FAUNA SILVESTRE

Jabuti sobrevive com pele de tilápia após ser queimado em incêndio florestal

Ferido pelas chamas, o pequeno animal foi encontrado queimado depois de um incêndio na Flona e recebeu tratamento especial para recuperar o casco. Ele foi o primeiro paciente vítima das queimadas de 2025

Jabuti recebendo pele de tilápia no lugar do casco que caiu por causa da queimada
 -  (crédito:  Marcelo Ferreira/CB/D.A Press)
Jabuti recebendo pele de tilápia no lugar do casco que caiu por causa da queimada - (crédito: Marcelo Ferreira/CB/D.A Press)

No início de agosto, com o clima seco chegando e tornando comum as cinzas e a fumaça, a Floresta Nacional (Flona) de Brasília foi vítima de mais uma queimada e mais um rastro de destruição. Em meio à vegetação incinerada, um pequeno sobrevivente foi resgatado: um jabuti ferido, com o casco queimado pelo fogo, caminhava lentamente sobre o mato ainda quente. 

O Instituto Brasília Ambiental (Ibram) atende animais silvestres por meio do Hospital e Centro de Reabilitação da Fauna Silvestre (Hfaus). Entre as histórias comoventes que passaram pelo hospital, está a do jabuti. Ele foi o primeiro paciente vítima das queimadas de 2025. Com o casco queimado, recebeu a aplicação de pele de tilápia no lugar. 

Resgate

Quem o encontrou em meio às cinzas foi o chefe do Centro de Triagem de Animais Silvestres do Distrito Federal (Cetas-DF), Júlio César Montanha, vinculado ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama). Ele participou diretamente do resgate.

 12/08/2025 Crédito: Marcelo Ferreira/CB/D.A Press. Brasil. Brasília - DF -  Aumento da presença de animais silvestres nas cidades. Hospital e Centro de Reabilitação da Fauna Silvestre - Setor Hoteleiro, projeção H, Taguatinga sul. Jabuti com o casco queimado após fugir de um incêndio.
O casco, as patas e a cabeça do animal foram atingidos pelo fogo (foto: Marcelo Ferreira/CB/D.A Press)

"Foi encontrado em um pequeno incêndio que teve na Flona. Estava com parte do casco queimado, com aquele aspecto de carvão, as duas patas do lado esquerdo queimadas e parte do rosto. Levamos para o Cetas primeiro para triagem, depois ao Hfaus. Descobrimos que também havia dano na cauda e na pata direita. Provavelmente andou sobre brasas tentando escapar. Encontramos ele em um lugar com muita fumaça, ainda no mato queimado. Estava andando naquele mato quente... Sabemos que sentiu bastante dor".

 12/08/2025 Crédito: Marcelo Ferreira/CB/D.A Press. Brasil. Brasília - DF - HFAUS -  Aumento da presença de animais silvestres nas cidades. Hospital e Centro de Reabilitação da Fauna Silvestre - Setor Hoteleiro, projeção H, Taguatinga sul. Jabuti recebendo pele de tilápia no lugar do casco que caiu por causa da queimada.
Pele de tilápia sendo usada para a cicatrização do jabuti (foto: Marcelo Ferreira/CB/D.A Press)

Um animal lento e indefeso, tentando sobreviver ao seu habitat em chamas. O jabuti não foi apenas queimado pelo fogo direto, mas também pelas brasas escondidas embaixo do chão. "É muito comum, em incêndios, os animais queimarem as patas. Eles acham que aquela área por não ter fogo está segura, mas na realidade o fogo está por baixo", explicou.

Jabuti após a retirada da pele de tilápia
Jabuti após a retirada da pele de tilápia (foto: Arquivo pessoal)

Levado ao Hfaus, o jabuti recebeu um tratamento diferenciado, mas cada vez mais utilizado na medicina veterinária — o uso de pele de tilápia para acelerar a cicatrização de queimaduras. O biólogo e coordenador do Hfaus, Thiago Marques, contou que o animal chegou apresentando desidratação.

"Durante o tratamento, observamos que as placas ósseas que recobrem o casco poderiam se descolar. Quando isso acontece, usamos antibióticos e anti-inflamatórios para garantir o bem-estar do animal. A pele de tilápia protege essas áreas expostas, evitando infecções que poderiam levar o animal à morte". O procedimento, embora simples, exige acompanhamento. A pele é trocada periodicamente, acompanhando o progresso da cicatrização. Em casos de danos mais profundos ao casco, que não haja a possibilidade de recuperação, a equipe utiliza resina para reconstruir o casco.

 12/08/2025 Crédito: Marcelo Ferreira/CB/D.A Press. Brasil. Brasília - DF - HFAUS - Aumento da presença de animais silvestres nas cidades. Hospital e Centro de Reabilitação da Fauna Silvestre - Setor Hoteleiro, projeção H, Taguatinga sul. Jabuti recebendo pele de tilápia no lugar do casco que caiu por causa da queimada.
Jabuti foi resgatado na Floresta Nacional de Brasília (foto: Marcelo Ferreira/CB/D.A Press)

"A resina impermeável protege contra rachaduras e buracos, sem interferir na mobilidade do animal. Assim, ele pode, talvez, ser introduzido na natureza novamente após passar pela avaliação do Cetas", acrescentou Thiago.

O Cetas é responsável por receber, cuidar e reabilitar animais resgatados, apreendidos ou entregues voluntariamente, devolvendo-os à natureza. Quando o jabuti se recuperar, o Cetas atuará na reabilitação do animal ao seu habitat natural.

Queimadas

As queimadas no DF têm impactos profundos na fauna. E não apenas nos animais atingidos diretamente pelas chamas. O biólogo e gerente de Fauna Silvestre do Ibram, Rodrigo Augusto Santos, alerta para a situação que se tornará ainda mais presente com a chegada da seca.

"Quando áreas de vegetação nativa são desmatadas ou degradadas, os animais perdem seu espaço e buscam outras regiões, muitas vezes se aproximando de áreas urbanas. Esses animais cumprem papéis vitais: controlam pragas, dispersam sementes, ajudam a manter o equilíbrio. Combater a grilagem e ocupação irregular é também uma forma de proteger a fauna", observa Rodrigo.

Segundo ele, a participação da sociedade é necessária nesse momento. "O meio ambiente precisa da ação conjunta da sociedade para garantir que a fauna continue fazendo parte do nosso cotidiano, com equilíbrio e segurança para todos".

O Hfaus, do Brasília Ambiental, não realiza diretamente os resgates, mas é responsável por atender animais silvestres encaminhados por órgãos como o Batalhão da Polícia Militar Ambiental e o próprio Ibama. Em 2025, o tempo médio de permanência dos animais no Hfaus foi de 19 dias para répteis e 24 dias para mamíferos.

Com casco reconstruído e sob vigilância atenta, o jabuti ainda não tem data para voltar ao seu lar natural. Mas carrega agora um novo escudo fruto da ciência e da dedicação humana para que volte ao seu lar. 

*Estagiária sob a supervisão de José Carlos Vieira

 

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postado em 15/08/2025 05:00
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