Bichos

Laços que educam: relação entre cães e crianças ensina, amor e empatia

A convivência entre cães e crianças vai muito além das brincadeiras. Essa relação fortalece vínculos afetivos, estimula o senso de responsabilidade e ensina empatia desde cedo

A bulldog estava presente até no anuncio da segunda gravidez de Millena  -  (crédito: Fotos: Arquivo pessoal)
A bulldog estava presente até no anuncio da segunda gravidez de Millena - (crédito: Fotos: Arquivo pessoal)

Ter um cachorro em casa é, para muitas famílias, sinônimo de alegria, companhia e afeto incondicional. Mas quando há crianças no ambiente, essa relação ganha um significado ainda mais profundo. Além de fortalecer laços, o convívio entre pets e pequenos ajuda a desenvolver habilidades emocionais e sociais que serão levadas para a vida toda, desde o senso de responsabilidade até o respeito pelos limites do outro.

Segundo o veterinário João Paulo Lacerda, do Centro Universitário de João Pessoa (Unipê), o segredo de uma boa convivência começa antes mesmo da chegada do animal. "O mais importante não é exatamente a raça, mas entender o temperamento da família. O perfil do pet deve estar alinhado ao estilo de vida da casa", explica. Famílias mais ativas, por exemplo, beneficiam-se de cães cheios de energia, como o beagle, o akita e o labrador retriever, que gostam de acompanhar os tutores em caminhadas e atividades ao ar livre. Já para quem tem um ritmo mais tranquilo, raças como o pug e o buldogue francês são ideais, pois se adaptam bem a ambientes menores e têm um nível de energia mais baixo.

Quando o assunto é o primeiro pet, Lacerda destaca uma raça que costuma agradar a todos: o golden retriever. "É um cão de grande porte, mas extremamente dócil e generoso. Convive bem com idosos e crianças e tem baixo risco de causar acidentes em movimentos bruscos", afirma.

Além da raça

Para Victor Lima, veterinário do Centro Universitário do Distrito Federal (UDF), o sucesso dessa convivência não depende apenas da escolha da raça. "Qualquer cão pode ser um excelente companheiro de uma criança, desde que receba educação, afeto e atenção. A raça, por si só, não garante nada, o que define é a forma como o animal é cuidado e socializado", afirma.

Cães descritos como dóceis, sociáveis e brincalhões costumam se adaptar melhor à rotina de famílias com filhos, mas isso também depende da criação e da rotina oferecida. "A socialização desde cedo é essencial. Cães que têm experiências positivas com pessoas e outros animais tendem a ser mais equilibrados", diz Lima. Ele reforça ainda a importância da supervisão: "Independentemente do porte, crianças nunca devem interagir sozinhas com os animais. É responsabilidade dos adultos garantir a segurança dos dois lados".

Além do comportamento, questões de saúde e estrutura física devem ser consideradas. Algumas raças exigem cuidados específicos, como os cães braquicefálicos, que podem ter problemas respiratórios, ou precisam de mais exercícios diários. Por isso, uma conversa com o veterinário antes da adoção é fundamental para entender se o ritmo da casa combina com o novo integrante.

Amizade e cumplicidade

Na casa de Millena Pessoa Sá e Rodolfo Bruno de Sá, a convivência entre cães e crianças é parte da rotina desde o início do casamento. O casal, pais de Pietro, Bernardo e Mateus, adotou a Panqueca, uma buldogue inglesa, ainda antes da chegada dos filhos. "Sempre sonhamos em ter um buldogue. Quando engravidei, ficamos receosos de como ela reagiria ao bebê, mas foi o melhor possível, ela cuidava dele o tempo todo", conta Millena.

Panqueca é parte da família
Panqueca é parte da família (foto: Arquivo pessoal)

Hoje, Panqueca é parte inseparável da família. "As crianças e ela brincam juntos, estão sempre no mesmo ambiente e têm uma relação muito saudável", diz Rodolfo. Apesar das brincadeiras mais agitadas, comuns entre um cão forte e três meninos cheios de energia, o casal garante que nunca houve episódios de agressividade. "Houve ciúmes no início, mas era mais disputa por atenção do que comportamento agressivo", explica.

Millena acredita que o contato com animais desde cedo traz inúmeros benefícios para os filhos. "Eles aprendem sobre cuidado, empatia e responsabilidade. Sabem que a Panqueca precisa ser alimentada, amada e respeitada, e isso reflete na forma como tratam outras pessoas também."

