
A preocupação com a aparência não é necessariamente nova. Desde o Homo sapiens, algumas características eram mais "atraentes" — ou, pelo menos, denotavam mais saúde. Ao longo do Império Romano, a beleza também possuía relevância social. Com o passar dos milênios, a forma como nos vemos foi mudando, mas essa preocupação sempre esteve presente. O problema é que, atualmente, de forma exponencial, essa atenção tem se transformado em obsessão — algo além do saudável. E cabe perguntar: qual é o limite? Onde vamos parar?
Durante um podcast que ouvia distraidamente a caminho do trabalho, a apresentadora citou algo que chamou minha atenção: agora existe o "breathing care" (ou "cuidado respiratório"). Na prática, uma das ações mais instintivas do ser humano — a respiração — pode ser "melhorada". Tudo bem, os argumentos até fazem algum sentido. Mas tudo em que consegui pensar foi o quanto seria mais trabalhoso tirar um tempo para respirar direito, sendo que já existem o "skin care", o "hair care", o "body care" e por aí vai. Tentando atingir o nirvana do self-care, as pessoas parecem perdidas em uma obsessão cada vez mais preocupante com a aparência.
Entre tantos problemas que enfrentei durante a pré-adolescência, minha aparência nunca foi uma preocupação latente. Lá no fundo, eu sabia que era muito magricela, com um aspecto de pele pálida e meio adoentada. Nunca entrei em uma dieta para ganhar peso, não fazia exercício com o objetivo de ganhar músculos, nem me preocupava em manter um bronzeado mais arrojado.
Com o passar dos anos, todavia, essas preocupações me alcançaram. Já no auge da juventude, sentia aquela triste sensação de "ser feio". Em retrospecto, percebo que o culpado teve nome e sobrenome: redes sociais. As infinitas fotos compartilhadas no Orkut e, depois, no Facebook colocavam a aparência como prioridade em qualquer relação.
Quando paro para pensar, vejo que ainda tive a sorte de conhecer uma vida sem redes sociais. Em 2025, as crianças já nascem dentro desse ambiente virtual — e, quando menos se percebe, um bebê está abrindo os dedos em formato de pinça tentando expandir objetos reais. Essa pressão estética vai surgir cada vez mais cedo.
A obsessão com a aparência não surgiu por acaso: é alimentada por padrões inalcançáveis, reforçada pelas redes sociais e explorada por uma indústria bilionária. No entanto, romper com esse ciclo exige mais do que desconstruir ideais estéticos. É preciso reconstruir nossa noção de valor pessoal e coletivo.
Uma possível solução passa pelo letramento estético: educar desde cedo para que as pessoas compreendam como padrões de beleza são construções culturais e econômicas, e não verdades absolutas. Isso inclui investir em educação midiática nas escolas, estimular o pensamento crítico e promover representações plurais e reais nos meios de comunicação.
Medir a existência apenas pelo espelho é se afastar daquilo que realmente nos torna humanos.
Opinião
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