PODER

Alcolumbre esquenta a briga com o Planalto sobre sabatina de Messias

Nota do presidente do Senado cita interferência governista e amplia a tensão com o Planalto em torno da indicação de Jorge Messias ao Supremo. Líderes mantêm silêncio sobre sabatina e resistências ao nome crescem

A crise política em torno da indicação do advogado-geral da União (AGU), Jorge Messias, para a vaga de Luís Roberto Barroso no Supremo Tribunal Federal escalou mais alguns graus na temperatura. Ontem, o presidente do Senado e do Congresso, Davi Alcolumbre (União-AP), que defendia o nome de Rodrigo Pacheco para o cargo, criticou duramente a demora do Planalto em enviar a mensagem escrita oficializando a indicação, que, segundo ele, “parece buscar intervir indevidamente no cronograma estabelecido pela Casa”, o qual é uma “prerrogativa exclusiva do Senado”.

Siga o canal do Correio no WhatsApp e receba as principais notícias do dia no seu celular

Em nota, o Senado reafirmou que o cronograma de sabatina guarda coerência com a “quase totalidade das indicações anteriores” e permite que a definição sobre o nome ocorra “ainda em 2025, evitando a protelação que, em outros momentos, foi tão criticada”. A sabatina está marcada para 10 de dezembro.

Como apurado pelo Blog da Denise na sexta-feira, a estratégia de segurar o envio dos documentos de Messias ao Senado a fim de adiar a sabatina caiu por terra. Alcolumbre se baseou na publicação da indicação no Diário Oficial da União (DOU) para fixar a data que os senadores ouvirão Messias na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) e, apesar de não haver nenhum empecilho regimental para que isso ocorra, será a primeira vez que um presidente do Congresso marca uma sessão desse tipo sem ter recebido um ofício do Planalto com a indicação e toda a documentação do escolhido.

“Portanto, o que se espera é que o jogo democrático seja conduzido com lisura. Da parte desta Presidência, absolutamente nada alheio ao processo será capaz de interferir na decisão livre, soberana e consciente do Senado sobre os caminhos a serem percorridos”, declarou Alcolumbre.

O documento contém uma crítica direta a “setores do Executivo” e a táticas que visam desqualificar o Legislativo. Para o presidente do Senado, há uma “nítida tentativa de setores do Executivo de criar a falsa impressão” perante a sociedade de que divergências entre os Poderes são resolvidas por “ajustes de interesse fisiológicos, com cargos e emendas”.

O senador disse considerar essa tática ofensiva não apenas ao presidente do Congresso, mas “a todo o Poder Legislativo”. Para ele, se trata de uma maneira de “desqualificar quem diverge de uma ideia ou de um interesse de ocasião”. “Nenhum Poder deve se julgar acima do outro, e ninguém detém o monopólio da razão. Tampouco se pode permitir a tentativa de desmoralizar o outro para fins de autopromoção, sobretudo com fundamentos que não correspondem à realidade”, ressaltou.

Alcolumbre defendeu, ainda, a importância do respeito mútuo entre os Poderes e a independência de cada um em seu papel constitucional. Em nome do Senado, disse reconhecer a prerrogativa do presidente da República de indicar ministros ao STF, mas salienta a prerrogativa do Parlamento de escolher, “aprovando ou rejeitando o nome”.

Valter Campanato/Agência Brasil - Gleisi após a nota de Alcolumbre: "Jamais consideraríamos rebaixar a relação institucional"

A ministra da Secretaria de Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, afirmou, ontem, que o governo tem "o mais alto respeito" por Alcolumbre. “Jamais consideraríamos rebaixar a relação institucional com o presidente do Senado a qualquer espécie de fisiologismo ou negociações de cargos e emendas”, disse, em postagem nas redes sociais.

Congresso

Desde o anúncio da indicação de Messias ao Supremo, no entanto, líderes e integrantes das principais bancadas passaram a adotar um silêncio público que não se traduz em neutralidade, na tentativa de não se indispor com o presidente do Congresso.

Mesmo sem admitir oficialmente, Alcolumbre preferia ver o senador Rodrigo Pacheco como indicado ao Supremo. A recusa em receber Messias nas últimas semanas virou símbolo dessa crise. O AGU, por sua vez, tenta encurtar distâncias: na sexta-feira, pediu novamente uma reunião com Alcolumbre, que deve ocorrer somente na próxima semana. “Em algum momento, ele vai me atender. Estou trabalhando (para isso)”, resumiu Messias a jornalistas.

Apesar do ambiente hostil, o processo avança. O relatório do senador Weverton Rocha (PDT-MA) sobre a indicação será apresentado hoje. O parecer deve ser divulgado oficialmente no dia 3, conforme calendário da Casa. A sabatina da CCJ está marcada para 10 de dezembro. 

Na quinta-feira, Messias e Rocha estiveram reunidos por duas horas. Conversaram sobre resistências políticas e sobre o trâmite interno da indicação. O relator disse ter consultado técnicos do Senado e explicou que a publicação da mensagem presidencial no DOU consolidou o processo. Messias ficou de enviar os documentos que comprovam o cumprimento dos requisitos formais para ocupar a cadeira no Supremo.

Enquanto isso, o “beija-mão” promovido pelo advogado-geral da União continua. Nas últimas semanas, Messias passou por gabinetes e buscou conversar com senadores individualmente. Reuniu-se com Eliziane Gama (PSD-MA), Sérgio Petecão (PSD-AC) e Eduardo Braga (MDB-AM), mas não há clareza sobre quantos parlamentares realmente abriram as portas, e o silêncio virou o indicador mais preciso da temperatura política.

Entre os mais críticos está o líder da oposição no Congresso, Izalci Lucas (PL-DF). Ele afirma que Messias chega à sabatina “em condição frágil” e relembra o episódio em que Dilma Rousseff mencionou “Besias”, numa suposta tentativa de interferência no Judiciário.

Izalci também critica a atuação da AGU em denúncias envolvendo o Instituto Nacional de Seguro Social (INSS), dizendo que o órgão só tomou providências “após pressão da CPMI”. Para ele, a indicação de um nome evangélico atende a “um cálculo eleitoral” do Planalto e arrisca que “não vejo possibilidade de ele se eleger".

O senador Omar Aziz (PSD-AM) adota, porém, um tom mais institucional. Ele afirma que o Senado aguarda apenas a chegada formal da mensagem da Casa Civil para dar sequência ao processo. “É normal isso aí, não é o primeiro ministro que se faz a sabatina. (…) Cada senador é uma liderança e cada um quer ser ouvido e quer conversar com o indicado”, afirmou. Aziz disse ter recebido uma ligação de Messias e que os dois devem conversar na próxima semana.

Questionado sobre o embate interno envolvendo Davi Alcolumbre, Aziz destaca que o presidente do Senado tem prerrogativas, mas também tem limites. “Ele até agora não fez nenhuma posição. (…) As prerrogativas do presidente são de indicar, e a prerrogativa do Senado é analisar, aprovar ou não aprovar”. E reconhece que “é muito claro que ele tinha suas preferências. E é um direito de qualquer senador.”

Mais Lidas