Em entrevista ao programa CB.Poder, parceria do Correio com a TV Brasília, nesta quinta-feira (25/4), o ex-prefeito de São Paulo e candidato ao Planalto nas eleições de 2018 pelo PT, Fernando Haddad, fez duras críticas à reforma da Previdência que tramita na Câmara dos Deputados.
Ao comentar a Proposta de Emenda à Constituição (PEC), Haddad criticou particularmente o sistema de capitalização defendido pelo ministro da Economia Paulo Guedes e acusou o governo de falta de transparência na forma como manteve dados em sigilo.
Na opinião de Haddad, a recusa do governo em abrir, mediante a Lei de Acesso à Informação (LAI), os cálculos que explicam a economia de mais de R$ 1 trilhão em 10 anos com a reforma impediu um debate transparente na primeira comissão a analisar a PEC. "Deixaram passar na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça), que votou às escuras, porque não sabia o que estava votando. E só agora que os números foram divulgados. Mas há quanto tempo essa reforma está tramitando?", questionou (veja a íntegra da entrevista abaixo).
Para o petista, é falsa a tese defendida pelo governo de que a reforma pode combater privilégios. "Do R$ 1 trilhão que se fala, mais de R$ 800 bilhões afetam diretamente a vida de quem ganha até três salários mínimos. O discurso do governo de que a reforma combate aos privilégios é falso", justificou.
Sobre o , Haddad argumenta que, se implementada, formaria uma "legião de idosos pobres no Brasil", citando o Chile, que adotou modelo parecido nos anos 1990, como exemplo. "Você tem que discutir democraticamente ajustes que precisam ser feitos. Graças a Deus que a população está envelhecendo, tudo isso é do jogo. Agora, regime de capitalização? Quero que o Guedes me diga em que país que ele está se inspirando", desafiou.
Oposição e Ciro Gomes
Questionado sobre dificuldades na articulação da oposição dentro do Congresso, Haddad disse ter uma visão diferente. "Na Câmara, eu não vejo assim. Pelo contrário. Até Rede e PDT estão unidos ao PSol, PT, PCdoB, PSB em uma frente mais ampla, que tem usado dos expedientes legais previstos para impedir reformas que vão de encontro ao que a gente imagina que seria justo."
A única exceção nesse movimento de proximidade seria Ciro Gomes (PDT), que também se candidatou ao Planalto nas eleições de 2018. "Eu sou amigo do Ciro, e ainda não entendi no que eu pessoalmente errei para não contar com o apoio dele no segundo turno", comentou.
"Lula não queria abrir mão (da candidatura) e Ciro também não. Mas ia ter que ter um gesto em relação ao segundo turno. Não tinha como fazer aliança no primeiro. Como não aconteceu isso, e Lula foi impedido, então ele lançou um candidato pelo PT. Não acho que não foram feitos os esforços devidos. Havia duas concepções no jogo", afirmou.
Ao criticar o atual governo e "trazer lucidez para o debate", a oposição, na avaliação de Haddad, contribui para a melhora do país. Um desses exemplos é o questionamento acerca do projeto anticrime, sugerido pelo ministro da Justiça, Sérgio Moro. "Ninguém pode ser contra um projeto com esse nome. Agora, o que de fato vai acontecer na prática? Violência e repressão devem aumentar", comentou.
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Discussão com Carlos Bolsonaro
Outro ponto abordado na entrevista foi a discussão pelas redes sociais envolvendo um dos filhos do presidente Jair Bolsonaro, Carlos Bolsonaro, da qual Haddad diz não se arrepender. O embate entre os dois, ocorrido há cerca de duas semanas, foi considerado por muitos internautas como homofóbico.
"Ele entrou no meu Twitter e fez uma brincadeira homofóbica, e eu respondi na mesma moeda", disse. O petista também contou que recebeu o apoio do ex-deputado federal Jean Wyllys. "O filho do presidente tem que se dar ao respeito. Nem ele e nem o pai se dão (ao respeito). Ele (Bolsonaro) tem que saber que ganhou a eleição. Parece que não caiu a ficha dessa família", disse.
A vitória de Bolsonaro
Cerca de seis meses após o fim das eleições, Haddad coloca o público evangélico como decisivo para a eleição de Bolsonaro, assim como a disseminação de fake news. "Acredito que nós (PT) não tenhamos nos atualizado em relação à tecnologia de informação na campanha eleitoral. O que aconteceu na última semana do primeiro turno, a gente não estava preparado para enfrentar", comentou. "Que houve ação de fake news e que ela teve um impacto brutal, isso ninguém nega", completou.
Para o petista, a sociedade não foi alertada suficientemente sobre o que representaria a vitória de Bolsonaro, que, segundo ele, é uma "vergonha internacional". "Eu alertei o que eu pude. Eu dei entrevistas duras dizendo que vocês jornalistas sabiam o risco da eleição de Bolsonaro. Falei onde fui. Vocês conhecem esse moço. São 28 anos de desserviço. E sinceramente, acho que a gente não aproveitou a campanha, não alertamos a sociedade sobre a insuficiência de atributos de Bolsonaro. É uma vergonha internacional."
A política externa adotada pelo presidente Bolsonaro, por sinal, foi alvo de duras críticas, especialmente a postura adotada na crise venezuelana e a forma de se relacionar com os Estados Unidos e Israel. "Você quer fazer uma aproximação com EUA e Israel, faça pelo lado certo, pela ciência, cooperação, e não pelo lado ideológico, que vai trazer prejuízo em termos de emprego para o Brasil", disse. "Se eu tivesse sido eleito, não estaríamos discutindo intervenção militar na Venezuela. Porque os EUA jamais teriam a ousadia de pensar em entrar na América do Sul passando por cima do interesse brasileiro", completou.
"História falsificada"
Haddad também comentou as posições recentes de Bolsonaro sobre nazismo e ditadura militar. "Temos que acabar com essa história de elogiar ditadura, seja de que credo for. Ditadura está errado. (O presidente) Vai para Israel e perdoa o Holocausto, diz que nazismo é de esquerda... Tem que parar de falsificar a história", opinou.
Sobre a escolha dos ministros para compor o governo, Haddad acredita que ainda há nomes que deveriam ser substituídos. Até o momento, dois ministros foram demitidos: Gustavo Bebianno, da Secretaria-Geral da Presidência e Ricardo Veléz, do ministério da Educação. Entre as pastas mais problemáticas, segundo o petista, estão a do Meio Ambiente, a do Turismo e, ainda, a de Educação, além do Itamaraty.
"Eu temo pelas universidades, principalmente públicas. É onde se gera pensamento crítico e criativo. Mais de 90% das pesquisas feitas no Brasil são feitas pelo Estado. Bolsonaro falou que a maior parte é nas instituições particulares. Isso seria ignorância ou má-fé. Na minha opinião, são as duas coisas", criticou.
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