Visão do direito

IA: TSE aprova normativa para regulamentar propaganda eleitoral

Tribunal Superior Eleitoral (TSE) publicou uma série de resoluções para o pleito eleitoral de 2024. Dentre os diversos temas abordados, chama atenção o cuidado investido na temática da inteligência artificial (IA)

Uso de inteligência artificial em campanhas eleitorais está na mira do TSE  -  (crédito: KIRILL KUDRYAVTSEV / AFP)
Uso de inteligência artificial em campanhas eleitorais está na mira do TSE - (crédito: KIRILL KUDRYAVTSEV / AFP)
postado em 21/03/2024 03:55 / atualizado em 21/03/2024 00:00

Por André Macedo de Oliveira e Pedro Aurélio Azevedo Lustosa - Na última semana de fevereiro, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) publicou uma série de resoluções para o pleito eleitoral de 2024. Dentre os diversos temas abordados, chama atenção o cuidado investido na temática da inteligência artificial (IA) e dos seus impactos sobre o convencimento da população.

Seja por meio de chatbots potencializados com o uso da IA generativa, seja por deepfakes compartilhados de forma massificada em redes sociais, o cenário atual não deixa espaço para cogitar uma futura disputa eleitoral em que as ferramentas de IA deixem de ter um papel fundamental no resultado.

É pensando nisso que o TSE aprovou o normativo que altera a Resolução-TSE nº 23.610/2019, dispondo sobre propaganda eleitoral, utilização e geração do horário gratuito e condutas ilícitas em campanha eleitoral. Um dos principais destaques da nova resolução é a abordagem do papel do TSE na regulação da utilização de ferramentas tecnológicas nas eleições municipais.

O seu texto final ainda não foi publicado, mas o objetivo geral é enfatizar a proibição da utilização enganosa de conteúdos produzidos por IA. Em outra lente, há permissivo para o uso dessas ferramentas no auxílio da apresentação de ideias e propostas de campanha durante o pleito eleitoral.

A norma, portanto, impõe as primeiras "regras do jogo" para utilização de ferramentas de IA, com o cuidado especial de frustrar a propagação de informações e mídias adulteradas — ou mesmo inteiramente artificiais — que possam comprometer os contornos democráticos da república.

De um lado, há notícia da aplicação ampla de ferramentas de IA até mesmo nos tribunais superiores. Seu uso está presente nas atividades administrativas de gestão interna (chatbots para funcionamento de fóruns) e de suporte à prestação jurisdicional (o sistema Athos do STJ se presta a identificar possíveis processos com teses idênticas ou já afetadas, assim como apontar novos paradigmas para estabelecimento de temas repetitivos).

Observa-se também o uso dessas ferramentas nas atividades de classificação, triagem e elaboração de decisões (o sistema Victor do STF tem como função realizar a separação e a classificação de peças judiciais, além de identificar os principais temas de repercussão geral no acervo do tribunal; de forma similar, o projeto Sócrates do STJ é usado para realização de triagem dos processos, apoio nas análises dos casos e auxílio na seleção de casos representativos de controvérsia).

Nesses órgãos, a IA é empregada precipuamente com o objetivo de interpretar um grande volume de conteúdo, de modo a refinar os dados para uma apuração mais detalhada pelo respectivo tribunal. Essa análise em nível mais qualitativo, vale dizer, é realizada pelos servidores públicos. O olhar atento dos julgadores e servidores não poderá ser substituído pelas facilidades da IA. A máquina não poderá substituir a razão e a sensibilidade do julgador.

De outro lado, ao considerar o tema das fake news, percebe-se que o Poder Judiciário enfrenta importante desafio ao ser confrontado com a fluidez e dinamicidade da troca de dados vivenciada no Século XXI. Esse diagnóstico, em verdade, agrava-se com o potencial das ferramentas de IA em causar aceleração exponencial da criação de dados para compartilhamento, o que resulta em maiores dificuldades para a identificação do uso indevido dessas ferramentas.

É justamente por isso e pela ausência de legislação específica que o TSE assume protagonismo ao delinear as novas regras para utilização das ferramentas de inteligência artificial nos pleitos eleitorais.

Segundo os ministros, trata-se de "uma das normas mais modernas do mundo em relação ao combate ao uso ilícito da inteligência artificial", garantindo instrumentos eficazes para combater o desvirtuamento dessas ferramentas.

Também defenderam que, dentre os normativos para o próximo pleito, a norma em questão é fundamental e representa a "mais importante resolução para garantir a total liberdade do eleitor de escolha e liberdade de votação".

Em sentido similar à norma aprovada pelo TSE, entendemos que a IA não deve ser objeto de proibições massivas ou condenações generalistas. Fato é que se trata de ferramenta importante e, vale admitir, inexpugnável no cenário atual. É necessário, contudo, impedir seu uso indevido e evidenciar as instâncias em que será utilizada, ainda que em boa-fé, para o conhecimento da população.

Afinal, o voto é provavelmente o grande alicerce da democracia, ao igualar os desiguais, ainda que em poucas oportunidades periódicas de manifestação de sua vontade. Ao lado de outros instrumentos de controle e participação popular, o voto é o oxigênio do Estado Democrático de Direito.

No âmbito de uma sociedade cada vez mais plural e diversificada, a busca do equilíbrio entre a unidade do coletivo e o respeito à individualidade de cada um dos seus cidadãos, ganham significados cada vez mais complexos e desafiadores. O mais atual desses desafios é o balizamento da utilização e da propagação de ferramentas de IA nos pleitos eleitorais deste ano.

A integração das ferramentas de IA generativa, por meio de chatbots ou da geração de imagens e vídeos inteiramente artificiais, e a difusão dos deepfakes ressaltam a máxima: desconfie. Pense antes de enviar. Pesquise a veracidade!

Consultório jurídico

Quando passa a valer a decisão do STF sobre licença-maternidade para mães não gestantes? Como as mulheres devem agir para fazer valer esse direito?

Em se tratando de decisão em recurso extraordinário com repercussão geral, não havendo modulação, passa a valer a publicação da ata do julgamento conforme artigo 1.035, parágrafo 11, CPC. Ou seja, já está em vigor, uma vez que a ata foi publicada nesta terça-feira (19/03). 

O salário-maternidade deve ser solicitado diretamente ao INSS, atualmente pode ser realizado on-line ("Meu INSS"). Importante também comunicar formalmente ao empregador já que poderá haver o afastamento do trabalho da mãe não gestante. Vale lembrar que, de acordo com a posição firmada pelo Supremo Tribunal Federal, apenas uma mãe terá direito à licença maternidade (a outra o equivalente à licença paternidade).

André Macedo de Oliveira - Sócio das áreas de Tribunais Superiores e Direito Sancionador do BMA Advogados*

Pedro Aurélio Azevedo Lustosa Advogado das áreas de Tribunais Superiores e Direito Sancionador do BMA Advogados*

 

  • André Macedo de Oliveira, sócio das áreas de Tribunais Superiores e Direito Sancionador do BMA Advogados
    André Macedo de Oliveira, sócio das áreas de Tribunais Superiores e Direito Sancionador do BMA Advogados Foto: Divulgação
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