Mozart Neves Ramos — tiitular da Cátedra Sérgio Henrique Ferreira do Instituto de Estudos Avançados da USP de Ribeirão Preto
Completando agora a sua 12ª edição, o Anuário Brasileiro da Educação Básica deve ser, na minha opinião, uma referência obrigatória para todos aqueles que estudam políticas públicas de educação em nosso país. Trata-se de uma iniciativa exitosa do Todos Pela Educação (TPE), da Fundação Santillana e da Editora Moderna, reunindo os principais dados educacionais do país de forma clara e acessível, e contribuindo, assim, com o monitoramento das políticas públicas e com o debate educacional qualificado.
A edição de 2025, seguindo as anteriores, está dividida em diversos capítulos relativos a: educação infantil, anos iniciais e finais do ensino fundamental, ensino médio, educação profissional e tecnológica, educação de jovens e adultos (EJA), professores e gestão escolar, gestão dos sistemas educacionais, financiamento da educação, equidade étnico-racial, educação inclusiva e infraestrutura. Além dos dados nacionais, são fornecidos recortes estaduais, assim como uma seção especial com panoramas de cada unidade da Federação.
Nesta edição, o Anuário reforça seu papel de instrumento estratégico para pensar os próximos passos da educação no país. A publicação traz um panorama robusto sobre o presente e o passado, mas com os olhos voltados para o que está por vir. Em um ano decisivo — com as discussões sobre o Sistema Nacional de Educação (" o SUS da Educação brasileira", como está sendo chamado), o novo Plano Nacional de Educação (PNE, 2024-2034) e a recente assinatura do decreto que institui a Política Nacional Integrada pela Primeira Infância (PNIPI) —, o documento produzido se coloca como uma ferramenta potente para orientar o planejamento, a gestão e o debate público sobre os caminhos que o Brasil quer e precisa trilhar, como diz, com propriedade, Gabriel Corrêa, diretor de políticas públicas do Todos Pela Educação.
O Anuário chama a atenção, em particular, para o atual quadro da alfabetização no Brasil, e o faz com toda a razão, já que se trata da pedra angular de todo o processo de desenvolvimento da aprendizagem de nossas crianças. Desde 2023, o país vem utilizando o Indicador Criança Alfabetizada (ICA), e nota-se que o país evoluiu muito discretamente de 2023 para 2024 — de 56% para 59,2%, respectivamente, ou seja, um crescimento de apenas 3,2%. Assim, para chegar aos 80% em 2030 — meta estipulada pelo Ministério da Educação -, muito precisará ser feito.
Creio que uma atenção maior aos cinco primeiros anos de vida de nossas crianças pode ser uma alavanca importante para acelerar esse processo de alfabetização. Ou seja, estou falando de uma educação infantil de qualidade, sem esquecer que essa etapa primeira é também estratégica para o sucesso da própria PNIPI. Nesse sentido, não tenho dúvidas de que a sociedade brasileira começou a despertar para o tema, mesmo que tardiamente, pois sabe-se, há muito, que a educação infantil é decisiva não só para o sucesso escolar da criança, mas também para seu desenvolvimento pessoal e social.
Os dados do Anuário podem contribuir muito para atestar a qualidade das metas educacionais para os próximos 10 anos relativas ao novo PNE. A cultura do uso de dados em educação avançou bastante em nosso país com o advento do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), estabelecendo metas de qualidade para o país, os estados e os municípios brasileiros, juntamente com as cinco metas da organização Todos Pela Educação. Apesar desse avanço, muito ainda precisa ser feito, especialmente na perspectiva de usar tais informações na tomada de decisão com base em evidências, deixando de vez a cultura do achismo.
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É bom lembrar que o uso de dados passa também a ser essencial no modelo de financiamento público da educação, com o novo Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb); muitos municípios não estão recebendo dinheiro do Valor Aluno Ano Resultado (VAAR) — uma parte da complementação financeira do Fundeb — porque não conseguem cumprir com alguns de seus fatores condicionantes, como, por exemplo, avançar no aprendizado adequado e na redução das desigualdades. Além disso, não estão recebendo o dinheiro do ICMS Educacional — um mecanismo de distribuição de recursos do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) que utiliza indicadores educacionais para destinar parte do imposto aos municípios, incentivando a melhora da aprendizagem e da equidade.
Muitos municípios não se prepararam para esse novo ambiente. Por isso, a própria Cátedra Sérgio Henrique Ferreira tem como uma de suas principais estratégias de atuação formar gestores públicos e técnicos educacionais para empregar dados em prol de uma educação pública de qualidade. E o Anuário é, assim, um grande aliado de governos, entidades da sociedade civil, imprensa e milhares de gestores de redes em todo o país.
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