“Como sua mãe está lidando com isso?”. A pergunta foi feita por uma amiga. Ela queria saber como está sendo para mamãe ver o companheiro de vida cheio de limitações. Papai está com 87 anos. Está bem em relação à memória, mas precisa da ajuda da bengala e se movimenta com dificuldade. Sente dores o tempo todo.
Não saber o que responder para a amiga me inquietou. Passei a observar melhor minha mãe. Ela está com 83 anos. Segue bem. E por isso acumula pequenas tarefas no dia a dia. Ao me abrir para ouvi-la, deparei-me com as seguintes frases: ele não me ajuda; não faz nada; só fica deitado ou sentado. Do outro lado, percebo papai inquieto por não poder ajudar.
No início, julguei, achei-a cruel. Até que, recentemente, vi-me em uma situação diferente, mas parecida. Marcos, meu namorado, teve dengue e precisou ficar em repouso. Senti falta do parceiro que se mantém sempre ao meu lado. Senti-me egoísta por esse pensamento. E, para me desculpar e redimir, sentei-me ao lado dele com um pote de uvas. Vamos dividir? Recuperei a paz.
Marcos ficou doente por 15 dias e fui visitada por um emaranhado de pensamentos pequenos. Como seria conviver com alguém que está tomado por limitações, sem rota de volta? Triste e solitário. É fácil julgar. Difícil é viver. Da terapeuta, escutei: a vida não é tão simples e bonita como na literatura, na qual as pessoas são compassivas com o outro ao longo do envelhecimento. Não quero mais apontar o dedo para minha mãe. Percebo que ela está fazendo o que pode e consegue. O problema não são meus pais, mas a expectativa alimentada por mim de que me apontem o caminho de como (eu mesma) devo envelhecer.
Amor e esperança
Talvez devêssemos conversar – eu, você, todos nós – sobre a velhice. Talvez devêssemos olhar para os nossos velhos – todos eles, não apenas os pais – como pessoas que precisam de nós, de amparo, tolerância, respeito. Gostaria que já existisse uma rota de acesso para um envelhecimento amoroso. Mas não há.
Com meus pais estou aprendendo sobre desvios, terrenos difíceis. Não existe ainda paisagem para apreciar. Existe o amor. A esperança, quem sabe, esteja nele. Um sentimento que vai além dos laços de sangue e nos arrebata a todos como irmãos de jornada. Idealismo? Pode ser. Prefiro acreditar nisso ao conformismo, segundo o qual ficaremos à deriva. Entregues. À própria sorte.
Por Ana Holanda – revista Vida Simples
Está aprendendo com os pais a julgar menos e a amar mais.
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