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Por ataques e virais, candidatos deixam propostas de lado nas redes sociais

Para entrar nas trends, campanhas digitais dos presidenciáveis usam conteúdos pessoais ou que passam ao largo de projetos

Tainá Andrade
Taísa Medeiros
postado em 06/06/2022 05:49 / atualizado em 06/06/2022 05:50
Foram analisados os 250 tuítes mais populares entre 1º de janeiro e 20 de maio. Desses, 121 (48%) continham investidas contra adversários -  (crédito:  Olivier DOULIERY / AFP)
Foram analisados os 250 tuítes mais populares entre 1º de janeiro e 20 de maio. Desses, 121 (48%) continham investidas contra adversários - (crédito: Olivier DOULIERY / AFP)

No Brasil, cerca de 150 milhões de pessoas acessam as redes sociais, segundo dados do relatório Digital 2021, parceria entre We Are Social e a Hootsuite. O país é o terceiro do mundo que mais utiliza as plataformas. Os objetivos são os mais variados: vão desde aprender o preparo de uma refeição a ler notícias e falar com amigos. Neste ano, há mais um motivo para se ligar às mídias: buscar informações para escolher os candidatos às eleições gerais de outubro. De olho nesses canais, postulantes aos cargos públicos, principalmente à Presidência da República, começam a colocar em prática estratégias de marketing político.

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PRI-0606-REDES_SOCIAIS.jpg (foto: Lucas Pacifico)

Propostas de governo, no entanto, não aparecem entre os assuntos mais comentados nas bolhas dos pré-candidatos ao Planalto.

A CEO da Vert.se Inteligência, Carol Zaine, ressaltou que se aproveitar dos assuntos em alta para emplacar bons números nas redes sociais pode esvaziar o debate. "É um risco que correm, infelizmente. Muitos estão apenas preocupados em ser lembrados pelas pessoas na hora de apertar o botão da urna e, para isso, são capazes de qualquer coisa", afirmou. "Isso não quer dizer que o candidato não possa entrar em uma tendência, em um desafio ou alguma brincadeira que está viralizando. Mas isso deve ser apenas uma das partes da estratégia e, ainda assim, bem analisada. Deve ser uma decisão tomada de olho nos dados. Em campanha, não dá para tomar decisões no escuro."

Procurada pelo Correio, a campanha do pré-candidato Ciro Gomes (PDT) confirmou a tese. "No momento de pré-campanha, o grande desafio para qualquer pré-candidato é o awareness: manter o seu nome vivo, presente nas mentes da população, ou, no caso aqui, dos usuários", respondeu a equipe.

Desde que Ciro anunciou a pré-candidatura, o grupo do pedetista tem feito um trabalho diretamente voltado para as redes, na intenção de manter o candidato no imaginário dos usuários.

"Claro que temos, também, nas nossas redes, conteúdos mais detalhados e profundos. Mas nós achamos que, apesar da ansiedade do mercado, da imprensa, e dos próprios atores políticos, os eleitores só vão refletir e definir seus votos mesmo durante a campanha eleitoral", ressaltou a equipe. "O desafio, até lá, é se manter sempre presente e sob uma ótica positiva, no imaginário da população." Os demais pré-candidatos foram procurados, mas não responderam aos questionamentos até o fechamento desta edição.

Outro levantamento, realizado pelo Radar Aos Fatos, apontou que um a cada dois tuítes publicados pelos cinco principais pré-candidatos ao Planalto foi endereçado a outros adversários políticos, especialmente seus concorrentes diretos. Ainda conforme o estudo, postagens que atacam opositores figuram com quase três milhões de interações nos perfis dos presidenciáveis mais bem colocados na mais recente pesquisa Datafolha — Luiz Inácio Lula da Silva (PT), Jair Bolsonaro (PL), Ciro Gomes, André Janones (Avante) e Simone Tebet (MDB).

Assuntos

Foram analisados os 250 tuítes mais populares entre 1º de janeiro e 20 de maio. Desses, 121 (48%) continham investidas contra adversários, 58 (23%) abordavam aspectos de pré-campanha ou propaganda e 24 (10%) citavam propostas, legados e ações. Mensagens que não abordavam nenhum desses temas (47 ao todo, ou 19%) foram classificadas como "outros". Ou seja, quase metade do conteúdo divulgado na rede social tinha apenas o intuito de intensificar a corrida eleitoral, em vez de fomentar o debate sobre as propostas.

Especialista em marketing político e consultor de equipes de marketing e comunicação parlamentar, Anderson Alves endossou os dados encontrados no levantamento ao destacar que, majoritariamente, a espinha dorsal das campanhas será pautada nas ideologias.

"Direita e esquerda, bem contra o mal são temas impulsionados por Lula e Bolsonaro. Estamos vendo, pelo lado dos bolsonaristas, muitos empresários, pastores, pessoas que não têm contexto político se organizando para defender o candidato. Uma esquerda mais engajada, que até possui projetos com as minorias; os movimentos negro e LGBTQIA , entre outros, se veem formando uma mega-aliança para bater de frente com o Bolsonaro", disse.

Alves aponta que, no meio digital, fica mais evidente a guerra de "um contra o outro". De um lado, Bolsonaro com grupos grandes de comunicação. De outro, Lula com maior quantidade de grupos. "A pesquisa do DataSenado, em 2019, mostrou que o Facebook foi a rede que teve maior impacto nas eleições (de 2018), com 31%, seguida do WhatsApp, com 29%. Muita gente acha que o Facebook está velho, que é coisa de tio, mas as classes B e E usam muito essa plataforma, é a rede número um de acesso eleitoral. Porém o tipo de engajamento e de assuntos que movimenta é meio bobo. É algo como: 'Quem vai votar em Lula vai onde?'. E aí se tem muitas curtidas. Todos os candidatos têm uma reputação digital muito forte, mas Bolsonaro é o mais poderoso que existe", exemplificou.

Aproximação

Carol Zaine explicou que as redes sociais têm o trunfo de aproximar o candidato do seu eleitor, com um discurso simples, direto e objetivo. Quase como a relação estabelecida entre influenciadores e seus públicos. Mas a CEO da Vert.se frisou que, em se tratando de política, apenas assumir a postura de influencer não é suficiente.

"Não basta o candidato influenciar, ele tem que, de fato, convencer. E esse convencimento vem de um trabalho bem estruturado de inteligência e comunicação. É preciso que os candidatos estejam de olho nos dados", disse.

Ela aponta premissas que precisam ser estabelecidas para que a performance seja aprimorada. A primeira delas é definir métricas realistas, ou seja, trabalhar por parâmetros numéricos que estejam, de fato, dentro do alcance. "Segundo, fazer mapeamento dos nichos em que precisa estar presente para a construção do diálogo; e, terceiro, ter mapeado quais são suas audiências para que possa se comunicar com todas elas."

Por sua vez, Anderson Alves comentou que a maioria dos candidatos pode se concentrar nas métricas que classifica como "vaidade", baseadas em curtidas e seguidores, mas ele enfatizou que isso não significa voto. "A estratégia mais certa é o funil do voto, que é como se dá a relação desde a atração passando pela conexão até a conversão. Dessa forma, a gente sabe realmente as pessoas que estão com você", argumentou. "Outro principal instrumento digital para essa eleição será o anúncio patrocinado. O recurso é uma das armas mais poderosas de alcance e é mais barato. Com ele, escolho o direcionamento do meu público, região, classe, mas o principal é o interesse."

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