PODER

Aliados do governo temem integridade das instituições nas manifestações do dia 7

Recentes afirmações de Bolsonaro preocupam líderes aliados do presidente, que veem o andamento de pautas para o país emperrar pela falta de consenso

Denise Rothenburg
postado em 30/08/2021 06:05
 (crédito: RosineiCoutinho/SCO/STF)
(crédito: RosineiCoutinho/SCO/STF)

A afirmação do presidente Jair Bolsonaro, no último sábado, em Goiás, sobre o próprio futuro — ser preso, ser morto ou conquistar a vitória — foi lida pelos partidos como um salvo-conduto para os radicais que ameaçam invadir o Supremo Tribunal Federal e até o Congresso no Sete de Setembro. Até os líderes aliados estão preocupados. Em conversas reservadas no fim de semana, muitos se mostraram, inclusive, inclinados a pedir aos presidentes do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Supremo Tribunal Federal (STF), Luiz Fux, que acionem as Forças Armadas para a proteção dos prédios públicos no feriado da semana que vem. O governo do Distrito Federal já destacou 5 mil policiais militares para a segurança da Esplanada dos Ministérios. A preparação para o feriado da Independência sem desfile militar, e com atos por todo o país, promete tomar conta de mais uma semana tensa e travar parte da pauta do Congresso, uma vez que a energia será dedicada a tentar arrefecer os ânimos e evitar estragos para o pós-dia 7.

No STF, além de uma intensa atuação nos bastidores, os ministros vão se dedicar ao marco temporal para demarcação de terras indígenas, tema que mobilizou líderes nativos de todo o país e, também, os outros Poderes. O presidente Jair Bolsonaro, por exemplo, tem dito que se os demais ministros acompanharem a posição do ministro Edson Fachin, contrário ao desejo dos agropecuaristas de estabelecer a Constituição de 1988 como ponto de partida para as demarcações de reservas, será o fim do agronegócio. Até para reduzir a tensão na Esplanada dos Ministérios, a ideia é concluir a análise antes do feriado para que os índios deixem o centro de Brasília, dando lugar aos bolsonaristas, patrocinados por aliados do presidente.

O marco temporal promete ser o tema mais polêmico da semana. No Congresso, a expectativa é a de dias mais calmos, até para preparar o terreno para o dia seguinte ao Sete de Setembro. “Esta semana está tranquila. O pós é que vai depender dos desdobramentos das manifestações”, diz o líder do DEM na Câmara, Efraim Filho (PB). De mais polêmico, só mesmo o Código Eleitoral, que pretende estabelecer, a partir de 2024, uma quarentena para juízes, militares e bombeiros terem direito a disputar um mandato. A votação está prevista para quinta-feira.

Sem acordo

Já a polêmica reforma tributária só voltará ao plenário quando houver a acordo, e, embora Arthur Lira tenha dito que pretendia votá-la esta semana, ainda não há uma maioria assegurada. Além disso, a tensão política tem evitado que se crie o clima favorável para as discussões. A semana passada, que era para fechar um acordo, terminou sem atingir essa meta e os deputados não acreditam que seja possível votar a proposta de emenda constitucional agora, pois faltam os 308 votos necessários para a aprovação.

Os governadores têm dúvidas em relação à PEC e, esta semana, em vez de encontros para tratar especificamente desse assunto, se reunirão com os comandantes da Câmara e do Senado em nome da defesa da democracia. Isso significa, na avaliação de muitos, que as declarações de Bolsonaro escantearam as reformas.

Enquanto os políticos tentam dar uma “esfriada” na semana, a área econômica tenta explicar ao mercado que nem tudo está perdido. A negociação na Justiça — e não via Congresso — para resolver a crise dos precatórios será vendida como algo positivo. O governo trabalha, ainda, para obter um tom mais ameno do manifesto dos empresários e de parte do setor financeiro do país em defesa da democracia — documento que deve ser apresentado nas próximas horas. Por causa dele, atores do Executivo ameaçaram tirar a Caixa Econômica e o Banco do Brasil da Federação Brasileira de Bancos (Febraban) – (leia mais na página 5).

