REPRESENTATIVIDADE

Crônica da cidade: É preciso preservar o avesso

"Muitas obras sobre o racismo ganharam os holofotes nos últimos anos, e nos ajudam a compreender e a aprender mais para respeitar e defender as pautas que nos dão a chance de vislumbrar um futuro melhor para nossos filhos"

Marcha das mulheres pretas na Esplanada: luta por respeito e espaço -  (crédito:  Minervino Júnior/CB)
Marcha das mulheres pretas na Esplanada: luta por respeito e espaço - (crédito: Minervino Júnior/CB)

A Marcha das Mulheres Negras chega a uma nova edição nesta terça-feira (25/11), em Brasília, 10 anos depois, para, mais uma vez, trazer ao centro do debate a pauta dos movimentos sociais. Os desafios da primeira edição se mantêm: combater o racismo, o sexismo e lutar por acesso à saúde e pela titulação de terras quilombolas. 

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Se unem a eles as emergências socioambientais e as violações de direitos digitais, conforme ressaltou em entrevista ao Correio Juliane Cintra, coordenadora institucional de projetos na ONG Ação Educativa e diretora-executiva da Associação Brasileira de ONGs.

O encontro está marcado para ocorrer em todas as capitais do país, mas aqui, em especial, deve reunir as manifestantes em frente ao Museu Nacional, com concentração marcada para as 7h, em trajeto que seguirá até o Congresso Nacional.

O Bem-Viver é o mote do evento deste ano. Mais uma vez, o movimento negro nos ensina que a qualidade de vida que tanto almejamos nunca será alcançada plenamente por trás dos muros e das grades que cercam as nossas casas. A pandemia nos mostrou como adoecemos encarcerados. Viver bem implica respeitar as diferenças e usar mais coletivos do que imperativos.

Muitas obras sobre o racismo ganharam os holofotes nos últimos anos, e nos ajudam a compreender e a aprender mais para respeitar e defender as pautas que nos dão a chance de vislumbrar um futuro melhor para nossos filhos. Um trecho em especial de uma delas me tocou profundamente. É o que dá nome ao livro O avesso da pele, de Jeferson Tenório — um diálogo entre pai e filho, que compartilho aqui:

"Conforme fui crescendo,  suas perguntas foram ficando mais complexas. E confesso que às vezes eu não queria ser profundo. Eu queria apenas brincar e ser como os outros filhos eram com seus pais. No entanto, agora eu sei que você estava me preparando. Você sempre dizia que os negros tinham de lutar, pois o mundo branco havia nos tirado quase tudo e que pensar era o que nos restava. 'É necessário preservar o avesso', você me disse. 'Preservar aquilo que ninguém vê. Porque não demora muito e a cor da pele atravessa nosso corpo e determina nosso modo de estar no mundo. E por mais que sua  vida seja medida pela cor, por mais que suas atitudes e modos de viver estejam sob esse domínio, você, de alguma forma, tem de preservar algo que não se encaixa nisso, entende? Pois entre músculos, órgãos e veias existe um lugar só seu, isolado e único. E é  nesse lugar que estão os afetos. E são esses afetos que nos mantêm vivos.' Lembro que você fazia um grande esforço para ser entendido por mim. Eu era pequeno e talvez não tenha compreendido bem o que você queria dizer, mas, a julgar pela água nos seus  olhos, me pareceu importante."

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postado em 25/11/2025 00:01 / atualizado em 25/11/2025 23:19
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