violência sexual e psicológica

Vítimas relatam rotina de abusos sexuais e intimidações de líder religioso

Ao menos seis mulheres de diferentes regiões do DF e do Entorno foram vítimas de líder religioso. Relatos chocantes mostram como o pai de santo manipulava as vítimas para que frequentassem terreiro

Constantes mudanças de endereços chamou a atenção da polícia -  (crédito: ED ALVES/CB/D.A.Press)
Constantes mudanças de endereços chamou a atenção da polícia - (crédito: ED ALVES/CB/D.A.Press)

Um líder religioso é investigado pela Polícia Civil por abusar da confiança e cometer crimes sexuais contra pelo menos seis mulheres. Aos investigadores elas relataram situações que, segundo a polícia, se enquadram em crimes como estupro, estupro de vulnerável e violação sexual mediante fraude

O Correio teve acesso ao depoimento de uma das vítimas e o relato é chocante. Diagnosticada com depressão e transtorno bipolar, Helena* (nome fictício) relatou aos investigadores ter conhecido o terreiro de umbanda no fim de 2021, por meio de um amigo. 

Ao ser atendida pelo pai de santo, foi informada por ele que estava sendo "atacada por energias externas" e que "a espiritualidade dela estava feliz por ela estar no terreiro". Ele a convenceu a se tratar no local e disse que "a Pomba-Gira trabalhava muito na energia sexual" e que ela deveria explorar essa energia para recuperar a saúde.

Um dia, sentindo-se mal, ela procurou o guia espiritual. Ele definiu que o "tratamento" seria por meio do sexo, alegando que isso a deixaria mais disposta e a ajudaria espiritualmente. Além disso, ele a orientou a parar de tomar os remédios psiquiátricos, afirmando que ela deveria se tratar apenas no terreiro.

Helena foi instruída a se depilar completamente para "purificar o corpo". Em seguida, o investigado a levou para uma sala isolada onde praticou o ato sexual. A vítima relatou em depoimento ter sentido nojo de tudo aquilo, mas ficou com medo de denunciar ou ir contra a autoridade religiosa. 

Mudança de endereço

A prisão do líder religioso ocorreu na manhã de sexta-feira e demandou um trabalho de inteligência da PCDF. Para driblar a polícia e impedir que as vítimas o denunciassem, o homem mudava constantemente de endereço do terreiro, que funcionou em Samambaia, Guará, Vicente Pires e Luziânia. Esse comportamento motivou o pedido de prisão preventiva, que foi acatado pela Justiça. A polícia acredita na existência de mais vítimas nas cidades por onde o investigado passou. 

Sob a condição de anonimato, Vitória* (nome fictício), de 30 anos, contou que frequentou o terreiro onde uma amiga foi vítima do líder religioso. "No início, ele sempre parecia muito solícito, e aos poucos fui me vinculando cada vez mais ao local", disse a mulher. Ela conta que o pai de santo vivia com duas esposas e diversas "filhas de santo" dormiam na casa dele. "Ele justificava a situação dizendo que todo mundo era uma grande família", disse.

Segundo Vitória, os frequentadores viviam momentos de terror psicológico, sendo ameaçados pelo líder. "Ele dizia que sabia fazer macumba e detalhava o que ocorria com as pessoas para quem ele tinha feito esse tipo de trabalho. Isso intimidava todo mundo", afirmou.  

Entre os seguidores, o homem se apresentava como um grande defensor das mulheres, mas a realidade era bem diferente. "A gente sempre viveu situações de assédio moral e sexual, com toques e falas desrespeitosas. Ele também prometia a algumas mulheres que elas seriam o seu 'terceiro amor', já que era casado com outras duas", detalhou.

Crise de pânico

Vitória começou a perceber alguns comportamentos esquisitos do líder religioso com a amiga. Ele a fazia ir ao terreiro todas as quintas-feiras, mesmo quando não havia rituais, e abusava dela com a desculpa de que ela precisava "consertar algo". "Sempre que a minha amiga recebia mensagem dele, ficava desesperada. Ela começou a ter crises de pânico e não queria mais ir ao terreiro quando era chamada". 

O relato de Vitória culmina com a prescrição de rituais perturbadores. "Em um dos rituais, ele dizia que tanto os homens quanto as mulheres precisavam fazer incisões nas partes íntimas — cortes superficiais na pele feitos com gilete e inserir algo, que ela não soube dizer o que era. Vitória não fez o ritual e deixou de frequentar o terreiro. 

A operação, conduzida pela Delegacia Especial de Atendimento à Mulher I (Deam I), recebeu o nome Sórdida Oblatio, expressão em latim que significa "oferta impura". O nome faz referência à deturpação da fé e da espiritualidade para fins de exploração e violência. As investigações continuam, e a polícia não descarta que novos relatos possam surgir.

Siga o canal do Correio no WhatsApp e receba as principais notícias do dia no seu celular?

 


  • Google Discover Icon
postado em 10/08/2025 06:01 / atualizado em 10/08/2025 11:57
x