CPI da Covid

Dimas Covas responde governista na CPI sobre fala agressiva de Doria

Diretor do Butantan precisou falar sobre um áudio vazado em que João Doria reclama de contratação de vacinas e fala de "pegar chinês pelo pescoço". Base do governo tentava desmanchar tese de atraso na compra de vacina por parte do governo federal

Luiz Calcagno
postado em 27/05/2021 13:16 / atualizado em 27/05/2021 13:17
 (crédito: Edilson Rodrigues/Agência Senado)
(crédito: Edilson Rodrigues/Agência Senado)

Primeiro governista a fazer perguntas ao diretor do Instituto Butantan, Dimas Covas, que presta depoimento na Comissão Parlamentar de Inquérito da covid-19, nesta quinta-feira (27/5), o senador Marcos Rogério (DEM-RO) tentou reverter a tese da oposição de que o governo atrasou as negociações. O parlamentar apresentou um vídeo em que o governador de São Paulo, João Doria (PSDB), ao falar sobre vacinação, afirma que é para “pegar aquele chinês pelo pescoço”.

Apesar do peso da fala, Covas destacou que a preocupação de Doria, naquele momento, era trazer mais vacina e que a conversa era privada, diferentemente dos ataques do presidente da República à vacina. Os questionamentos do DEMista acabaram por reforçar o argumento da oposição.

“Estou me expondo toda semana. Gastando capital toda semana. Então, nós vamos pegar esse chinês pelo pescoço”, afirma João Doria, no áudio, para ter como contratar mais vacinas. “Liga pra esse chinês seu amigo, e diz que segunda-feira o governador vem aqui, às 10h30. É bom você ter uma resposta pra ele. Ele está falando com um cliente de R$ 2,5 bilhões. Só tem um cara que está se expondo aqui. Sou eu. Publicamente, sou eu. Eu estou no primeiro plano dessa história. Ainda sofrendo ataque de Bolsonaro”, reclama Doria à época. Dimas responde, na gravação, que terá a vacina até 15 de janeiro.

Em seguida, Doria afirma que garantir a vacina pode restituir e fortalecer sua imagem diante do presidente da República. “Essa imagem (da vacina), ela é de uma força de pressão política, institucional, da opinião pública, irresistível. Chegou a vacina? E agora, ministro (Eduardo) Pazuello? E agora, Bolsonaro? Sem isso, vai ser o contrário. E agora, João Doria, cadê a vacina?”, afirma o governador paulista em reunião de 2020. Com base no áudio, Marcos Rogério acusou o governador de estar preocupado com o próprio capital político, e não com a vacinação.

É verdade. Doria atrela a vacinação à própria imagem na fala. Mas, a preocupação é a contratação de mais doses. Marcos Rogério afirma, então, que o governador está falando de dinheiro do governo federal. Mas Dimas Covas o contradiz e destaca que o governador está falando de investimentos feitos pelo estado de São Paulo. “Somente no contrato 05 de 2021 estão envolvidos mais de R$ 2,6 bilhões do governo federal. É o governo federal que paga a conta desse processo que o governador João Doria claramente utilizou para fins meramente politiqueiros. Não vi falar em vidas, na preocupação humanitária”, atacou o governista.

O senador questiona quem é o chinês e se era lobista. “De forma alguma, ele se refere ao vice-presidente da Sinovac. Esse assunto não diz respeito especificamente a vacinas. Foi uma conversa vazada e o teor da conversa era outro”, afirmou Dimas Covas. Marcos Rogério interrompeu. “Ele (Doria) está falando de vacina”, destacou o senador. O presidente do Butantan disse que, “em um primeiro momento, não”. “Em um segundo momento ele fala de vacina, sim, porque o contrato com o ministério, esse que vossa excelência se refere, foi assinado dia 7. Portanto, nesse momento, não havia financiamento da vacina. Vamos receber a primeira partida de recursos do Ministério 30 dias depois”, disse.

“Não havia, nesse momento, participação de financiamento ou de aquisição de vacinas por parte do ministério. O que se tratava aqui, no segundo momento da conversa, será de volumes adicionais. Volumes adicionais aos 45 milhões que seriam tratados com a Sinovac. Queríamos progredir, passar para 60 milhões para o estado de São Paulo. E tinha uma cláusula contratual que impedia isso. A conversa tirada do contexto precisa ser bem explicada. E o governador estava indignado com essa falta de possibilidade de trazer mais vacinas”, explicou.

Nesse momento, o governista questionou se a fala de Doria não provocaria o mesmo efeito que as falas de Bolsonaro e do ex-ministro da Saúde, o general Eduardo Pazuello, contra a vacina e o governo chinês. “O senhor considera atitudes como essa (‘pegar o chinês pelo pescoço’) favoráveis ao relacionamento do Brasil com a China?”, questionou o parlamentar. Dimas Covas lembrou que a conversa foi privada, mas vazou. “De um relacionamento que envolvia aspectos empresariais não relacionados diretamente com o contrato do ministério ou das vacinas. A relação do Butantan e Sinovac é empresarial. Ele (Doria) estava olhando a possibilidade de ter vacinas adicionais para o estado de São Paulo”, respondeu.

Bate-boca

Nesse momento há um pequeno bate-boca entre Marcos Rogério e o presidente da CPI, senador Omar Aziz (PSD-AM), que afirma que Doria não estaria sendo grosseiro mas, sim, se mostrava indignado com a dificuldade de conseguir mais vacinas. “Diferentemente de outros que não querem”, provocou. O governista pediu que Aziz contivesse a “sanha”. Aziz faz uma ofensa ao senador fora do microfone e o Demista reage. “Vossa excelência, tenha compostura. O senhor está tratando com senadores”, devolveu.

De volta às perguntas, Marcos Rogério fez o lance final de perguntas, e disse que Dimas Covas teria acusado o governo chinês de atrasar propositalmente a exportação de insumos. O presidente do Butantan negou. “Vossa senhoria diz que não é o produtor que atrasa o IFA (Ingrediente Farmacêutico Ativo), que tem a vontade e a disposição, e que o atraso é em relação ao governo chinês. É a China que está boicotando?”, perguntou. “Eu não diria boicotando. As manifestações que não são tão favoráveis à China causam problema no fornecimento. Quem solicita melhor relacionamento com a China foi o próprio embaixador brasileiro. Isso parece ter surgido efeito e houve a liberação do IFA do Butantan e da Fiocruz, os dois morosamente tratados”, afirmou. “Isso é diferente do que acontece com outros país. A China fornece vacinas pelo mundo”, completou.

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