Visão do Correio

Saúde mental tem que ser prioridade pública

Dados oficiais derrubam a ideia de que a saúde mental é "problema de rico" e reforçam a necessidade de envolver políticas intersetoriais

ilustracao revista setembro amarelo -  (crédito: kleber sales)
ilustracao revista setembro amarelo - (crédito: kleber sales)

Nos últimos anos, o tema saúde mental tem sido assíduo no front político. Mês passado, o Senado aprovou o Projeto de Lei 5.015/2023, que institucionaliza o Setembro Amarelo, uma campanha nacional permanente contra a automutilação e o suicídio, fixando datas oficiais de mobilização para a causa. O texto aguarda sanção presidencial.

Na quarta-feira, a Comissão de Direitos Humanos (CDH) aprovou o PL 1.773/2022, criando a Política Nacional de Combate ao Suicídio de Crianças e Adolescentes  — com ênfase em pós-venção (cuidados aos familiares de um suicida) —, que seguirá para a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Casa. Também avançou o PL 5.195/2020, que ajusta a política de prevenção com foco em pessoas com deficiência e grupos mais vulneráveis. 

São textos que deslocam o foco do Setembro Amarelo para o "ano inteiro", com ênfase em outras datas importantes para a temática, como o Janeiro Branco e o Dia Mundial da Saúde Mental, em 10 de outubro. Embora movimentos como esses sejam importantes, as estatísticas exigem medidas mais drásticas.

 A Organização Mundial da Saúde (OMS) contabilizou 727 mil mortes por suicídio em 2021. O autoextermínio é a terceira causa de óbito entre jovens de 15 a 29 anos, sendo que 73% dos casos se dão em países de baixa e média renda, como o Brasil. Dados da agência das Nações Unidas indicam que o país registra em média 32 casos por dia.

Os números derrubam a ideia de que a saúde mental é "problema de rico" e reforçam a necessidade de envolver políticas intersetoriais, como educação, trabalho e proteção social, e um envolvimento de diferentes instâncias de poder, para o enfrentamento do problema. O Executivo também tem feito sua contribuição.

Em 2024, o Ministério da Saúde regulamentou os Centros de Convivência — espaços comunitários de cuidado e inclusão — com previsão de abertura de 216 unidades e investimentos da ordem de mais de R$ 80 milhões; também seguiu habilitando novos Centros de Atenção Psicossocial (Caps), a espinha dorsal do conjunto de serviços de saúde mental que integra o SUS. 

Essas ações apontam na direção certa: tirar os doentes do isolamento e trazer a sociedade para a discussão. Mas essa expansão depende, ainda, de fatores como a garantia de equipes completas nos centros de convivência, intervenções efetivas e retaguarda hospitalar para atendimento a esses pacientes, combinada com a atenção primária capacitada para rastrear riscos e manejar sobretudo os transtornos com maior incidência, como depressão, ansiedade e dependência química. 

Por fim, vale lembrar a origem da própria campanha no Brasil — articulada pela Associação Brasileira de Psiquiatria e parceiros, com 10 de setembro como o Dia Mundial da Prevenção ao Suicídio. Reconhecer esse legado é importante, mas o amadurecimento das políticas exige que o "amarelo" ilumine o ano inteiro: do piso de financiamento da Rede de Atenção Psicossocial (Raps) à formação das equipes, da escola ao posto de saúde, da regulação de plataformas à restrição de meios letais. Só assim trocamos visibilidade por vidas preservadas. 

 

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Por Opinião
postado em 05/09/2025 06:00
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