Em conversas no Congresso, os governistas tentam aliviar as manifestações. O líder do governo, deputado Victor Hugo (GO), tem feito questão de frisar que os atos do Dia da Independência são em defesa da liberdade de expressão e não uma ameaça aos Poderes. “Ninguém está descumprindo decisão judicial, mas pessoas têm que ter liberdade para questioná-las”, defende.

 

 

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Depoimento de motoboy é o mais aguardado

 (crédito: Jefferson Rudy/Agência Senado)
crédito: Jefferson Rudy/Agência Senado

A CPI da Covid realiza esta semana mais uma rodada de oitivas que servirão para confirmar dados já levantados pelos bastidores da comissão e esclarecer episódios com vistas ao aprofundamento das investigações. Um dos depoimentos mais esperados é o de Ivanildo Gonçalves, motoboy da VTCLog, empresa responsável pela logística de insumos no Ministério da Saúde, cujo depoimento está marcado para amanhã. Apesar de seus advogados terem entrado, na última sexta-feira, no Supremo Tribunal Federal (STF) com um pedido para que ele não compareça, os senadores têm grande expectativa de que ele possa esclarecer os motivos pelos quais sacou, na boca do caixa, quase R$ 5 milhões.

Outro depoimento aguardado é o de Marcelo Tolentino, apontado como sócio oculto da FIB Bank, empresa que expediu uma carta de fiança que cobriria 5% do negócio — ou seja R$ 80,7 milhões — do contrato da Precisa Medicamentos com o Ministério da Saúde na venda da vacina Covaxin. Apesar de Roberto Pereira Ramos Júnior ter afirmado, em depoimento na última quarta-feira, que Tolentino é apenas procurador da empresa Pico do Juazeiro, uma das acionistas do FIB Bank, a CPI quer entender por que o advogado se apresentava como representante da empresa. Da mesma forma, pretende entender as razões pelas quais o endereço da Rede Brasil de Televisão, emissora de Tolentino, e o número de telefone do seu escritório de advocacia em São Paulo são os mesmos que constam no CNPJ de empresas acionistas do FIB.

Também está previsto o depoimento de Francisco de Araújo Filho, ex-secretário de Saúde do Distrito Federal, preso em 2020 na operação Falso Negativo. O comparecimento dele foi adiado duas vezes: uma, porque estava em viagem a Manaus, autorizada por decisão judicial; e outra, porque a CPI preferiu ouvir José Ricardo Santana, ex-secretário da Anvisa — que participou do jantar no qual o ex-diretor de logística do Ministério da Saúde, Roberto Ferreira Dias, teria pedido US$ 1 por dose de propina para adiantar o fechamento do negócio da Covaxin com a pasta.

Araújo será ouvido devido a suspeitas de que teria ligação com a Precisa Medicamentos, que, com o nome Global, atuou junto à Secretaria de Saúde do DF para a venda de testes rápidos de detecção do novo coronavírus. Segundo o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT), o prejuízo aos cofres públicos por superfaturamento é estimado em R$ 18 milhões.

As três oitivas tem por objetivo mapear a atuação da Precisa Medicamentos no Ministério da Saúde e confirmar dados já cruzados pela CPI depois das quebras de sigilos telefônicos, telemáticos e bancários e de documentos recebidos de diversas fontes. Os requerimentos dos três são de autoria dos senadores Randolfe Rodrigues (Rede-AP) e Renan Calheiros (MDB-AL).

Semelhanças com o caseiro e o motorista

Nos bastidores da CPI da Covid, comenta-se que o motoboy Ivanildo Gonçalves pode ser tornar o novo Francenildo Santos Costa ou o novo motorista Eriberto França. O primeiro trouxe à tona, em 2006, o testemunho de que o então ministro da Fazenda, Antonio Palocci, usava uma mansão no Lago Sul para dar festas e se reunir com lobistas — e a partir daí, obter vantagens para os cardeais do PT e para o partido ao abrir portas no então governo Lula. Mesmo pressionado, manteve a versão quando foi ouvido na CPI do Bingos. O segundo mostrou que Paulo César Farias, ex-tesoureiro de campanha de Fernando Collor ao Palácio do Planalto, bancava despesas da família do então presidente da República, como a compra do famoso Fiat Elba e a reforma da Casa da Dinda, imóvel privado do ex-presidente em Brasília. A partir dessa descoberta, a situação do presidente ficou insustentável e acelerou seu processo de impeachment.

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