemos de nós mesmos. É hora de encontramos um pouco de paz, mesmo que por um curto período. Mas a ocupação israelense não é digna de confiança. Ela violou acordos no passado.”
Ahmed Hassan Yossef Al-Saifi ,24 anos, repórter fotográfico,morador da Cidade de Gaza
DUAS PERGUNTAS PARA
IBRAHIM ALZEBEN, embaixador da Palestina em Brasília
De que forma o acordo pode atender aos anseios do povo palestino?
Vemos este acordo como um passo necessário e positivo para pôr fim ao sofrimento da população civil em Gaza. Desde o primeiro dia, desejávamos que a agressão cessasse e que o silêncio das armas permitisse o alívio da tragédia humanitária. Este entendimento representa uma oportunidade real para abrir caminho a um processo político sério, que conduza ao reconhecimento pleno do Estado da Palestina e à concretização das aspirações legítimas do nosso povo à liberdade, à segurança e à dignidade. Apelamos à comunidade internacional para preservar o impulso deste acordo histórico, transformando-o no ponto de partida para uma paz duradoura e para o estabelecimento do Estado da Palestina independente.
O senhor acredita em uma paz sustentável e real no Oriente Médio com esse acordo? Por que?
Acreditamos que este acordo possa ser o início de um caminho rumo a uma paz sustentável e real, desde que seja acompanhado de um compromisso genuíno da comunidade internacional em garantir justiça e igualdade para o povo palestino. A paz verdadeira não se constrói apenas com o cessar das armas, mas com o fim da ocupação, o respeito pelo direito internacional e o reconhecimento do Estado da Palestina com Jerusalém Oriental como sua capital. Todos os povos da região desejam um futuro seguro e próspero, depois de mais de sete décadas de guerras destrutivas, agressões e da negação dos direitos de todo um povo — o povo palestino. Se houver vontade política e responsabilidade coletiva, este acordo poderá transformar-se numa oportunidade histórica para uma coexistência pacífica e duradoura em toda a região. (RC)
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