ARTIGO

Brasil cresce, mas precisa destravar o futuro

Crescer 1,4% no trimestre não é alívio. É alerta de que seguimos presos a entraves que impedem o Brasil de dar saltos reais

TATIANA RIBEIRO, mestre em gestão e políticas públicas e diretora-executiva do Movimento Brasil Competitivo

A alta de 1,4% no PIB do Brasil no primeiro trimestre de 2025, acima da média da OCDE e até da China, é um sinal positivo, mas o cenário precisa ser lido com responsabilidade. O crescimento existiu, sim, mas não representa o fim da estagnação estrutural que ainda nos impede de avançar de forma sustentável. Se não enfrentarmos de forma concreta os entraves que impactam o país há décadas, seguiremos comemorando resultados pontuais enquanto desperdiçamos nosso verdadeiro potencial.

Já sabemos bem onde estão os gargalos que freiam nosso real potencial de crescimento. Falta decisão política e coordenação, isso sim. O Brasil tem ativos poderosos, como biodiversidade, matriz energética limpa, base industrial, ecossistema de inovação em expansão e uma agropecuária tecnológica que pode avançar para um modelo agroindustrial mais inovador e sustentável.

Mas esses diferenciais esbarram no chamado Custo Brasil — um conjunto de barreiras que impõem um peso estimado em R$ 1,7 trilhão por ano à economia brasileira. Essas ineficiências reduzem a produtividade, dificultam a geração de empregos formais, afastam investimentos e limitam a competitividade das nossas empresas no mercado global.

O impacto aparece na prática: crescimento mais lento do PIB, menos investimentos e menor geração de empregos. A economia até tenta acelerar, mas continua puxada para trás. Segundo o Observatório do Custo Brasil, seria possível reduzir em R$ 530 bilhões esse peso estrutural apenas com ações já mapeadas em áreas como infraestrutura, crédito, tributos, gás, energia e digitalização. O diagnóstico está feito. A questão agora é: o que ainda nos impede de tirar essas travas do caminho?

A verdade é que a falta de modernização da gestão pública, do ambiente de negócios e do sistema regulatório se transformou em risco sistêmico. O tempo que o Brasil leva para tirar uma obra do papel, contratar um serviço ou capacitar um jovem para o mercado de trabalho não condiz com a velocidade que a economia global exige. É a produtividade que impulsiona ciclos sustentáveis de crescimento. Sem ela, o fôlego se perde.

E os sinais de desaceleração aparecem no horizonte. Segundo o relatório mais recente da OCDE, o PIB brasileiro deve crescer 2,1% em 2025 e apenas 1,6% em 2026 — abaixo dos 3,4% projetados para 2024. O próprio relatório aponta que o investimento privado deve se tornar mais restritivo, com impacto direto no consumo interno. Soma-se a isso o cenário externo, pressionado pela incerteza global, pela retração na demanda por commodities e pelos reflexos indiretos do "tarifaço" dos EUA.

Além de tudo isso, um problema se repete em todos os setores: faltam profissionais qualificados. Em plena era da inteligência artificial (IA) e da transformação digital, o Brasil ainda falha no básico — educação técnica, letramento digital e preparação para o novo mundo do trabalho.

Por isso, é necessário olhar para a educação como política econômica estratégica. O ensino técnico e profissionalizante precisa ser resgatado como via legítima de mobilidade social, desenvolvimento e conexão real com as demandas do setor produtivo. 

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E mais do que uma regulação pontual para a IA, precisamos de uma estratégia abrangente que permita inovar com responsabilidade, garantindo segurança jurídica e proteção, mas sem sufocar a criatividade de startups, centros de pesquisa e pequenos negócios. Uma regulação que incentive a adoção ética da tecnologia e prepare nossa sociedade para um futuro digital competitivo e inclusivo — alinhando-se, assim, com a necessidade de qualificação profissional para um mercado em transformação.

Outro ponto crucial para acelerarmos é facilitar o acesso ao crédito. Enquanto países com ambientes financeiros mais eficientes conseguem impulsionar investimentos e inovação, o Brasil ainda convive com um dos spreads bancários mais altos do mundo. Isso encarece o capital, penaliza empresas e dificulta o crescimento de quem empreende. 

Sempre insisto, também, que não podemos subestimar nosso enorme potencial de liderar a transição energética global. Com uma matriz majoritariamente renovável, o Brasil tem condições únicas para atrair datacenters, hubs industriais e cadeias de produção que buscam sustentabilidade e previsibilidade energética. Mas esse protagonismo só se consolidará se houver estabilidade regulatória, previsibilidade jurídica e inteligência estratégica.

Crescer 1,4% no trimestre não é alívio — é alerta. Alerta de que, mesmo com potencial imenso, seguimos presos a entraves antigos que impedem o Brasil de dar saltos reais. Não há mais espaço para acomodação diante de um mundo que exige velocidade, estratégia e coragem.

Ou enfrentamos o Custo Brasil com a seriedade e a urgência que ele impõe, ou continuaremos celebrando migalhas de crescimento enquanto perdemos relevância global. O país não pode mais viver de projeções frustradas nem de promessas empurradas para depois.

O Brasil tem tudo para liderar. Mas isso exige escolha, foco e ação. Crescer mais — e melhor — é possível. Mas depende, antes de tudo, da nossa capacidade de agir como um país que quer, de fato, ocupar o lugar que merece no século 21.

 


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