CHICO SANT'ANNA - Jornalista
Criar uma Guarda Nacional, como propõe o ministro da Justiça, Flávio Dino, para cuidar da segurança de um quarteirão parece ser tão adequado quanto ir matar mosquitos com bala de canhão: superdimensionada e ineficaz. A iniciativa do Ministério da Justiça em propor a criação de uma nova força policial federal para proteger os prédios da União em Brasília é desmedida e demonstra a incapacidade de criar mecanismos eficazes de gestão que garantam a prestância da Polícia Militar do Distrito Federal em proteger as sedes do governo.
Mundialmente, a existência de guardas nacionais tem propósitos bem diferentes do que se cogita para Brasília. No México, um país federativo igualmente ao Brasil e cuja capital está inserida num Distrito Federal, a Guarda Nacional tem por missão principal o combate em todo o país do crime organizado, a segurança das rodovias e do metrô da Cidade do México. Seu perfil é de uma corporação de caráter militar. A segurança dos edifícios públicos dos Três Poderes do governo federal do México está a cargo da Secretaria de Seguridad Ciudadana, um órgão local.
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Nos Estados Unidos, cuja capital, Washington, está inserida no Distrito de Columbia, a Guarda Nacional — que na prática são duas: aérea e terrestre — são forças auxiliares ao Exército e à Força Aérea. O ex-presidente George W. Bush, quando da Guerra do Vietnã, preferiu se alistar na Guarda Nacional Aérea do Texas, segundo alguns analistas, para não ter o risco de ir para o front. Quem comanda a Guarda Nacional norte-americana é o Departamento (ministério) de Defesa. Elas atuam como reserva dessas duas forças e seu papel é atuar, uma vez acionada pelo governador estadual interessado — e não por livre arbítrio do governo federal — em situações de emergências domésticas ou desastres, como furacões, enchentes ou terremotos.
Na vizinha Argentina, o quadro é parecido. A Gendarmería Nacional Argentina tem natureza militar, com características de força intermediária, com duplo emprego (policial e militar) e suas missões principais são a proteção e controle da fronteira, de usinas nucleares, embaixadas argentinas no exterior e participa das missões de paz e segurança das Nações Unidas.
De maneira geral, o perfil internacional das guardas nacionais é de uma força que entra em ação de forma excepcional e temporariamente. Sua ação numa mesma tarefa nunca se faz de forma permanente, como defende agora o Ministério da Justiça. Ficou evidente que o problema de segurança vivenciado em 8 de janeiro não foi decorrente da falta de efetivos, nem de equipamentos, mas sim da falta de comando comprometido com a tarefa de defender a capital federal.
Federalizar esse comando e a tropa não é, necessariamente, a solução. Prova cabal foi o comportamento do Batalhão de Guarda Presidencial (BGP), tropa sob comando federal e com a missão exclusiva de proteger os espaços onde o presidente da República atua: Palácio do Alvorada, do Planalto, Granja do Torto. Se a federalização fosse a solução, o Planalto não teria sido invadido. O GDF, contudo, deve agir de maneira mais responsável nas ações de segurança que dizem respeito ao governo federal. O sucateamento do Batalhão Rio Branco é um bom — ou seria mau exemplo. Contingente responsável pela segurança das representações diplomáticas, hoje o Rio Branco perdeu até a sua sede no Lago Sul. Foi cedida para a 10ª Delegacia de Polícia.
De outro lado, considerando que quem paga a segurança pública do Distrito Federal é a União, não é de todo mal ter o governo federal atuando na seleção do mandatário da segurança. No passado, isso era informalmente feito pelos governadores do DF. Cristovam Buarque (então PT) pediu que Fernando Henrique Cardoso (PSDB) indicasse o secretário de Segurança. O mesmo fez Agnelo Queiroz (PT), com Dilma Rousseff (PT). Ibaneis Rocha (MDB) agiu na contramão e agora responde por isso. Essa informalidade, contudo, pode ser alvo de uma regulamentação semelhante à que acontece com a escolha do presidente do Banco de Brasília. Nenhum dirigente assume sem o aval do Banco Central. Seria salutar que a escolha do secretário de Segurança, dos comandantes da Polícia Militar e dos Bombeiros e do chefe da Polícia Civil passassem por uma pré-qualificação federal.
Transformar a atual Força Nacional em uma tropa permanente pode ser também uma solução interessante, principalmente por questões financeiras. Os integrantes dessa força são hoje requisitados temporariamente dos quadros das polícias militares e dos corpos de bombeiros estaduais. São remunerados à base de diária, que se somam aos soldos de origem. A Força Nacional transformada em Guarda Nacional pode significar economia para o contribuinte e ao mesmo tempo dotar o governo federal para ações mais nobres do que cuidar do quarteirão da Esplanada dos Ministérios.
Missões ostensivas, preventivas, repressivas de acionamento imediato como proteger os povos indígenas, áreas de reserva ambiental, combater a grilagem, rebeliões em presídios federais, entre outras. Entretanto, parte dessas ações são hoje competência da Polícia Federal (DPF). Como evitar o paralelismo ou até mesmo criar a Guarda Nacional como um braço da DPF é um debate em que toda sociedade deve ser convidada a falar. Oportunidade excelente também para unificar as polícias militares e civis nos estados, tema protelado desde o fim da ditadura militar.
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