
Com a ajuda do presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), o governo manobrou e conseguiu suspender a sessão conjunta de ontem do Congresso, que analisaria os 63 vetos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva à Lei Geral do Licenciamento Ambiental (Lei 15.190/2025) e o projeto da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2026. O adiamento da sessão foi confirmado horas antes da reunião, marcada para às 10h, e não tem nova data.
Nos bastidores, parlamentares governistas e da oposição consideram que o Palácio do Planalto jogou pesadamente para suspender a sessão, diante do risco de sofrer uma derrota acachapante com a derrubada dos vetos. A movimentação foi interpretada como uma manobra para evitar que o país ficasse malvisto na 30ª Conferência do Clima das Nações Unidas (COP30), em novembro, em Belém.
Mas comentava-se, também, sobre as movimentações de Alcolumbre para tentar emplacar o senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG) como sucessor do ministro Luís Roberto Barroso, no Supremo Tribunal Federal (STF) — embora todas as apostas considerem o advogado-geral da União o franco-favorito para ocupar, em breve, a 11ª cadeira da Corte.
O gesto do presidente do Senado contrariou as expectativas, criadas no início do mês, quando ele próprio confirmara para ontem a sessão do Congresso. Na ocasião, afirmou que Senado e Câmara apreciariam a LDO e os vetos presidenciais sobre o licenciamento ambiental, pauta que, mais uma vez, acirrou os ânimos entre governo e oposição. O adiamento da sessão, segundo a assessoria de Alcolumbre, foi decidido em "atendimento à solicitação do governo federal". A base do Planalto comemorou o fôlego extra que lhe permite se reorganizar e negociar, algo que é admitido pela oposição.
A estratégia do governo para conseguir adiar a votação dos vetos foi agir em duas frentes. A primeira, com a publicação, de forma extraordinária, do Decreto 12.673, que institui a Câmara de Atividades e Empreendimentos Estratégicos — órgão que será o responsável por conceder o licenciamento ambiental especial, mecanismo importante para a exploração de petróleo na Margem Equatorial, na foz do Rio Amazonas. A segunda, foi a interlocução do líder do governo no Congresso, Randolfe Rodrigues (PT-AP), que reuniu-se com Alcolumbre e pediu mais tempo para avaliar o tema na Câmara e no Senado.
"Apelei ao presidente Davi que a apreciação desse tema, neste momento, e sem conseguirmos avançar sobre ele, teria prejuízo tanto na medida provisória — que tratava também do licenciamento ambiental — e de outro PL sobre o mesmo tema. Criaria dificuldade, teríamos necessariamente um impasse. Fico feliz e agradeço por ter atendido nossa exposição de motivos para realizarmos, em outro momento, a sessão do Congresso. Inclusive, com a disposição da apreciação desse tema e ver o que é possível em relação a ele. E equacioná-lo junto com a MP e com PL", afirmou.
Sobre o decreto, publicado na quarta-feira, Randolfe explicou que era apenas uma medida com fim regulatório. "Esse decreto é uma decorrência da medida provisória que editamos. É uma decorrência do que já tinha na medida provisória. Foi um acordo geral. O presidente Davi, óbvio, teve contribuição nisso", explicou.
Comemoração
O líder do PT na Câmara, Lindbergh Farias (RJ), celebrou o adiamento da sessão nas redes sociais. "Graças à mobilização de vocês, conseguimos adiar a derrubada dos vetos do Lula no 'PL da Devastação'. Sigamos mobilizados. Não podemos permitir tamanha atrocidade contra o meio ambiente", publicou.
No Senado, o líder do governo, Jaques Wagner (PT-BA), admitiu que poderia haver reflexos diplomáticos. "Estamos a menos de um mês da COP. Tudo terá impacto lá. Se o Congresso derrubasse a maioria dos vetos do presidente, haveria reflexo, não só para o governo, mas para o país", explicou. Wagner lembrou, ainda, que a medida provisória editada pelo governo para recolocar trechos do PL vetados precisa ser aprovada dentro do prazo legal. "Perderíamos um instrumento essencial de política ambiental", observou.
Questionado se o adiamento seria resultado de alguma negociação entre Alcolumbre e o Planalto que poderia estar relacionada à indicação para a 11ª cadeira do STF, o senador desconversou: "Não sei se houve esse papo. Isso deve ter sido decidido ontem à noite. Eu já estava sonhando", brincou, em conversa com jornalistas.
Em discurso no plenário da Câmara, o deputado federal Bacelar (PV-BA) criticou o que chamou de tentativa de "ressuscitar o PL da Devastação" e disse que revogar os vetos seria "um ato de irresponsabilidade internacional", especialmente às vésperas da COP30.
"Licenciar não é burocracia. É proteção da vida, é prevenção de tragédias, é respeito à Constituição. O Brasil precisa modernizar suas leis ambientais com diálogo e transparência, nunca com retrocessos travestidos de progresso", frisou.
Entre os oposicionistas havia grande irritação com Alcolumbre. O líder do PL na Câmara, deputado Sóstenes Cavalcante (RJ), afirmou que o presidente do Congresso havia sinalizado que pretendia votar os vetos. "Ontem (quarta-feira) ele falou comigo que queria derrubar os vetos porque tinha interesse do estado dele em jogo. Agora, só ele pode responder o que aconteceu, se os interesses do Amapá ficaram em segundo plano", provocou.
Já o ex-ministro do Meio Ambiente no governo de Jair Bolsonaro, deputado Ricardo Salles (Novo-SP), defendeu o avanço do projeto e deu menor importância ao adiamento da sessão conjunta das duas Casas. "Postergar não muda a decisão de derrubar grande parte dos vetos. É preciso evoluir e modernizar a lei para ter desenvolvimento com sustentabilidade. Os dogmáticos ambientalistas, muitas vezes, não entendem isso", lamentou.
Afrouxamento
Aprovado em maio, o PL 2.159/2021 pretendia uniformizar os procedimentos para emissão de licença ambiental e simplificar a concessão de autorizações para empreendimentos de menor impacto. Porém, com as várias alterações feitas pelos congressistas, o texto ficou conhecido como "PL da Devastação', pois afrouxava a legislação ambiental.
Em agosto, Lula sancionou a nova lei ambiental, mas vetou 63 dos 400 dispositivos aprovados pelo Legislativo. Entre os trechos barrados, estavam artigos que previam o Licenciamento Ambiental Especial (LAE) com fase única e o licenciamento simplificado por autodeclaração para obras de médio impacto ambiental. O governo também rejeitou pontos que transferiam aos estados e ao Distrito Federal a definição dos critérios de licenciamento.
Para recompor parte dos dispositivos derrubados pelo presidente, o governo editou a Medida Provisória 1.308/2025 e encaminhou ao Congresso um novo projeto de lei em regime de urgência. A MP trata exclusivamente do LAE e tem o objetivo, segundo o Executivo, de modernizar o processo, mas sem abrir brechas para retrocessos ambientais.
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Danandra Rocha
Repórter de políticaFormada pela Faculdade Anhanguera de Brasília, tem experiência em assessoria, televisão e rádio. É repórter da editoria de Política, na cobertura do Congresso.

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