Democracia

Cappelli lança livro sobre 8/1: "Não foi uma manifestação qualquer"

Ex-inverventor da Segurança Pública no DF relata período crítico da história recente, em que trama antidemocrática e ataque aos Poderes tentaram provocar uma ruptura institucional no país

Cappelli: PMs relataram que havia homens treinados entre os manifestantes -  (crédito:  Reproduçao de video)
Cappelli: PMs relataram que havia homens treinados entre os manifestantes - (crédito: Reproduçao de video)

Interventor na Segurança Pública do Distrito Federal por 22 dias após os ataques de 8 de janeiro de 2023, Ricardo Cappelli testemunhou de perto a crise política que se instalou com a destruição dos edifícios onde estão sediados os Poderes da República. Dois anos e meio após o episódio que provocou o afastamento temporário do governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha, e um processo no Supremo Tribunal Federal contra o ex-presidente Jair Bolsonaro e outros réus, Cappelli decidiu relatar sua perspectiva pessoal desse momento crítico da história brasileira recente.  

Em entrevista ao Podcast do Correio, o ex-secretário-executivo do Ministério da Justiça lança na próxima terça-feira — 8 de julho — o livro "O 8 de janeiro que o Brasil não viu". Segundo Cappelli, trata-se de um registro histórico, focada em fatos, e na crucial gestão da comunicação em momentos de alta pressão política. 

Aos jornalistas Carlos Alexandre de Souza e Rafaela Gonçalves, Cappelli, pré-candidato ao governo do DF pelo Partido Socialista Brasileiro, descreveu o 8 de Janeiro como um evento de extrema gravidade, uma tentativa sem precedentes de desestabilizar o país. 

"O que aconteceu ali foi muito grave. Aquilo não foi uma manifestação qualquer. Quem está dizendo isso não é o Ricardo Capelli. Quem está dizendo isso é a Polícia Militar do Distrito Federal. Eu, como interventor, ouvi, recebi relatos dos policiais militares, e vamos lembrar que tivemos 44 policiais militares feridos”, destacou o ex-interventor. Baseado no relato de policiais militares do DF, descreve a presença de homens treinados e equipados entre os manifestantes. Ele rechaça categoricamente a narrativa, comum entre bolsonaristas, de que o episódio foi um ato de baderna.

 Na avaliação de Cappelli, o 8 de Janeiro foi o ápice de uma desconfiança institucional plantada no governo anterior. E lista os antecedentes: os ataques a prédios públicos em 12 de dezembro de 2022 — dia da diplomação do então presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva — e a tentativa de explosão no Aeroporto Internacional de Brasília em 24 de dezembro.

Ao analisar as consequências do ato antidemocrático, o autor acredita que processo em curso no Supremo Tribunal Federal (STF) é “histórico” e “educativo”, pois, pela primeira vez, civis e militares são réus por uma conspiração golpista.

Democracia em risco

Cappelli alertou, ainda, que a democracia exige cuidado permanente. Para ele, o 8 de Janeiro está inserido em um fenômeno global de crise e radicalismo, também presente na invasão do Capitólio dos EUA. Parte dessa crise global decorre, segundo ele, à mudança do dinamismo econômico para a Ásia, levando o Ocidente a perder riqueza e enfrentar a maior concentração de renda da história. Essa situação aumenta a tensão social e, consequentemente, põe em risco a ideia de democracia.

“O mundo ocidental vive, tem o maior número de bilionários da história e o maior número de pobres da história. O mundo ocidental está com muita dificuldade de entregar prosperidade para as pessoas. (...) E aí a população começa a questionar a democracia. Por isso que boa parte desses movimentos extremistas encontram base real na população”, observou Cappelli.

Atualmente na presidência da Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI), ele critica a estrutura tributária brasileira, de “origem escravocrata”, que isenta super-ricos, defendendo uma tributação justa, nos padrões da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). A alta taxa Selic — a segunda maior taxa de juros real do mundo —, desvia o capital produtivo para a especulação financeira.

Apesar dessa "âncora monetária", o convidado do Podcast do Correio define a economia brasileira como um "colosso", demonstrando resiliência e crescimento do PIB e investimento produtivo. “O Brasil é um colosso, porque apesar de taxa de Selic de 15%, o PIB cresceu agora 1,4% no primeiro trimestre. E se comparado com o mesmo trimestre do ano passado, cresceu 2,9%”, completou.

Sustentabilidade

Ao abordar o desenvolvimento sustentável, Cappelli ressaltou ainda que 30 milhões de brasileiros na região amazônica precisam de ganhos econômicos. Ele afirma que a ABDI investiu mais de R$ 2 milhões no Centro de Biotecnologia da Amazônia (CBA) em Manaus, transformando-o em incubadora de startups de biotecnologia para alternativas sustentáveis que combatam atividades ilegais.

Um exemplo é a agroindústria de café no Acre, com R$ 9 milhões investidos, gerando alternativas sustentáveis na Amazônia. "Desenvolvimento econômico e sustentabilidade têm que andar juntos, não têm contradição. Mas não adianta o discurso só da preservação; o discurso às vezes santuarista, conservacionista xiita, sem colocar alternativa real de desenvolvimento”, destacou.

O entrevistado explicou ainda que a ABDI, vinculada ao Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC), atua no suporte à política industrial e em projetos próprios. No Distrito Federal, a agência investiu R$ 3,4 milhões no “mais moderno" laboratório para análise e certificação de vinhos do Brasil.

Ele também mencionou que quase R$ 8 milhões foram destinados a estruturar cooperativas de catadores de resíduos, fortalecendo a indústria da reciclagem e a logística reversa. A agência também lançou o portal “Recircula Brasil”, citado pela ONU como referência, que certifica o uso de material reciclado e sua rastreabilidade, protegendo a indústria nacional de barreiras comerciais.

*Estagiário sob a supervisão de Carlos Alexandre de Souza 

postado em 03/07/2025 20:02
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