CAMINHOS DO NASCIMENTO

A ilha onde é proibido nascer


Moradoras de Fernando de Noronha têm de sair no sétimo mês de gestação para dar à luz no Recife

Por Aline Gouveia, Raphaela Peixoto
Fotorech/Pixabay

Desde 2004, gestantes de Fernando de Noronha (PE) precisam viajar até o Recife para dar à luz. O trajeto de mais de 500km é feito de avião. De acordo com a Secretária de Saúde estadual, a média anual de nascimentos na ilha é de 58

Diego Ponce de Leon/CB/D.A Press

A orientação é que as grávidas viajem para o Recife no sétimo mês de gestação. Segundo o Ministério Público de Pernambuco, o transporte e as despesas das gestantes são pagas durante a estadia na capital pernambucana

Diego Ponce de Leon/CB/D.A Press

De acordo com a Secretaria de Saúde, durante o período em que as mulheres permanecem no Recife, o governo fica responsável por organizar agendamento de consulta, exames, assim como acompanhamento pré-natal e supervisionado, com orientações relativas às maternidades de referência

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Ter que sair do local onde mora para ter um bebê é uma saga que muitas mulheres gostariam de não ter que enfrentar. 'É frustrante ter que abandonar a nossa casa, nossa família. Ficar longe de tudo e de todos em um momento tão delicado', afirma a empresária Ana Carolina da Silva

Arquivo pessoal

Mãe de Rihanna, 6 anos, Ana Carolina está no quarto mês da segunda gestação e sente um misto de emoções como se fosse a primeira gravidez. Ela pontua que essa proibição impacta diretamente a vida das mulheres. 'Eu ainda tive uma rede de apoio, mas muitas não têm ... e ficam isoladas no período em que mais precisam de apoio'

Arquivo pessoal

Essa mesma sensação de pertencimento em relação ao arquipélago é sentida por Alyne Dias Luna. A empresária teve que se deslocar para Recife nas três gestações. Alyne conta que na primeira gravidez, em 2020, foi levada ao aeroporto pela polícia por ter se recusado a sair da ilha devido à pandemia de covid-19

Arquivo pessoal

A ilha há mais de 20 anos não conta com uma maternidade, visto que foi desativada em 2004. Bernadete Coelho, professora do departamento de medicina da Universidade Federal de Pernambuco, considera 'problemático' não dispor de um centro de parto normal no distrito estadual

Divulgação/Governo de Pernambuco

Segundo Bernadete, o deslocamento para outros territórios pode gerar fragmentação na assistência médica. 'Mesmo quando os serviços estão no mesmo território, muitas vezes já enfrentamos dificuldades de coordenação do cuidado — ou seja, de manter uma comunicação eficaz, fluida e viva entre os diferentes pontos da rede. Imagine, então, quando impomos um deslocamento tão grande [...] para que ela possa dar à luz', cita a professora

Reprodução

A especialista ressalta ainda a necessidade de se ter maternidades integrais, ou seja, com leitos para risco habitual, centros de parto normal e estrutura para atender situações que podem evoluir rapidamente e exigir cuidados intensivos, como Unidade de Terapia Intensiva (UTI) para gestantes e neonatal

Charlie Ehlert/Divulgação

A professora ainda frisa que, se toda a rede fosse estruturada para o acesso, sobretudo por meio da atenção primária, capaz de resolver problemas e acompanhar a gestação de risco habitual — que representa, de forma geral, mais 70% das gestações no Nordeste — cerca 75% das gestantes poderiam ter partos assistidos localmente

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