
Uma radiografia de rotina revelou algo inesperado no joelho de uma mulher de 65 anos: dezenas de pequenos pontos brilhantes espalhados ao redor da articulação. A imagem denunciava a presença de fios de ouro no joelho da paciente como parte de um tratamento alternativo para dor. O caso, descrito no New England Journal of Medicine, acende um alerta sobre os riscos de terapias sem comprovação científica.
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A paciente havia sido diagnosticada com osteoartrite, doença degenerativa que afeta a cartilagem das articulações e causa dor, rigidez e limitação de movimentos. Inicialmente, ela seguiu o tratamento convencional, com analgésicos e anti-inflamatórios. Com o tempo, no entanto, buscou uma alternativa apresentada como acupuntura com implante de partículas de ouro — prática divulgada nas redes sociais como solução para dores crônicas.
Esses fios, contudo, não são absorvidos pelo organismo. Permanecem no local onde foram inseridos e podem se acumular em regiões já comprometidas, como articulações afetadas pela osteoartrite. No caso relatado, além de não aliviar a dor, os implantes passaram a interferir diretamente na investigação clínica.
A presença de metal no corpo impõe desafios importantes aos exames de imagem. Embora alguns tipos de ouro e aço inoxidável sejam considerados compatíveis com a ressonância magnética sob condições específicas, o uso exige cautela rigorosa. Fatores como composição, tamanho e localização do material determinam se o exame pode ou não ser realizado. Fios de ouro puro, por exemplo, são classificados como “condicionais”, o que significa que a ressonância só pode ocorrer dentro de parâmetros estritos de segurança.
Mesmo quando o exame é permitido, os metais podem gerar distorções nas imagens — os chamados artefatos — que dificultam a visualização de estruturas essenciais, como cartilagem, sinóvia (revestimento da articulação) e vasos sanguíneos. No caso da paciente, os fios comprometeram a nitidez das imagens, atrasando a avaliação adequada da progressão da doença.
O episódio ilustra um movimento cada vez mais comum: pacientes recorrem a terapias alternativas quando tratamentos tradicionais causam efeitos colaterais ou deixam de surtir efeito. As diretrizes médicas atuais para osteoartrite do joelho priorizam exercícios físicos, controle de peso, uso de anti-inflamatórios tópicos ou orais e infiltrações com corticoides em fases de crise. A acupuntura pode ser considerada em alguns casos, mas o implante permanente de fios de ouro não é recomendado por nenhuma diretriz médica de referência.
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Segundo os autores do estudo, as evidências a favor desse tipo de implante se limitam a relatos isolados de casos. Sem estudos clínicos controlados, não é possível avaliar de forma confiável se há benefícios que justifiquem os riscos, que incluem migração dos fios, infecção, interferência em exames diagnósticos e, sobretudo, atraso no acesso a tratamentos eficazes.
O artigo reforça ainda a importância do consentimento informado. Pacientes precisam ser alertados de forma clara sobre as consequências de implantes permanentes, inclusive sobre como eles podem limitar exames, cirurgias ou outras intervenções no futuro.

Ciência e Saúde
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