Com uma rotina bem-estruturada e muita supervisão, a convivência flui naturalmente. "Sempre explicamos que não podem bater, puxar ou subir nela. As crianças aprendem com o tempo, e a Panqueca também entende os limites. É uma troca linda de afeto e respeito", diz a mãe.

O casal conta que a casa é só diversão e brincadeiras, com os meninos correndo atrás de Panqueca, com brinquedos e bolinhas. "Às vezes, a Panqueca cansa mais rápido que eles e se esconde para ter um momento de descanso, mas como são três crianças, ela sempre tem que ter muito fôlego para as brincadeiras". 

O convívio entre cães e crianças vai muito além das brincadeiras. É uma relação de aprendizado mútuo, que estimula o desenvolvimento emocional, o senso de responsabilidade e a capacidade de se colocar no lugar do outro. Como resume João Paulo Lacerda, "essa convivência é benéfica para ambos: para as crianças, porque ensina empatia e cuidado; e para o animal, porque representa estímulo físico e emocional, fortalecendo o vínculo com a família".

Pietro, Bernardo e Mateus aprenderam sobre cuidado, empatia e responsabilidade
Pietro, Bernardo e Mateus aprenderam sobre cuidado, empatia e responsabilidade (foto: Arquivo pessoal)

Panqueca participa das brincadeiras
Panqueca participa das brincadeiras (foto: Arquivo pessoal)

Convivência que educa 

Mais do que companhia, o contato diário entre cães e crianças pode ser uma poderosa ferramenta de aprendizado. "Quanto mais cedo a criança for estimulada a conviver com animais, melhor. Essa experiência contribui para o desenvolvimento de sentimentos de empatia, zelo e responsabilidade", ressalta Lacerda. Pequenas tarefas, como ajudar a alimentar o cão ou recolher as fezes, são oportunidades valiosas para que os pequenos aprendam sobre cuidado e respeito.

Mas, assim como as crianças precisam aprender a lidar com o cachorro, o pet também deve ser preparado para a chegada do novo integrante da família. Mudanças de comportamento, como irritabilidade, isolamento ou excesso de lambedura, podem indicar estresse. "A chegada de um bebê representa uma grande transformação na rotina do animal, por isso é importante fazer uma adaptação gradual", orienta o veterinário.

Um exemplo dessa convivência é na casa do casal Ana Paulo e Danilo Almeida, que há três meses  adotaram o pastor australiano Otto, pensando na convivência com a filha Antonella, de 3 anos. Ana conta que a adaptação inicial foi supertranquila, mas que, por Otto ainda ser um filhote, ainda há muito o que aprender. 

Entre os detalhes que necessitam atenção, estava a mordida, pois cães pequenos tendem a morder durante a troca dos dentes, e mesmo que de brincadeira, pode machucar. "Mesmo que fosse fraquinho, qualquer mordida acabava doendo para a Antonella, então ela chorava e não queria mais brincar, mas ele, como filhote, não compreendia esse limite" 

O casal diz que não pretende ter mais filhos, e entre as vantagens dessa convivência, está a opção de Antonella sempre ter com quem brincar e lhe fazer companhia, portanto eles buscam educar ambos para conviver como irmãos e poderem crescer juntos. Ana diz que a filha vem aprendendo muito sobre empatia e a dividir, sejam brinquedos, atenção e até espaço. "Ela ajuda a colocar a comida e a água do Otto, já ajudou a dar banho. Ela já passou a entender que está tudo bem querer brincar sozinha às vezes também. Ensinamos a respeitar quando ele está dormindo, assim como ensinamos para ele, tudo na base da conversa". 

*Estagiária sob supervisão de Sibele Negromonte

 


  • Panqueca participa das brincadeiras
    Panqueca participa das brincadeiras Foto: Arquivo pessoal
  • É uma troca de afeto e respeito entre os meninos e Panqueca
    É uma troca de afeto e respeito entre os meninos e Panqueca Foto: Arquivo pessoal
  • Pietro, Bernardo e Mateus aprenderam sobre cuidado, empatia e responsabilidade
    Pietro, Bernardo e Mateus aprenderam sobre cuidado, empatia e responsabilidade Foto: Arquivo pessoal
  • Panqueca é parte da família
    Panqueca é parte da família Foto: Arquivo pessoal
  • Google Discover Icon
postado em 12/10/2025 06:00 / atualizado em 12/10/2025 06:00
x