Um grupo formado por 38 jovens e oito responsáveis da Paróquia Santa Maria dos Pobres, no Paranoá, foi vítima de um golpe na compra de um pacote de viagem para Roma, na Itália. Cada integrante desembolsou aproximadamente R$ 15 mil com o sonho de participar do Jubileu da Esperança, uma das celebrações mais importantes da Igreja Católica. O total gira em torno de R$ 690 mil. Em Taguatinga, mais 30 pessoas da Paróquia Nossa Senhora de Fátima foram lesadas em R$ 540 mil. Juntos, os prejuízos somam R$ 1,23 milhão.
A viagem estava marcada para 25 de julho, com retorno previsto para 6 de agosto. O pacote incluía passagens aéreas, hospedagem e um roteiro religioso, adquirido por meio de uma empresa de turismo sediada em Franca (SP). O cancelamento foi comunicado na última quarta-feira, durante uma reunião on-line, na qual os viajantes foram informados sobre a suposta falência da empresa.
Nilza Pereira, 49 anos, empregada doméstica e integrante do grupo, contou que investiu todas as suas economias na viagem. "Era um sonho. Gastei tudo o que tinha. Quando fiquei sabendo, entrei em desespero. Estou sem chão", lamenta.
No dia seguinte ao anúncio, o responsável pela empresa entrou em contato com um líder da paróquia e admitiu enfrentar dificuldades financeiras desde a pandemia, alegando não ter obtido vantagem pessoal e afirmando que não teria condições de realizar a viagem nem de devolver os valores pagos.
Um boletim de ocorrência foi registrado na 6ª Delegacia de Polícia, e os peregrinos ainda mantêm a esperança de que o caso seja resolvido e o prejuízo, recuperado.
A reportagem entrou em contato com a empresa de turismo, que afirmou ter explicado os motivos do cancelamento aos clientes e que as providências estão sendo tomadas diretamente com os afetados.
Outras vítimas
Na Paróquia Nossa Senhora de Fátima, em Taguatinga, outras 30 pessoas foram vítimas do golpe. Com a aproximação da data da viagem, os responsáveis pelos grupos passaram a cobrar a emissão das passagens e a confirmação dos voos, mas a comunicação com a empresa foi se tornando cada vez mais difícil. O prejuízo nesta paróquia foi de mais de R$ 540 mil.
O engenheiro civil Matheus Machado, 29, relatou que o pacote fechado pela igreja era mais caro, pois incluía também uma visita a Madri. "No nosso caso, ficou em torno de R$ 18 mil por pessoa. Eu e meu irmão íamos juntos e gastamos R$ 36 mil. Desde 2023, vínhamos economizando, abrindo mão de muitas coisas, conseguimos juntar R$ 22 mil e o restante foi parcelado no cartão de crédito", conta.
Segundo ele, durante uma reunião, a empresa informou que não conseguiria cumprir o contrato por falta de recursos financeiros e apresentou um plano de ressarcimento, mas sem prazo definido. "Durante a contratação, em nenhum momento foi informado que eles estavam passando por dificuldades. Sequer chegaram a emitir as passagens ou reservar os hotéis", afirma Matheus.
"No primeiro momento, foi um choque. Para todos nós da paróquia, essa viagem representa um sonho. Mas não é apenas uma questão de sair do país, é uma vivência profunda da nossa fé. Ainda assim, estamos tentando manter a esperança", completa.
A paróquia registrou um boletim de ocorrência na 21ª Delegacia de Polícia de Taguatinga e contratou um advogado para acompanhar o caso.
O que diz a lei
A pedido do Correio, o advogado Gabriel José Victor avaliou o caso. Segundo ele, a empresa de turismo pode ser processada criminalmente pelo golpe sofrido pelos consumidores. "Dependendo das circunstâncias e das provas, os responsáveis podem responder por crimes como estelionato, previsto no artigo 171 do Código Penal, falsidade ideológica, falsificação de documentos, associação criminosa e crimes contra as relações de consumo, conforme o artigo 7º do Código de Defesa do Consumidor", explica.
O especialista destaca que existe uma diferença jurídica relevante entre falência e golpe. "A falência é um processo legal, que ocorre quando a empresa não consegue mais cumprir suas obrigações e requer intervenção judicial para liquidar seu patrimônio e pagar os credores. Já o golpe envolve má-fé ou fraude deliberada, quando há o recebimento de recursos sem qualquer intenção de prestar o serviço contratado", afirma.
Entre os principais sinais de fraude, conforme o advogado, estão a ausência de comunicação oficial sobre dificuldades financeiras, o sumiço repentino dos responsáveis, o desvio de valores para contas pessoais e a inexistência de qualquer tentativa formal de recuperação judicial.
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