Protesto contra Bolsonaro

"Não vão nos intimidar", diz manifestante preso por criticar Bolsonaro

Comerciante Emanuel Mendes da Silva é um dos cinco detidos pela PM, na Praça dos Três Poderes, portando uma faixa que chamava o presidente de 'genocida'

Jorge Vasconcellos
postado em 19/03/2021 14:20 / atualizado em 19/03/2021 15:13
 (crédito: Ed Alves/CB/D.A Press
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(crédito: Ed Alves/CB/D.A Press )

O comerciante Emanuel Mendes da Silva, de 19 anos, um dos cinco manifestantes detidos pela Polícia Militar durante protesto contra o presidente Jair Bolsonaro, na Praça dos Três Poderes, na quinta-feira (18/3), criticou, em entrevista ao Correio, o que classificou como "censura e cerceamento ao direito de livre manifestação".

Os manifestantes foram detidos quando protestavam contra o desempenho de Bolsonaro no enfrentamento da pandemia da covid-19, que já matou mais de 280 mil pessoas no país. Eles foram abordados quando estavam abrindo uma faixa que trazia uma suástica — símbolo do nazismo — e a frase 'Bolsonaro genocida'.

Após a detenção, Mendes e os demais integrantes do grupo passaram cinco horas na Superintendência da Polícia Federal de Brasília, para onde foram conduzidos, e prestaram depoimento. Na ocasião, o delegado encarregado do caso rejeitou a versão dos PMs de que o protesto violou a Lei de Segurança Nacional (LSN). Apenas um manifestante permaneceu preso, devido a um mandado de prisão vigente; os outros foram liberados.

"Nós não estávamos fazendo nada demais, apenas exercendo nosso direito de manifestação. A decisão do delegado federal de não nos indiciar confirma que a única intenção dos PMs era a de censurar um protesto contra o presidente da República", disse Mendes, acrescentando que "essa ação autoritária" não vai intimidar o grupo. "Hoje, mesmo, o pessoal já está organizando um outro protesto", revelou o comerciante. Ele foi detido junto com o ativista Rodrigo Pilha, criador do canal do YouTube Botando Pilha; Guilherme Martins Perez e outros duas pessoas, identificadas como Arthur e Vítor.

Emanuel Mendes contou que, no momento da abordagem, os policiais apreenderam a faixa e celulares. Segundo ele, a ideia inicial dos PMs era levá-los à 1ª Delegacia da Polícia Civil, na Asa Sul, em Brasília. Porém, durante o percurso houve uma mudança de planos, e o grupo foi levado para a Superintendência da PF. Após cinco horas de detenção, com exceção do manifestante que permaneceu preso, eles receberam de volta os telefones que haviam sido apreendidos pelos PMs.

Procurado pela reportagem, o assessor de comunicação da Polícia Militar do Distrito Federal, major Michello, informou que a detenção dos manifestantes foi uma iniciativa dos policiais, e não resultado de uma denúncia. Segundo ele, a ação teve o objetivo de "averiguar a situação do cartaz que eles estavam lá na manifestação". Também partiu do assessor a informação de que um manifestante permaneceu preso devido a um mandado de prisão. O major não quis dar mais detalhes sobre esse caso específico.

A deputada Natália Bonavides (PT-RN), que esteve na Superintendência da PF logo após a detenção dos manifestantes, classificou como "assustadora" a iniciativa dos policiais militares do DF de enquadrarem o grupo na Lei de Segurança Nacional.

Essa lei é de 1983, da época da ditadura militar, e prevê crimes contra a "ordem política e social". Um deles é "caluniar ou difamar o presidente da República, o do Senado Federal, o da Câmara dos Deputados ou o do Supremo Tribunal Federal (STF), imputando-lhes fato definido como crime ou fato ofensivo à reputação".

"É algo realmente assustador. Os policiais militares decidiram, simplesmente, acusar os manifestantes. Levaram, inclusive, direto para a Polícia Federal, eles mesmos decidindo o enquadramento na Lei de Segurança Nacional", disse a deputada à reportagem, alertando para a ocorrência de vários episódios semelhantes, no país, de repressão a manifestações contra o presidente da República.

"Esses episódios representam uma escalada autoritária estimulada pelo governo Bolsonaro. A Lei de Segurança Nacional foi usada para perseguir opositores na época da ditadura e agora nós estamos vendo isso acontecer com cada vez mais frequência", afirmou a parlamentar. Ela anunciou que o PT deve entrar com uma ação no STF pedindo a proibição da aplicação da Lei de Segurança Nacional para reprimir manifestações pacíficas contra o governo.

Alerta

O Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) divulgou, nesta sexta-feira, um alerta pedindo que a Polícia Militar do DF não prenda manifestantes pacíficos com base na LSN. A recomendação, assinada por Flávio Augusto Milhomem, da 3ª Promotoria de Justiça Militar, foi divulgada um dia após a detenção dos cinco manifestantes na Praça dos Três Poderes.

No documento encaminhado ao secretário de Segurança Pública do DF, Anderson Torres, e ao comandante-geral da PM do DF, Julian Rocha Pontes, o promotor pede que eles determinem “às forças de segurança pública que se abstenham de prender em flagrante manifestantes pacíficos sob o fundamento da violação à Lei de Segurança Nacional”.

Em outra repercussão, a Defensoria Pública da União (DPU) e um grupo de advogados acionaram o STF, em dois habeas corpus, pedindo que sejam encerrados inquéritos e ações penais instaurados com base na Lei de Segurança Nacional contra cidadãos que manifestam críticas à atuação do presidente da República no enfrentamento da pandemia. A DPU e os advogados também pretendem garantir um salvo conduto para evitar que declarações em relação ao chefe do governo gerem a abertura de investigações.

Na última segunda-feira (15), a Delegacia de Repressão aos Crimes de Informática do Rio intimou o youtuber e influenciador Felipe Neto a prestar esclarecimentos por suposto crime previsto na Lei de Segurança Nacional. Neto informou que a intimação chegou depois que ele, numa rede social, chamou Bolsonaro de "genocida". Na quinta-feira, uma liminar suspendeu as investigações contra o youtuber.

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