
Por Graça Seligman / Especial para o Correio
A democracia brasileira completou 40 anos em 15 de março, e parece que foi ontem que essa jornada começou. Em Brasília, a luta pela democracia foi especialmente complexa e longa, marcada por muitos personagens e movimentos que merecem ser lembrados.
A capital, inaugurada em abril de 1960, logo se viu sob um regime militar que restringiu direitos políticos antes mesmo que a cidade pudesse exercê-los plenamente. A ditadura limitava a cidadania, mas a resistência sempre esteve presente. Lideranças como Honestino Guimarães, à frente dos estudantes da Universidade de Brasília (UnB), e militantes do Centro Brasil Democrático do DF, como Luís Carlos Sigmaringa Seixas, foram fundamentais.
- Crônica: Sob o céu de nuvens loucas, lembranças de Honestino
- Crônica Cidade Nossa: Ave Francisco, Non te oblitur te salutant
- Crônica: O abraço do João
No final dos anos 1970, a luta por representação política no Distrito Federal se alinhou ao movimento nacional pelo restabelecimento da democracia. O PMDB foi o primeiro partido a se organizar, ainda que de forma informal, com sua primeira executiva regional formada em 1979, liderada por Carlos Alberto Torres e Maerle Ferreira.
A campanha pelas Diretas já mobilizou Brasília com encontros, carreatas, comícios e até concertos de buzinas, regidos pelo maestro Jorge Antunes. Camisetas com ilustrações de cartunistas, como Gougon, pediam a volta da democracia, e todos as vestiam com orgulho. Para minha família, essa foi uma época marcante. Em 1984, nasceu nosso primeiro filho, Felipe, e na porta do quarto, no hospital, colocamos uma faixa que dizia "Diretas já".
Embora a emenda Dante de Oliveira não tenha sido aprovada, a unidade das forças democráticas prevaleceu, e Tancredo Neves foi eleito em março de 1985. Tancredo reconheceu que, enquanto conhecia pessoas e partidos cassados, Brasília era uma cidade inteira sem direitos políticos, algo que precisava mudar. Com a posse do presidente José Sarney, a promessa foi cumprida. A proposta de emenda constitucional número 25 foi apresentada e aprovada em 15 de maio de 1985, assinada por Ulysses Guimarães e José Fragelli, garantindo ao Distrito Federal representação política pela primeira vez.
O PMDB foi o primeiro partido a se organizar formalmente, nomeando uma comissão provisória para realizar seu primeiro congresso
e eleger sua direção. Meu marido, Milton Seligman, tornou-se o primeiro presidente de um partido político em Brasília. Agora, celebramos 40 anos de democracia e, em breve, o mesmo tempo de representação política.
Nesse período, além do DF, o Brasil passava por um período de transição e efervescência política. A imprensa e a política movimentavam o cenário nacional, e a cobertura jornalística na época refletia isso. Havia uma intensa mobilização da população e dos movimentos sociais, que reivindicavam direitos civis, sociais e trabalhistas, fundamentais para o fortalecimento da democracia. E, como reflexo, a pauta e a cobertura jornalísticas eram intensas, trazendo a pluralidade de vozes da sociedade. O cenário cultural também desempenhou um papel muito importante, com artistas e intelectuais completamente envolvidos nos debates e na militância política.
Todos esses elementos juntos criaram um ambiente vibrante, no qual a política era amplamente discutida e analisada, refletindo as esperanças e os desafios da nova democracia brasileira. Desde então, nossa história tem sido repleta de desafios e dificuldades, mas a democracia, apesar de complexa e tortuosa, continua sendo o melhor caminho que temos para seguir nossa caminhada em busca de uma utopia social que traga uma vida digna a todos. A democracia segue sendo ameaçada, e cabe a nós defendê-la e aprimorá-la.
Graça Seligman é jornalista e fotógrafa