CPI da Covid

Pazuello mente ao falar de aplicativo que incentiva uso de cloroquina

Ex-ministro da Saúde disse que app foi apresentada como plataforma em desenvolvimento. Na época, entretanto, foi lançada com a presença do general, e o link de acesso à plataforma foi divulgado pela própria pasta

Sarah Teófilo
postado em 19/05/2021 17:04
 (crédito: Jefferson Rudy/Agência Senado)
(crédito: Jefferson Rudy/Agência Senado)

O ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello disse nesta quarta-feira (19/5) em depoimento na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da covid-19, no Senado, que o aplicativo “TrateCOV”, lançado em janeiro deste ano e que incentivava o uso de medicamentos sem eficácia comprovada contra a covid-19, não foi lançado. Segundo ele, tratava-se apenas de uma “calculadora” e era apenas um protótipo. “Não chegou a colocar em operação. A plataforma nunca entrou em operação. Foi apenas apresentada o protótipo em desenvolvimento e foi copiado por alguém”, afirmou.

Segundo ele, também, o aplicativo não foi distribuído para médicos e foi copiada por um cidadão. Depois disso, o general pediu para que o sistema fosse retirado do ar. “Fizemos um boletim de ocorrência e (tem) uma investigação sobre isso aí. Esse cidadão fez a divulgação da plataforma com usos indevidos. Quando ficamos sabendo que ela foi copiada e que poderia ser usada por pessoas que não estavam dentro do planejado, determinei que fosse retirada do ar”, disse. O general afirmou que o aplicativo (que, segundo ele, era uma plataforma) tinha como objetivo facilitar o diagnóstico clínico feito pelo médico.

Em janeiro deste ano, contudo, a plataforma foi lançada dias antes de o sistema de Saúde de Manaus entrar em colapso por falta de oxigênio nas unidades de saúde. Pazuello confirmou que a plataforma foi mostrada no dia 11, em Manaus. De fato, o aplicativo foi lançado em Manaus, e com a presença de Pazuello. Na ocasião, ele afirmou que a prescrição de uma medicação pode ser feita pelo médico antes dos resultados dos testes, somente com o diagnóstico clínico, já que exames laboratoriais ou de imagem são complementares.

"O diagnóstico é do médico, não é do exame, não é do teste, não aceitem isso (...). O exame laboratorial, o teste é complemento do diagnóstico médico, até porque a medicação pode e deve começar antes desses exames complementares. Caso o exame lá na frente, por alguma razão, dê negativo, ele reduz a medicação e está ótimo. Não vai matar ninguém, pelo contrário, salvará no caso da covid", indicou Pazuello à época.

A plataforma ajudava a diagnosticar a doença, após o médico cadastrar sintomas do paciente e comorbidades, como diabetes. O sistema estava aberto, entretanto, e qualquer pessoa poderia inserir os sintomas. Em seguida, a plataforma sugeria a prescrição de medicamentos como hidroxicloroquina, cloroquina, ivermectina, azitromicina e doxiciclina, o conhecido kit-covid.

Não há comprovação de que os referidos medicamentos que vêm sendo reforçados pelo governo federal no decorrer da pandemia (como ivermectina e cloroquina) tenham eficácia contra a covid-19. Na época, o ministério afirmava que as sugestões são de “opções terapêuticas disponíveis na literatura científica atualizada”, e que o objetivo era aprimorar e agilizar os diagnósticos da covid-19.

A pasta afirmava que era "um novo método científico na Atenção Primária à Saúde (APS)" para detectar a doença. "Por um aplicativo de celular — batizado de TrateCOV —, profissionais de saúde irão utilizar um protocolo clínico para fazer um diagnóstico rápido da doença através de um sistema de pontos que obedece rigorosos critérios médicos", relatou.

A plataforma solicitava informações sobre lugares frequentados pelo paciente ou contato com pessoas que tenham recebido diagnóstico positivo para covid-19. Ao final, era apresentada uma pontuação de gravidade. Se fossem seis pontos ou mais, era dado o diagnóstico da doença. Em seguida, surgia a opção de receber ou não tratamento precoce. Caso a resposta fosse afirmativa, apareciam os nomes dos medicamentos, junto com as doses e quantidade de dias a serem administrados. Caso a resposta fosse não, o médico precisaria indicar o motivo: recusa do paciente, falta de medicamento, contra indicação médica ou outros.

Pazuello afirmou que o sistema foi sugerido pela secretária de Gestão do Trabalho e da Educação em Saúde da pasta, Mayra Pinheiro, que prestará depoimento nesta quinta-feira (20) na CPI. Na época, Mayra avaliou que os sintomas e sinais da covid-19 são "muito bem definidos", o que permite a estratégia. "A adoção do protocolo é segura. Para muitas doenças em todo o mundo, a gente adota protocolo. Se o paciente preenche três critérios para a doença, ele tem a doença. Estamos apenas validando um protocolo científico, mostrando que ele é um forte indicador da doença, que ele pode ser usado para tomada de decisão", destacou em texto publicado no site do ministério.

Repercussão negativa

Além de texto publicado no site e a presença do ministro no lançamento da plataforma, houve reportagem veiculada pela TV Brasil, inclusive com falas do ex-ministro.

Depois que o aplicativo teve ampla repercussão negativa, o Ministério da Saúde o tirou do ar. Na ocasião, a pasta afirmou que o site funcionava apenas como simulador, foi invadido e ativado indevidamente, “o que provocou a retirada do ar, que será momentânea”.

Apesar de informar que o site foi invadido e ativado indevidamente, a plataforma “tratecovbrasil.saude.gov.br” foi divulgada pelo próprio ministério nas notícias do site oficial da pasta. Com isso, ainda que o ministério tenha informado que o aplicativo foi criado para auxiliar os profissionais de saúde a diagnosticar a doença, após o médico cadastrar dados, sintomas e comorbidades do paciente, qualquer pessoa tinha acesso ao site que simulava a plataforma e poderia fazer o próprio diagnóstico.

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