
Mais de 63% dos consumidores já se arrependeram de uma compra feita pela internet, segundo pesquisa do blog Opinion Box. E o dado não surpreende: em 2024, o comércio eletrônico movimentou cerca de R$ 185 bilhões por todo o país, com milhões de pedidos por mês. Entre descontos relâmpago, compras por impulso e produtos que não atendem às expectativas, o chamado direito de arrependimento tem se tornado cada vez mais importante, mas nem sempre é respeitado.
Nos últimos dois anos, o Procon-DF registrou um aumento de mais de 110% nas reclamações sobre compras on-line, com destaque para problemas como atraso na entrega, divergência entre produto anunciado e recebido, e dificuldade para cancelar o pedido. Até outubro de 2020, esse número já havia ultrapassado 7,3 mil. Isso mostra que a alta do e-commerce também trouxe um ciclo inverso de reclamações e de casos de arrependimento negados.
Previsto no artigo 49 do Código de Defesa do Consumidor (CDC), o direito de arrependimento garante que o consumidor pode desistir da compra realizada fora de loja física, como internet, telefone ou catálogo, em até sete dias corridos. O prazo começa a contar a partir do recebimento do produto ou do início da prestação do serviço, e não é necessário justificar o motivo da desistência. "Mesmo que o item esteja em perfeitas condições, o consumidor pode desistir por qualquer razão. Basta comunicar a empresa dentro do prazo legal", explica o advogado Watson Silva, especialista em direito do consumidor.
Foi o que fez Mariana Pereira, de 29 anos. Ela comprou um vestido em uma loja on-line durante uma promoção de fim de semana. Quando o produto chegou, o tecido e a cor não eram exatamente como pareciam nas fotos. No segundo dia após o recebimento, Mariana entrou em contato com a empresa solicitando o cancelamento da compra. "Eles pediram que eu devolvesse o vestido pelos Correios e me mandaram o código de postagem. Em menos de uma semana, o valor total, incluindo o frete, estava de volta na minha conta", conta. O caso de Mariana seguiu exatamente o que determina a legislação: o produto foi devolvido nas mesmas condições em que foi recebido e o reembolso foi feito de forma rápida e integral.
Mas nem sempre é assim. Paulo Andrade, de 45 anos, não teve a mesma sorte. Após contratar um curso on-line de fotografia, percebeu que o conteúdo era básico demais. Tentou exercer o direito de arrependimento ainda dentro dos sete dias, mas a empresa se recusou a cancelar a matrícula, alegando que "se tratava de conteúdo digital e que o acesso já havia sido iniciado". Paulo buscou orientação jurídica e registrou reclamação na plataforma consumidor.gov.br. "Foi só depois disso que a empresa aceitou o cancelamento e me reembolsou", relata.
Exceções
Segundo Silva, há exceções previstas em lei pelas quais o direito de arrependimento pode não ser aplicado. "Produtos personalizados, alimentos perecíveis, itens lacrados, cujo selo foi violado, ou serviços que já foram completamente executados com consentimento dentro do prazo, por exemplo, não se encaixam na regra", detalha.
Nos casos em que o direito é legítimo, o processo de devolução deve ser simples. O consumidor comunica a empresa, devolve o produto em condições adequadas, e recebe o reembolso total, incluindo o valor do frete. "A empresa também deve arcar com o custo da devolução, o reembolso precisa ser feito de forma rápida, preferencialmente pelo mesmo meio de pagamento usado na compra", reforça o advogado.
Se a empresa se recusar a cumprir a lei ou dificultar o processo, o cliente deve guardar todos os comprovantes de compra e atendimento e procurar os órgãos de defesa do consumidor, como o Procon. Também é possível registrar reclamação em plataformas como o Reclame Aqui e o consumidor.gov.br. "Quando nada disso resolve, o caminho é acionar a Justiça, inclusive por meio dos Juizados Especiais Cíveis, onde não é necessário ter advogado para causas de até 20 salários mínimos", orienta Silva.
O advogado também recomenda alguns cuidados antes de finalizar uma compra on-line: "Verifique se o site é confiável, leia a política de devolução da empresa, guarde e-mails, faturas e comprovantes, e confira o produto assim que recebê-lo. São atitudes simples que fazem diferença, caso seja necessário exercer o direito de arrependimento", destaca.
Apesar dos avanços, ainda é comum empresas criarem barreiras: exigem lacre intacto, devolução em loja física ou preenchimento de formulários complexos. Mas o CDC não determina isso, exige apenas comunicação dentro do prazo e devolução em condições adequadas.
*Estagiária sob a supervisão de Malcia Afonso
Saiba Mais
Onde reclamar
Órgãos governamentais
Procon: o atendimento é feito por meio do número 151, de segunda a sexta-feira, das 8h às 17h. O consumidor também pode entrar em contato pelo e-mail: 151@procon.df.gov.br. Os endereços dos postos podem ser consultados pelo site procon.df.gov.br/postos-deatendimento-2.
Plataforma consumidor.gov.br: é possível comunicação direta com as empresas que participam da plataforma, que se comprometem a receber, analisar e responder reclamações em até 10 dias.
Empresa privada
Reclameaqui.com.br: plataforma de solução de conflitos entre consumidores e empresas. Nela, também é possível verificar a reputação da empresa, as reclamações registradas e o atendimento às demandas.
Dicas
» Verificar se o site é confiável, o que pode ser feito buscando referências e comentários sobre a empresa por meio de sites, de redes sociais e de plataformas como Reclame Aqui.
» Ler com atenção a política de devolução da empresa.
» Guardar e-mails, notas, faturas, conversas de WhatsApp e qualquer outro comprovante ou documento que possa servir como prova da transação.
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